Ignorando a todos que cruzavam o seu caminho, assim como a tempestade que se anunciava na forma de nuvens pré-apocalípticas espalhadas pelo céu, ele atravessou a sóbria portaria do pequeno edifício de escritórios, tomou o elevador que o aguardava vazio e apertou o botão de número oito.
Se encarou naqueles espelhos durante toda a viagem e observava a tudo com rigor milimétrico, do alinhamento do cinto de couro pespontado que lhe empaneirava a camisa para dentro das calças ao aspecto completamente asseado do seu rosto azulado recém-barbeado, quando as portas se abriram para o destino que ele havia selecionado. Então com a dramática ponta de apenas um dedo suspendeu a mecha negra e preguiçosa estirada sobre a testa, girou nos calcanhares por dentro de seus mocassins azuis e saiu, índigo, abandonando o elevador que se lacrou às suas costas em sincronia com os seus passos.
Adiante, na recepção, a secretária de idade indeterminada se dividia entre os cuidados de seus afazeres ocultos sob o balcão e o perito empenho em evidenciar sua profunda indiferença a despeito da presença do grupo de jovens senhores que discutiam, tranquilos, sobre o de praxe — fraudes truculentas e cotidianas, corriqueiras lorotas profissionais, traquinagens do seu dia a dia em geral — todos confortavelmente acomodados no requintado conjunto de poltronas Ludwig Mies van der Rohe no hall principal.
Os assépticos e jovens senhores, por sua vez, seguiam com a cortês discussão assessorados por alguns documentos impressos e um ou outro rascunho reservado sobre a mesinha de centro, mas porém e no entanto, tanto mais quanto entretanto, principalmente pela moça elegante de tez amarelada, quase dourada, que permanecia sentada junto a eles munida de suas próprias anotações, assim como de todas as outras de todos os outros ali presentes, onde ela e somente esta, ela, realmente se interessava e acompanhava, enlaçada, a figura do altivo rapaz que por lá e por hora agora atravessava.
Vencendo mais este trecho em seu trajeto, o jovem de mocassins azuis e calças jeans seguiu então para a sala de divisórias envidraçadas que ficava logo em frente à recepção e estava, como sempre estava, ocupada por algumas estações de trabalho e três distintos funcionários: Um rapaz engravatado engraçado a conferir, conferenciar, confirmar e digitar textos, códigos e especificações em seu computador; Uma garota de olhos largos, e óculos fundos, atentamente debruçados sobre as grandes pranchas de papel na mesa redonda do canto da sala em um canto da sala; E um terceiro rapaz, um jovem mais maduro que os demais, imerso em seus croquis discretos de linhas retas, contidas e alternadas entre o preto, o azul e o vermelho dos pincéis atômicos que ele polidamente manuseava contra a lousa branca de uma das paredes brancas de um outro canto cinza daquela mesma sala.
Avançou pelo ambiente indiferente a todos os outros, assim como todos os outros a ele, e se acomodou na estação de trabalho onde dois porta-retratos emolduravam fotos suas e de uma jovem de beleza melancólica juntos a uma garotinha com profundas íris cor de mel.
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Manga Verde, Sal a Gosto
AdventureQuatro histórias de como "chutar o pau da barraca" é necessário e de como arcar com suas consequências é inevitável. "Manga Verde, Sal a Gosto" é um romance de aventura, moderno, bem-humorado e tropical - produzido sob regime de série - que se dispõ...