O Corvo na Floresta

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O engraçado era que...

Aquela região não tinha corvos.

Desconfiada, passou correndo e se trancou em casa. Que medo! Que sensação estranha!

Depois de ter certeza que as janelas estavam todas fechadas, enfim, voltou-se para a cozinha. Era o que fazia de melhor. Era o que fazia lembrar da mãe. Seu rosto já não lhe vinha nas memórias, mas tinha o cheiro. O toque. O abraço... A voz.

Tirou as panelas do fogo e ficou a esperar o pai.

Esperou... esperou...

Toc! Toc! Toc!

Tinha trancado a casa toda, é verdade. Correu para abrir e...

- Oi, Alice...

Era a irmã, com os olhos cheios de lágrimas...

Alice viu ainda o cunhado atrás, trazendo a barraca de salmão do pai, também chorando.

- O que houve? Cadê o papai? - deu uns passos para fora de casa e ficou a procura-lo - A comida vai esfriar... Papai?

...

O pai, na volta para casa, viu uma ave e pensou em caçar. Alice já estava farta de comer peixe, então ele achou uma boa ideia pegar algo diferente. O inverno estava chegando e qualquer comida era uma boa comida.

- Que ave? Não tem aves por aqui, Cecília...

A irmã balançou a cabeça, indignada.

- Eu sei, Alice! Mas o pai cismou de pegar aquele bicho... E era ave preta. Disse pra ele que era mau agouro...

Ave preta? O corvo! Teve que se segurar para não sair correndo e ir atrás daquele bicho ruim!

- Alice... eu não sei explicar bem o que aconteceu... Eu não sei. De repente papai saiu atrás do pássaro, entrou na floresta, e então ouvimos seu grito. Ele caiu de um barranco e bateu a cabeça num...

Sem querer saber qualquer outro detalhe, a menina levantou e correu para o quarto.

- Alice!

Sozinho! Por que ele foi sozinho? Ele sabe das regras!


Regra número 2 da Floresta: a beira da floresta é enganadora. Não confie em nada por lá.


- Alice? - Cecília batia na porta - Venha comigo para minha casa. Não posso deixar você aqui sozinha!

Ouvia apenas o choro.

O marido veio por trás, colocou a mão sobre seu ombro e sussurrou: Venha, eu volto depois para cuidar dela. Ainda é cedo... Venho antes de anoitecer.

Cecília chorava, afinal, era o pai dela também. Foi puxada para a carroça, enquanto pensava no que faria sem ele...

Alice a esperou ir para então sair e almoçar. Comeu com desgosto. Comeu pensando em como se vingar daquele bicho. A fez dormir desconfortável, a perseguiu e levou seu pai.

Espera... e se o corvo estivesse avisando algo? Não! O pai correu até o corvo, e o corvo o matou! Corvos eram bichos de bruxas. Deve ter enfeitiçado o pai! Ele jamais sairia para a floresta sozinha! É a primeira regra!

Caiu no choro novamente. Os soluços machucavam, de tão bruscos.

Gelo.

Cecília saiu e esqueceu a porta aberta. Sem expressar ou sentir qualquer emoção além de tristeza, Alice foi fechar a maldita porta. Não queria morrer congelada e...

GrimórioOnde as histórias ganham vida. Descobre agora