II.

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"Desmarque meus compromissos para o resto dessa semana, Sabrina, avise que tenho um assunto urgente de família para resolver, segunda retomo meus compromissos." Falava a minha secretária, uma estudante de arquitetura bastante esforçada, em muitos momentos ela me ajudou diretamente com alguns projetos, seria uma ótima profissional, mas por hora ela me salvaria dessa loucura.

Quando desliguei o celular visualizei as horas, eram exatamente 9 horas da manhã, já estava na estrada a cerca de 30 minutos e não demoraria muito mais a chegar a Santa Clarita.

Terminando de encher o tanque de gasolina do meu carro, eu joguei o aparelho sobre o banco vazio do carona, junto a minha maleta de viagem e bolsa. Dei a volta no carro, entrando e partindo em direção da cidade. Pelas minhas contas mais uns 20 minutos e estaria chegando ao local, depois só precisaria achar a casa da curandeira.

À medida que a estrada ia passando por mim eu começava a repassar as informações, e o que mais me impressionada era como minha ex-sogra sabia de detalhes tão íntimos. Eu me sentia constantemente vigiada e mais, havia uma sensação no ar de algo pouco familiar, de assombro e receio, poderia vir de minhas incertezas e medo, mas eu sentia claramente, como quando se sente alguém respirando próxima a pele. Eu me arrepiava constantemente e eles pioraram quando me aproximei da cidade. Nos últimos quilômetros me veio à mente que minha ex-sogra e seus devaneios e dita loucura possuíam mais sabedoria do que poderíamos acreditar.

Talvez essa fosse a palavra que eu procurava o caminho todo, acreditar. Eu não estava conseguindo crer em nada que me colocou nessa estrada, e onde esse conhecimento sobrenatural estaria me levando.

Quando finalmente adentrei a cidade ela me parecia um lugarzinho simpático, com bastante verde, casas baixas, estradas largas e campos grandes. Aquela cidade não poderia ser mais acolhedora, por um momento todo o meu medo e receio sumiram, voltaram para Los Angeles, jogados junto com o palito de exame de gravidez largado no meu lixo do banheiro.

Parei o carro no estacionamento de um hotel da cidade, uma casa de dois andares, com um tom de vermelho escuro que a cobria em todas as paredes. A sensação era de algo caseiro, nada luxuoso e com poucos serviços, mas serviria para eu passar a noite.

Logo aluguei um quarto, me ajeitei nele e pelo horário sai para fazer um lanche reforçado, mas antes de procurar informações sobre uma lanchonete ou restaurante, me aproximei da recepcionista com outro intuito. Com cuidado procurei afirmar que estava procurando por uma mulher, uma espécie de curandeira e não precisei nem dar nome e a mulher, uma senhora pequena, de cabelos loiros, que escondiam com quase perfeição os fios brancos, e olhos azuis claros, falou num tom visivelmente mais ansioso.

"Eleonore... Você não deveria estar atrás dela, essa mulher é uma bruxa."

Claro, uma bruxa, eu tive que me segurar pra não rir ali mesmo, porém a vontade não permaneceu por muito tempo, o olhar fantasmagoricamente azul dela demonstrava um receio profundo de falar sobre Eleonore, havia medo e superstição envolta do nome dessa mulher que chamavam de bruxa.

"Avisaram-me que ela poderia me ajudar. Poderia dizer como chego a ela?"

"Ela não ajuda nada, só trouxe o demônio até nos." Ela falou baixo, como se contando um segredo terrível enquanto fazia o símbolo da cruz. Ela estava precisando mesmo daquela proteção, e talvez eu também devesse começar a ser mais cristã.

"Por favor." Eu tentei mais uma vez. "Só preciso que me diga como chegar nesse endereço." Mostrei o papel onde tinha anotado a rua e número e ouvi o respirar profundo e pesado da pequena mulher.

"Você está indo pra morte..." ela nem ao menos pegou o papel na mão, apenas falou que eu deveria seguir por uma rua secundária até o final dela, onde acharia uma trilha, ela falou que eu não precisaria andar muito pra achar a casa.

Eu agradeci e sai para almoçar, incomodada com toda a superstição daquela mulher, tinha quase certeza que tinha escutado ela declamar algumas palavras cristãs, pedindo proteção a Deus.

***

Durante meu tempo entre almoço e voltar para o hotel para pegar meu carro e ir até o local onde estava Eleonore eu pude ter a opinião de outras pessoas da cidade. A garçonete, o homem que estava sentado ao meu lado no balcão, sua esposa, todas unanimes em relação a curandeira, se é que eu poderia continuar a chamá-la assim. Todos acreditavam que ela era uma espécie de bruxa, que ela só trouxe o mal pra cidade, mas foi a opinião de um jovem chamado Jack, que veio receber o meu pagamento, que me interessou particularmente. Ele conta que Eleonore chegou a cidade há uns cinco anos, ela sempre foi muito silenciosa e reservada, mas uma ótima curandeira, ela conseguia tratar qualquer pessoa que já havia perdido a esperança com os médicos. Ainda naquela época ela ainda morava um pouco mais próxima ao centro de Santa Clarita, numa casinha simples e relativamente afastada, mas de fácil acesso a qualquer um, sendo há pouco tempo que ela tinha se afastado porque teria ajudado uma mulher aqui da cidade que, assim como eu, queria engravidar. Jack demonstrava um fascínio incrível pela história dela ser uma bruxa, um garoto ainda, mas uma das teorias dele é que ela precisava ficar mais afastada da civilização pra fazer as magias dela.

Eu sorri, mas gostei de alguém demonstrar um interesse maior que eu por Eleonore, não seria eu a única louca.

Acabei deixando o local e indo atrás da mulher naquela mesma tarde, eu sentia que não poderia perder tempo, ainda mais sabendo que ela de fato tinha capacidade curativa.

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