25 - A viagem

22 2 0
                                    

Acordamos bem cedo no dia seguinte, todos os preparativos já checados e revisados. Gabriel havia pedido férias para poder ir conosco sem levantar suspeitas e conseguira, o que foi, de fato, muito bom para nós, e o Dan, por ser filho do dono, gozava de alguns privilégios, entre eles poder escolher quando queria simplesmente não ir trabalhar, e como era costumeiro que fizesse isso, ninguém repararia. Nos reunimos na sala, as malas já a postos e documentos, todos falsificados, em mãos. Dan respirou fundo.

- Enfim chegou a hora. Depois disso não haverá volta. - Todos tínhamos consciência disso. Deixei bem claro que não precisava deles para fazer isso, mas eles insistiram, e acabei concordando que fossem, desde que prometessem que não tentariam passar pelo portal junto comigo. Essa era uma responsabilidade e um fardo meu e apenas meu. Não deixaria que pagassem por um erro cometido por mim.

- Eu sei. Vocês tem certeza que querem realmente ir comigo? - Questionei uma última vez, mesmo já sabendo qual seria a resposta.

- Absoluta. - Responderam os três ao mesmo tempo. Dei de ombros, desanimada. Eu me preocupava com eles, que passaram a ser responsabilidade minha a partir daquele momento.

- Estou nessa com você até o fim. - Sam me encarava, olhando no fundo de meus olhos. Eu sabia o que estava implícito em sua promessa.

- Sam, já conversamos sobre isso. Você sabe que não vou mudar de ideia.

- E eu já falei que aceito sua decisão. - Respirei fundo, sabia que ele não desistira da ideia, mas não era o momento para discutirmos sobre aquilo.

- Certo, vamos então, e... boa sorte para nós, tenho a impressão de que precisaremos. - Sam apertou minha mão, em um gesto de reconforto. Gabriel me lançou um sorriso otimista. Dan me olhou com carinho, e até mesmo um pouco preocupado.

Descemos e após rápidas despedidas cada um entrou em um táxi diferente, todos rumo ao aeroporto. Depois disso só nos veríamos novamente dali a três dias.

O aeroporto estava lotado quando cheguei. Lotado e tumultuado, vários voos haviam atrasado por conta do mau tempo, inclusive o meu. Havíamos combinado de não nos procurarmos quando chegássemos, no entanto tive a impressão de que mesmo se quiséssemos não nos encontraríamos.

Felizmente eu tinha levado um livro, caso contrário mofaria ali, meu voo atrasou mais de quatro horas. A viagem foi tranquila, apesar de cansativa, mais de vinte horas em um voo direto para Dubai. Passei boa parte desse tempo dormindo, e durante o resto lendo ou vendo um filme. Essa viagem pareceu demorar uma eternidade. Já tinha ido uma vez para Dubai, mas naquela ocasião não parecera demorar tanto...

Assim que meu voo aterrissou e peguei minha mala, fui direto para o hotel. Pegaria o outro avião, agora para Munique, apenas na noite do dia seguinte, o que significava que teria algum tempo para aproveitar a cidade. Ao chegar no quarto do hotel apenas tive tempo de tomar um banho rápido antes que o cansaço me exaurisse completamente, caí na cama e dormi quase que imediatamente.

Era pouco mais de oito horas quando acordei no dia seguinte. Queria aproveitar um pouco o lugar, então logo depois do café da manhã fui para uma das praias menos frequentadas de lá. As praias eram lindas, areia branca e água cristalina, um paraíso tropical. Passei o dia inteiro lá, sempre gostei muito de ficar perto da água do mar, e por algum motivo sentia que demoraria para que eu voltasse a ir a alguma praia.

