Capítulo 2: Quando as luas cobrem o sol

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Mais um dos ventos de inverno varreu as ruas de Torrent quando Ariane enfim alcançou-as. Ela olhou para o céu, de forma a consultar o horário aproximado através da posição do sol. Não estava atrasada, ainda.

Deu um salto por sobre uma pedra que lhe atrapalhava o caminho e seguiu em direção ao bosque, descendo calmamente através das quietas ruas de paralelepípedos.

Tanto do seu lado esquerdo quanto do direito, por entre as gramíneas que nasciam em meio a terra e pedras, as flores do campo típicas da primavera já começavam a aparecer em botões.

As árvores que marcavam seu lugar de destino estavam a cada momento mais próximas, assim como uma alta rocha cinzenta e reclinada. Edric encostara-se nesse último espaço, com as costas apoiadas na pedra.

Apertou o passo. Quanto mais tempo tivessem para conversar antes do eclipse melhor seria. Porém, quando estava bem próxima ― já no campo de visão de Edric ― uma voz conhecida a chamou às costas, doce e calma como de costume.

― Princesa. ― ouviu.

Por quê? Mas, por quê? O que ela havia feito para merecer aquilo?

― Gabriel. ― ela cumprimentou, dando meia volta em direção ao garoto. Um falso sorriso moldurando os lábios. ― Você novamente?

― Mas é claro ― sim, era ele e aquele seu sorriso tosco. Por que ele fazia questão de montar aquele teatrinho todo santo dia sempre que a via? ―, aparecerei ainda mais agora que a primavera está chegando. ― sorriu ainda mais, se é que isso era possível, deixando as covinhas do seu rosto rosado à mostra.

Seus cabelos negros cortados na altura dos ombros voavam com o vento e os seus olhos cor de mel brilhavam na luz. Sua blusa branca, quase transparente, estava desabotoada perto gola, deixando parte do peito definido à mostra.

Gabriel era o filho mais novo de Otávio de Gloriam, morto na batalha em que o pai de Ariane dera o mesmo fim a Salazar. Agora quem governava o ducado era a viúva, Duquesa Dolores.

Ele havia se mudado para Torrent há anos no intuito de estudar, e era o que continuava sendo dito todas as vezes que alguém perguntava algo, mesmo que não fizesse o mínimo sentido para Ariane.

Se Gabriel de Gloriam fosse adquirir conhecimento intelectual, deveria ter ido para o ducado de Epistolis. Já se o objetivo fosse graduar-se em combate e as artes da guerra, nem mesmo deveria ter saído de casa.

O garoto olhou ao redor, examinando os botões de flores que decoravam o chão por entre a grama verde. Não demorou muito em seu trabalho, pois logo escolheu um e o colheu.

O feiticeiro dispôs o botão cor-de-rosa entre ambos, segurando-o com a mão esquerda e então abrindo a outra mão, completando um simples encantamento primaveril e fazendo o botão se abrir em flor.

― A primeira flor da primavera para a princesa. ― ele falou, sentiu o perfume das cinco pétalas e entregou a flor delicadamente à garota, que a aceitou mais por educação do que por outra coisa.

Não demorou muito a partir daí e o garoto despediu-se e partiu. Foi só o tempo de ele virar as costas para o sorriso se desmanchar no rosto de Ariane.

― Esse garoto não se toca! ― reclamou, usando de seus poderes de inverno para congelar a planta.

A feiticeira voltou-se novamente em direção ao bosque, deparando-se com Edric, que vinha em sua direção enquanto ria descontroladamente. Como que aquilo poderia ser tão engraçado?

― E você ri? ― inquiriu sofregamente. Sua resposta veio com outro riso, que se prosseguiu. ― Será que você consegue parar? ― ela pôs uma mão na cintura.

Uma História de Primavera [DEGUSTAÇÃO]Onde as histórias ganham vida. Descobre agora