Dia 54

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"Eu não faço a mínima ideia o porquê de ainda estar aqui...", sussurro olhando para as minhas mãos que estavam pousadas sob o meu colo.

"Então vem para casa. Para junto de mim.", pede e nesse momento sei que ambos estamos a chegar ao ponto de ruptura, aquele ponto em que uma das tuas tiras está a romper e tu não podes fazer nada contra isso.

"Não posso. Simplesmente não posso, ainda não.", suspiro novamente sempre olhando para as mãos que não consigo com que parem de se mexer uma contra as outras, como se houvesse partes de mim mesma que estão a lutar uma contra a outra sem que eu pudesse fazer algo para o impedir. Como se tivesse a combater uma enorme batalha dentro de mim, onde não há vencedores nem vencidos, apenas o prazer do próximo movimento que vai magoar o outro eu.

"Desculpa...", digo e isso o último fio a arrebentar e sei que não consigo fazer mais isto, este jogo que joguei durante todo este tempo, o jogo cliché de fizeres as tuas próprias emoções. Agora essas mesmas emoções estão a jogar contra mim, como uma desforra aguardada à muito tempo. "Eu não consigo esconder-te mais isto."

"Lembraste da noite que nos conhecemos? E como eu estava?", pergunto-lhe tentando, de uma maneira ou de outra, começar o assunto. O loiro assente. "Sempre me perguntaste o porquê de estar naquele estado...", suspiro e abafo um soluço ao lembrar-me da razão. "A verdade é que eu não consigo esconder-te mais a razão. Porque, de uma maneira ou de outra, eu estou à espera que isto aconteça novamente", faço uma pausa tentado continuar e afastando a memória que ocupava a minha mente. "A minha mãe tinha-me obrigado a vir para Portugal porque a minha tia queria passar mais tempo comigo.", começo e não paro de pensar nele. "Eles tinham me dado um prazo de quinze dias. Quinze dias na minha tia e voltava para casa. Não era muito tempo e por mais eu precisava de um tempo noutro lugar, então aceitei.", parei e olhei para os seus olhos azuis encarando as mãos poucos segundos depois.

"Passaram se os tais quinze dias e, nesses quinze dias não falei com ninguém, apenas com a minha tia. Cheguei-lhe a perguntar o porquê de ninguém querer falar comigo e ela desviava sempre o assunto."

"Quando aterrei de novo em Londres, apenas a minha irmã estava à minha espera e não expressava a melhor emoção de sempre."

As lágrimas começaram me a correr pela face.

"Perguntei-lhe o que se passava e o porquê de ninguém ter falado comigo nas últimas semanas. Ela sempre me dizia que era melhor os nossos pais me dizerem, e então esperei mais meia hora tentado descobrir o que se tentava passar e tentar lugar pontos, mas não conseguia nada."

"Cheguei a casa e vi uma expressão na cara dos meus pais que nunca vira antes. Sabes aquela expressão, nos filmes, quando algo de horrível aconteceu? Era exatamente com essa expressão com que eles estavam."

"Perguntei-lhes, na esperança que fosse a última vez que aquelas palavras saissem sem obter nenhuma resposta."

"A resposta não tardou a chegar. O Oliver, o meu namorado na altura, tinha morrido."

A quantidade de lágrimas neste momento já não era a suficiente para libertar a minha tristeza.

"Pelo que disseram, fora ele mesmo que pedira para arranjarem uma desculpa para eu ir embora durante algum tempo. A razão? Uma dessas doenças filhas da mãe."

"Senti-me como nunca me tinha sentido e, quando eles acabaram de falar, eu corri. Corri como nunca correra e quando vi o aquele banco, sentei me e chorei. Chorei por dor, por perda e, acima de tudo, por me sentir traída por aqueles que mais tinha confiança."

Sorri ao lembrar-me do momento a seguir.

"E, quando dei por mim, ali estavas tu. A única esperança que tive naquele momento, embora fosse pequena. Ao olhar para ti, foi como se fosses um gémeo perdido do Oliver. E então prometi a mim mesma que, a partir daquele dia, iria todos os dias àquele Starbucks."

"Mas quando dei por mim, já não te comparava a ele e já estava completamente caída sem poder voltar para trás. Mas quando percebi isso, os meus pais mandaram-me, outra vez, para aqui. E, embora não seja a mesma situação, eu não consigo de pensar que, quando voltar, receba algo assim. Algo que faça o meu mundo girar e que só pare quando encontrar algo que o pare."

Pela segunda vez olhei para o rapaz com olhos azuis e só consegui ver um olhar de compaixão, de um rapaz que, de uma maneira ou de outra, me ama.

[Nota de autora:
A nova capa está na multimédia. Gostam? :)]

Starbucks || njhWhere stories live. Discover now