Capítulo 4

827 136 29
                                    

Viviane Velloso

Eu me sentia tão estranha de estar indo à casa de Ian depois de tantos anos. Embora nós três tenhamos uma ligação muito forte desde pequenos, depois do acidente do Ian tantas coisas mudaram. Principalmente nossa relação, que parou de existir. Coisa da qual sempre senti muita falta.

Foram incontáveis noites chorando por não ter mais a gentileza e companheirismo de Ian comigo.

— Obrigado por ter vindo. — Demorei tanto em minha decisão, que acabei levando horas para finalmente ter coragem de ir até lá. Por isso não me surpreendeu o fato do Enzo estar em casa, precisamente me esperando na sala principal.

— Eu não vim por ter uma dívida com você. Vim em nome da nossa amizade, que às vezes me pergunto como ainda existe.

— Me perdoa Vivi. — Ele fez aquela carinha que sempre me ganhava. — Eu sei que falei besteira, mas eu estou tão eufórico por ele estar reagindo, que acabei querendo te obrigar a algo.

— Estou aqui exatamente por isso. Porque o Ian também é extremamente importante para mim, assim como você. A diferença é que seu irmão saberia me convencer sem o uso da arrogância.

— Tudo bem, já entendi e aceitei sua birra. Pronta? — Assenti. — Mamãe não está, então cabe a mim ir chamar o Ian, mas sente-se aí, não demoro.

Enzo saiu para procurar o irmão, e eu fiquei na sala, admirando a beleza e luxo daquele lugar.

Ouvi-os antes mesmo de vê-los chegar. Perdi o fôlego por alguns instantes ao observar Ian. Ele permanecia belo, parecia que não havia se passado um ano sequer para ele. Os olhos espertos, a boca chamativa e os cabelos de aparência macia. Mas a ferocidade era nova em sua personalidade tranquila.

— Você só pode estar de sacanagem Enzo Gabriel. — Retrucou, guiando a cadeira em direção à sala. — Eu pedi uma enfermeira linda e gostosa, e você me vem com a Vivi, que nem enfermeira é...

Ele parou de falar por um instante, deixando seu olhar sobre mim. Me olhou dos pés a cabeça, com uma expressão indecifrável.

— Foi exatamente o que eu disse. — Quebrei o silêncio desconfortável. — Eu não sou enfermeira, e pelo visto também não sou gostosa, não é? — Brinquei, para amenizar o clima.

— Eu não quis ofendê-la, Vivi. — Ian voltou a recuperar sua voz. — Me desculpa. Só que foi uma surpresa te ver aqui. Sei que não fui muito agradável com você da última vez que nos vimos, mas...

— É, não foi, e também não está sendo agora. Sabe qual é o problema de vocês dois? Minha tia os mimou demais. Um virou um inconsequente arrogante e mesquinho, e o outro se tornou amargurado e grosseiro. — Soltei, cansada de aguentar tudo calada. — Não pensem que beleza e dinheiro são tudo, pois não é. Cansei de aturar a novela que vocês são.

— Vivi — Disseram em uníssono.

Não queria ouvir nada. Por isso girei em meus calcanhares e rumei para fora da casa, ainda ouvindo-os discutir.

Tudo vinha em flashes em minha mente. Enquanto um choro copioso me irrompia. Como atrelei minhas perspectivas a esses dois? Como eu pude perder metade da minha vida me dedicando a um amor ridículo que nunca foi correspondido? Como fui capaz de mendigar amizade de um homem que se amargurou e acabou descontando em mim?

E ainda fui capaz de engolir tudo e vir aqui ser solidária, só para levar um fora novamente. Como posso ser tão idiota?

E essa droga de telefone que não para de tocar. Em um momento de fúria joguei meu celular pela janela do carro, e foi nesse exato momento que tudo aconteceu. Gritos, um impacto, dor e a escuridão.

Um Novo Amanhecer (Degustação)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora