6 - Sedativos

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Tentei abrir os olhos, mas minhas pálpebras pareciam pesar uma tonelada. Onde eu estava? O que havia acontecido? Não lembrava de nada. Tentei levantar, mas meus membros também pareciam extremamente pesados. Tentei me concentrar, absorvendo o máximo que podia sem abir os olhos. Estava em um lugar com muita claridade, parte da luz passava por minhas pálpebras fechadas. Havia alguma coisa em meu rosto, tampando minha boca, sentia um ar úmido em contato com minha boa e nariz, minha respiração estava pesada e ruidosa, puxava o ar por lufadas, a boca meio aberta para recebê-lo melhor. Em meus braços sentia que havia algo preso, injetando alguma substância em minhas veias. Senti algo grudado em vários pontos de minha cabeça, eram... eram eletrodos de eletroencefalograma? Tentei urgentemente me lembrar, mas não havia nada, minha cabeça parecia um simples vazio. Tentei lembrar de coisas básicas. Qual o meu nome? Sofia. Quantos anos eu tenho? 19. Eu tenho família? Sim, um irmão, Sam. Meu pai? Morreu em um acidente de carro. Algum adulto que cuidava de mim? Richard. Foi quando as lembranças me invadiram, todas de uma vez.

Não, não era possível. Era pra eu estar morta... Eu atirei, atirei em meu cérebro, um tiro a queima roupa, é impossível sobreviver a algo assim. Comecei a me remexer na cama, eu precisava sair dali, mas eu não conseguia. Meus movimentos estavam lentos e pesados, provavelmente estava dopada. Comecei a ouvir algumas vozes, mas elas pareciam distantes. Tentei me focar nelas e logo pude entender alguns fragmentos soltos.

— Ela está... precisamos acalmá-la... batimentos cardíacos... — Quando percebi que estavam prestes a me dopar novamente, me acalmei, ficando parada, quase inerte. Torci para que funcionasse.

— Ela se acalmou. — Podia compreender melhor o que diziam agora. O efeito da droga devia estar passando.

— Talvez tenha sido apenas um pesadelo. — Ouvi alguém dizer. Uma porta foi aberta violentamente, alguém vinha em minha direção com passos firmes e ruidosos.

— Onde ela está? — Tive que me segurar para não esboçar nenhuma reação. Era ele, e parecia estar com raiva, com muita raiva. Pude perceber que ele sentou em uma cadeira ao meu lado. Parei de respirar por um tempo quando ele pegou minha mão. Eu não aguentaria por muito tempo, queria matá-lo com minhas próprias mãos, ali mesmo. — Por que você fez isso Sofia? Você poderia ter morrido, sua idiota. — Ele vociferou em meu ouvido. — Você deu sorte, muita sorte. O que você estava pensando? Ia realmente se matar? Pensou que eu seria estúpido o suficiente para mandar alguém com uma arma de fogo até o seu quarto? — Então era isso, eu não havia alojado uma bala em meu cérebro, mas sim um sedativo. Mas mesmo sendo apenas um sedativo... não era para eu estar viva. Ele provavelmente teria interrompido minhas sinapses por tempo suficiente para me levar à morte, como isso era possível? Ouvi-o soltar um suspiro. — Você foi tão irresponsável. Como pôde? Meu coração quase parou quando a vi cair no chão, por um momento pensei que havia morrido. — Ele falava como se fosse meu pai, tive vontade de rir. Como podia ser tão cara de pau? Tão egoísta? Fechei minhas mãos em punhos, para que elas não voassem em seu pescoço, pude sentir minha pele rasgando sob minhas unhas, devido a pressão que eu fazia para manter as mãos no lugar. — Não tem ideia de como fiquei aliviado quando soube que ainda estava viva. — Sua voz agora era mais suave. Soltei uma gargalhada forte e sarcástica por dentro. É claro que estava feliz, agora eu poderia dizer onde estava a chave, caso contrário ele nunca a acharia, afinal, os mortos não falam, e eu era a única que sabia onde encontrá-la. Mas no que dependesse de mim esse segredo seria enterrado comigo. Eu confiava no meu pai, se ele acreditava naquele outro mundo, então eu também acreditava. E se ele morrera para protegê-lo, eu também morreria, e com muito prazer. Aquele fora o último desejo do meu pai, e eu faria de tudo para cumpri-lo, não permitiria que o Richard o maculasse.

Quando percebi que ele se levantara e estava se afastando, tentei mais uma vez abrir os olhos, dessa vez eu consegui. Uma luz forte invadiu meus olhos, deixando-me cega por uns instantes. Logo que me acostumei olhei para os lados, havia algumas pessoas na sala, todas posicionadas verificando meus sinais vitais em telas de computadores. Em uma mesa ao meu lado havia uma seringa posicionada sobre uma badeja de alumínio. Sedativos. Levantei-me em um único movimento, soltando-me dos fios que me prendiam às máquinas, peguei a agulha e escondi-a em meu à camisola de hospital com que haviam me vestido. Caminhei lentamente, dirigindo-me até o Richard, apoiando-me em qualquer coisa no caminho, quase caí várias vezes, mas continuei, determinada, por mais que minhas pernas quisessem me trair. Pude sentir o olhar de todos em minha direção. Não era para eu estar viva, e muito menos andando. Provavelmente o normal seria eu levar meses para me recuperar, e ainda assim deveria ser com sequelas, não era pra eu sair andando por aí. Quando Richard se virou e me viu, me segurou imediatamente, apoiando-me em seu braços. Foi então que peguei a seringa e enfiei com toda a força que possuía em seu rosto, rasgando pele e carne, puxei-a para baixo, deixando um rastro de sangue em sua face. Ele urrou, mas não era de dor, era de raiva. Foi possível ver seus olhos brilhando de ódio. Não pude evitar que um sorriso se formasse em meus lábios.


— Sua pirralha desgraçada. — Ele gritou, furioso. Ele me deu um tapa no rosto com muita força, caí, batendo com a cabeça na parede em uma pancada tão forte que me fez perder a consciência.

Entre Dimensões: Uma descobertaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora