Cap. 18 - Dom e maldição

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– Dor de cabeça? – perguntou. – Tudo bem – disse antes que eu precisasse improvisar uma explicação mais convincente.

Não notando suspeita em sua voz, segui para dentro do castelo e, uma vez sozinha, corri usando minha habilidade rumo ao quarto. Lá dentro, olhava ora para a porta, ora para a janela, esperando o momento em que Alex entraria. Torcia para que fosse pela porta. A experiência com altura havia sido traumatizante quando escalamos Mórmon na noite do baile e eu receava que ele tivesse em mente um percurso semelhante.

A porta rangeu e fiquei aliviada ao ver Alex. Abri a boca para perguntar para onde iríamos, mas ele foi mais rápido. Ele me pegou no colo e, sem explicar nada, partiu escadas acima.

Deslocar-me na minha velocidade inumana era como um instinto natural. Estar na velocidade dele era nauseante. Meu estômago ameaçava devolver o café da manhã e aquilo parecia não ter fim. Já havíamos subido várias seqüências de escadas e não chegávamos a lugar algum. Mal acreditei quando ele me colocou de volta no chão. .

– Nunca... – arfei. Cambaleei um pouco para os lados, sentindo as pernas amolecidas como uma humana frágil. Suas mãos me sustentaram pela cintura. – Nunca...nunca, nunca mais faça isso!

– Não foi tão ruim assim – seu sorriso encantador quase me fez pensar que não havia sido. – E chegamos muito mais rápido.

– Foi horrível! – reclamei. – E, se você ainda não percebeu, eu também posso ser rápida! – resmunguei.

– Não tanto quanto eu – provocou, erguendo uma das sobrancelhas de forma sedutora.

– Rápida o suficiente – fuzilei-o com o olhar.

– Vamos – chamou.

Estávamos no último andar do castelo. Não havia portas, ou salas, ou qualquer sinal de que alguém freqüentasse o lugar. Alex subiu em uma escada de madeira, aparentemente improvisada, em um dos cantos do corredor. Acima de nossas cabeças havia uma discreta entrada que nos levava a outro ambiente.

Olhei ao redor e vi que estávamos em uma sala oval. O teto em formato triangular estreitava-se até se tornar pontiagudo, conforme se elevava. Havia um único móvel no ambiente, um sofá verde em um dos cantos. Não havia luz, mas estava claro como se estivéssemos do lado de fora do castelo.

A luminosidade era também o porquê do lugar ser especial. Havia uma imensa vidraça ao invés de uma parede, permitindo a entrada do sol e oferecendo uma vista privilegiada. Através dela, eu via o campo e a extensa floresta que cercava o castelo.

Aquela era uma das torres pontiagudas que fazia parte da construção de nossa escola. O contraste entre o azul límpido do céu e o verde intenso da floresta dava a impressão de que olhava uma magnífica pintura.

– É lindo – falei.

– Foi a forma que encontrei para pagar minhas duas promessas – disse, satisfeito com minha aprovação.

– Duas? – eu só lembrava que ele prometeu responder minhas perguntas.

– Sim. É aqui que costumava vir quando faltava às aulas – revelou.

– Ah... – havia perguntado aquilo no começo da semana.

Alex levantou o sofá verde do canto e o posicionou próximo à vidraça. Aquela era a hora e o lugar, mas, por qualquer razão misteriosa e inconveniente, eu não sabia como iniciar a conversa.

– Então...? – ele quebrou o silêncio.

– Não sei por onde começar – confessei.

– Sendo assim, eu começo – Alex parecia aliviado.

Golfinhos e Tubarões - O outro mundo (Tais Cortez)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora