Todo final é trágico

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No desenrolar do relacionamento algumas coisas tendem a pesar, toda aquela euforia da novidade vai dando espaço para a rotina, os dois estranhos vão se misturando de tal forma que já não se sabe onde se termina um e começa o outro, é natural pegar hábitos, costumes e gostos dos seus parceiros, os amigos de ambos se tornam do casal, os verbos passam a ser conjugados no plural.

É nessa fase que surge a maior dificuldade, onde o fantasma da linha tênue entre o amor e o comodismo vem assombrar os relacionamentos e você precisa parar e analisar com calma de que lado você está. E em muitos casos a ficha cai, a gente percebe que por mais cômodo que seja, por mais que seja bom, não é amor. E após perceber o quanto você está deixando de ser feliz, vem aquela conversa onde é decidida a separação. De forma madura e amigável cada um decide seguir seu caminho.

Como bons adultos que somos, precisamos manter a boa postura em momentos de crise e combinamos que não devemos perder o contato, que o carinho e o respeito continuam, por isso a solução mais viável é manter a amizade.

Certo, antes que me julguem preciso me explicar. Sim, eu acredito que é uma atitude legal, madura e uma boa maneira de demonstrar gratidão ao outro por momentos e experiências adquiridas, mas sejamos realistas, quem está pronto para encarar a ausência diante da presença?

Vai doer toda vez que você encontrar com ele e ter que cumprimentar de longe, por hábito, talvez, mas vai dar aquela sensação de que algo está errado. Quem me diz que é natural vê-lo olhar para outras pessoas da forma como um dia já olhou para a gente? E quando ele contar sobre a mulher incrível que ele saiu no último final de semana? Sabemos que é algo natural, algo que vai acontecer, mas uma coisa é saber, outra é ver.

Ser maduro nem sem sempre é reprimir as dores e usar máscaras de que tudo está bem, muitas vezes é preciso ter ainda mais coragem pra se permitir ser fraco e humano. Ninguém tem o direito – e acredito que não vá – de te julgar por chorar pelo fim do que um dia você se doou. Tem muito de você ali sendo deixado pra trás, tem muito do outro que você adquiriu, tem muito dos dois para dividir, para separar, para avaliar o que você quer levar consigo para o resto da vida. É memória que fica. É sentimento que vai.

Eu acredito que é preciso dar espaço para ausência. Precisamos nos acostumar com a cama vazia, a não receber ligações constantes, a dar play no próximo episódio da série sem se preocupar se ele está na mesma sincronia. É preciso desregular os ritmos, acertar seus ponteiros para aí sim encontrar o espaço em sua vida que ele deve ter a partir dali.

Todo final é trágico. Chore o que tiver de chorar, sinta o que tiver de sentir, ponha tudo para fora, dor não é algo agradável para se cultivar.

Não adianta tentar acelerar as coisas, o tempo é fundamental, deixa doer quanto tempo tiver que doer, deixa sarar aos poucos, vai trocando teus curativos sem pressa, melhor que tarde a recuperação do que ficar sujeita a recaídas.

Até que um dia, no tempo certo, você possa encarar ele ali de verdade, feliz pelas escolhas que fizeram, pelo passado que tiveram, e desejando um futuro tão bom para ele quanto para si. E vai sentir-se grata por esses caminhos que hoje encontram-se paralelos, um dia terem se cruzado.

Olhar crônicoOnde as histórias ganham vida. Descobre agora