Sentei-me na areia, perto do mar, as ondas batendo em meus pés descalços. Levantei o olhar, fitando o horizonte. Comecei a pensar em tudo que acontecera nos últimos meses, era tanta informação para assimilar... Quando me tornara tão imprudente a ponto de arriscar tudo por uma coisa que eu nem ao menos tinha cem por cento de certeza de ser real? A ponto de não só colocar a minha vida em perigo, como a de outras pessoas com quem me importava? Astrid, será que ela realmente existia ou era apenas fruto de uma imaginação fértil? Não a via desde a noite anterior à viagem... Lembrei do que ela falou sobre ser comum os feéricos virem a terra e procriarem, imaginei quantos outros iguais a mim existiriam por aí, e quantos saberiam o que realmente eram... Será que valia realmente à pena me arriscar por uma suposta mãe que eu nem sabia se era de fato real? Estava tão confusa... Mas já era tarde demais, agora que começara, iria até o fim.

Quando cheguei no hotel tomei um longo e demorado banho, a água gelada desanuviando minha mente. Depois apenas jantei uma comida leve e fui para o aeroporto. O segundo voo foi uma viagem mais rápida, pouco mais de seis horas. Ao chegar em Munique fui direto à estação ferroviária, de onde peguei um trem para Copenhague.

Havíamos feito reservas em um hotel, onde seria nosso ponto de encontro. O hotel em que ficaríamos parecia saído de um sonho, um antigo casarão de cinco andares cuja fachada lembrava um castelo. No hall de entrada o moderno e o vintage se misturavam em uma combinação perfeita. Fiz o checking e fui para o meu quarto. Ele era confortável, mas não muito grande, uma única cama de casal, um banheiro, uma TV, e até mesmo uma prateleira com alguns livros. Deixei minhas coisas no quarto e fui bater à porta do quarto do Gabriel, para saber se ele já havia chegado - Como ele fora para o Canadá, teoricamente seria o primeiro a chegar. - Ele rapidamente abriu a porta.

- Oi Sofie. - Um sorriso se espalhou por seu rosto.

- Oi El. Os outros já chegaram? - Ele se apoiou no batente da porta.

- Já sim, mas foram almoçar, ia encontrar com eles, mas acabei me empolgando com um novo programa para computador que estou desenvolvendo... achamos que fosse demorar mais para chegar.

- Pois é, a viagem acabou demorando um pouco menos do que o previsto...

- Que bom, né. Estava indo almoçar agora, você quer ir também?

- Sim, claro. - Ele saiu, fechando a porta, indo em direção ao elevador. - Hum, El? - Chamei, um pouco exitante.

- Sim? - Ele se virou na minha direção, uma expressão confusa no rosto.

- É que, ainda não tinha tido a chance de te agradecer devidamente por tudo que você fez. Obrigada por me ajudar quando eu estava presa, por me ajudar mesmo sem ter nenhuma obrigação de fazê-lo e principalmente por se arriscar vindo nessa viagem comigo. Não sei como te agradecer por isso. Muito obrigada mesmo.

- Não precisa agradecer Sofie, estou fazendo isso por que acredito que seja o certo a fazer. E você sabe que pode sempre contar comigo. - Senti um sorriso terno se espalhar por meu rosto.

- Posso fazer uma pergunta?

- Claro.

- Por que você me ajudou daquela primeira vez? - Eu estava coçando para fazer essa pegunta há semanas.

- Pra ser sincero? - Assenti. - Eu não faço a menor ideia... Mas sei lá, acho que... Bem, nunca concordei com praticamente nada do que o sr. Schiavinato faz, nada mesmo, nem na administração da G.S., entrei lá como funcionário da empresa, e por ser amigo do Dan ele pensou que eu era de confiança então me "promoveu" para a parte não regulamentada de lá. Já estava chegando no meu limite, já planejava fazer algo para acabar com a reputação da G.S. e do Schiavinato, e, bem, ver você ali, daquele jeito, meio que foi a gota de água...

- Entendi... Bem, agora você está fazendo alguma coisa para acabar com isso.

- Sim - Ele soltou uma risada fraca. - Acho que foi por isso que concordei tão rapidamente em te ajudar... - Um enorme sorriso se abriu em minha face.

- Mais uma vez, obrigada mesmo.


Entre Dimensões: Uma descobertaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora