6- "The winter is coming"

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Em um movimento rápido e inesperado ela me atacou três vezes, dando três ataques divididos aleatoriamente. Todos acertaram seu alvo.
— Não acha que devia pegar leve?
— Na hora H ninguém vai pegar leve com você! — Ela desferiu mais três ataques na minha cabeça — Você tem que aprender a lutar, e mais importante, tem que aprender a ignorar a dor.
— Mais fácil falar do que fazer!
Tentei pega-la desprevenida para tomar o bastão de sua mão, mas ela desviou e me acertou novamente
— Está muito lento!
Cada vez que ela me acertava eu me contorcia de dor, pondo a mão sobre o local.
— A dor está na sua mente. Você não pode se machucar! Lembre-se disso, você não precisa reagir a ela.
Ela deu outro golpe na minha orelha, mas eu ignorei e me foquei no bastão, e então, quando o bastão se aproximou para me dar o segundo golpe, eu consegui segura-lo.
— Consegui! — exclamei.
Ela puxou o bastão e me acertou do outro lado da cabeça, me fazendo cair desorientado.
— Concentração.
— Você tá brincando comigo? Eu consegui.
— Você continua reagindo a dor. Seu corpo é como uma rocha e sua mente é uma geleia, você nunca vai ganhar uma luta assim.
— Eu não preciso! Você ouviu amnon, eu tenho um dom pra magia. Ninguém terá a chance de se aproximar o suficiente pra me acertar com um bastão.
— Você não pode contar sempre com seus poderes.
Eu já havia treinado a uma semana em segredo. Desde minha transformação eu mal descansava, todos estavam sempre colocando pressão em mim, sempre dizendo o quanto eu era fraco e deveria treinar. Cada vez que eu tinha chance arranjava um jeito de fugir para a casa na floresta, e lá eles me treinavam para habilidades de combate e domínio dos meus poderes. Não tive tempo para muitas aulas teóricas, apenas algumas explicações rápidas, a maior parte do tempo eles me treinavam para combate. Mas mesmo com isso tudo, mesmo depois de tanto esforço, era sempre "Você precisa se esforçar mais! Está muito lento! muito fraco!".
Eu me levantei, e quando ela me deu mais um golpe na cabeça, meu sangue ferveu. Eu avancei em cima dela e a empurrei para longe, fazendo-a cair no chão. Ela tentou revidar, acertando meu joelho com o bastão, mas eu me desviei e segurei o bastão de madeira, desta vez puxando-o da mão dela e quebrando-o no meio.
— Chega de treinamento de combate.
— Você não vai sobreviver um mês assim. Não pode achar que só vai precisar revidar alguém quando você estiver irritado, você sabe que estou certa. Você pode ter extinto, mas se não souber técnica alguma não passará de um animal lutando às cegas.
Eu sabia que ela estava certa, sky tinha um ótimo pressentimento pra isso, mas não interessava, eu não estava afim de levar mais pauladas na cabeça, então dei as costas e entrei em casa.
Mais tarde, quando começou a anoitecer, era a vez de amnon me treinar. Ele tentava me ensinar a controlar meus poderes.
Nós saímos e ele levou um livro grosso na mão.
— Antes de prosseguirmos tenho que te contar uma coisa. Primeiro de tudo, você tem que entender que, nossos poderes são diferentes dos poderes dos médiuns. Bom, enquanto eles manipulam o mana, uma energia natural, nos manipulamos uma energia mais sombria, então as magias que eles usam, na maioria não podemos fazer.
— Então o contrário também é válido, correto? O que fazermos eles também não conseguem.
— Quase isso — concordou ele, se sentando perto de uma árvore e curvando uma tocha sobre o livro, para que eu conseguisse ler — Este é um dos poucos livros de vampiros que nós temos. Ele fala sobre feitiços de batalhas simples. É um guia básico.
— Legal —comentei, folheando os manuscritos do livro e os desenhos de símbolos e criaturas.
— Para entender os limites dos nossos poderes, Cameron, tenho que te contar a história do primeiro dos vampiros, o mais forte da nossa raça. Eu vou te contar a história de Caim, o filho de Adão e Eva. Sugiro que se acomode, é um longa história.
— Já ouvi algo sobre essa história, minha mãe é extremamente religiosa.
— Sim, mas a história bíblica passa pelo assunto de uma maneira muito... Superficial. Enfim... No início, haviam apenas Adão, Eva e seus filhos, que habitavam a terra, e dentre eles, Caim, o filho mais velho é ciumento, acabou por matar seu irmão. Vou pular essa história, mas houve uma "treta" envolvendo sacrifícios e ambos tentando agradar a deus. Nos final, Caim, depois de assassinar seu irmão, foi amaldiçoado com a marca de Caim. Ele foi amaldiçoado a viver eternamente, fadado a perambular perdido e arrependido até o fim dos tempos, foi amaldiçoado a viver sozinho, pois uma sede de sangue o faria assassinar a todos que se aproximassem, foi proibido de aparecer ao sol, pois aos olhos de Deus, ele queimaria e sofreria por seus pecados e sua alma foi corrompida e deformada, de modo que ele nunca mais chegaria perto de ser um humano novamente.
— Então é daí que vem todas as desvantagens...— Comentei, acariciando o anel de metal preto, apreensivo com a notícia.
Aquele era o anel que Maria havia me dado na manhã do meu primeiro dia. Ele era o mesmo anel que amnon usava, um item raro e amaldiçoado, feito para nos proteger das queimaduras do sol. Por mais que as lendas dissessem que queimávamos até a morte, o contato com o sol não era literalmente mortal. Nós nos queimávamos seriamente, e dois muito, mas na pior das hipóteses entraríamos em combustão e, de acordo com amnon, nosso metabolismo se desligaria, entrando em animação suspensa. Um sono que poderia durar anos.
Eu fiquei realmente impressionado da primeira vez que usei. Como uma coisa tão pequena e simples poderia fazer uma influência tão grande? Se eu o deslocasse para o meio do meu dedo, já era suficiente para sentir a proteção deixando meu corpo, e as leves queimaduras de sol começando a arder.
— Mas a história não acaba aí.
Ele falou alto, percebendo que eu havia me distraído.
— Quando fomos expulsos do convívio humano, a besta surgiu, o arcanjo caído em pessoa. Aquele que também foi amaldiçoado. Ele convenceu Caim a servi-lo, e ele lhe daria suas bênçãos, garantindo a ele poder e vingança, em troca de um favor, de que ele e seus decendentes lhe servissem por toda a eternidade. Caim, desolado e renegado, aceitou sua proposta — Eu escutava com atenção, nunca havia ouvido este lado da história — Lúcifer disse que Caim nunca mais sentiria falta da luz do sol, pois a partir daquele dia, ele seria o rei da noite e de todas as criaturas sombrias. Ele lhe prometeu nunca mais ser solitário, pois o Diabo garantiria que ele teria o poder de criar novos descendentes; ele lhe deu o poder de criar novos vampiros. Ele disse que Caim não sentiria falta de uma alma, pois tudo que os homens tinham em poder, ele lhe daria, porém viria de uma fonte diferente. Ele criou uma ligação de Caim com o próprio inferno, lhe dando controle sobre as artes das trevas, e finalmente, ele lhe deu a última de suas benções. Ele lhe prometeu a servidão de seus demônios, de modo que, quando chegasse a hora, os vampiros tomassem o lugar de generais, e guiassem o exército das trevas sobre a terra, vingando-se dos humanos e de sua arrogância.
— Então é isso, eu sou uma criatura amaldiçoada. Não temos alma, não temos coração e estamos eternamente ligados às sombras. Nós não passamos de demônios, usados pelo anjo caído pra uma vingança infantil.
— Não seja idiota, Cameron. A questão não é de onde vem o poder, mas o que fazemos com ele. Somos uma das espécies mais poderosas da terra, podemos fazer quase qualquer coisa. E é aí que eu queria chegar. Eu vou te ensinar a lidar com cada um de seus dons.
— Eu achei que já estivéssemos fazendo isso. Você me ensinou a usar os objetos e acender as tochas, me disse que estava evoluindo rápido.
— Aquilo é brincadeira de criança perto do que aprenderemos agora. Eu te ensinarei a realizar feitiços complexos, e o mais importante, evocar suas próprias criaturas e controla-las.
Eu passei a noite me esforçando muito. Diferente das aulas da sky, amnon exigia calma e silencio. Ele me ensinou a recitar os feitiços em minha mente e me concentrar, juntando a energia para completa-los, mas tive sucesso em poucos, ainda havia muito caminho a se traçar.
— Vamos! Você deve repetir a palavra em sua mente, relaxar, criar o relâmpago e depois concentra-lo
Ele se acalmou, repisou fundo e esticou a mão pra frente. As primeiras faíscas se formaram, e logo um relâmpago surgiu, de cor vermelha sangue, ele saiu de seus dedos, atravessando o ar e acertando uma árvore.
Eu tentei em seguida, mas saiam apenas faíscas, eu sempre falhava na hora de colocar a energia para fora de mim.
Já de madrugada, depois de muitas tentativas eu comecei a ter sucesso em algumas. Não era sempre que conseguia realizar o feitiço, mas para uma primeira vez estava ótimo. A cada cinco tentativas uma saia correta.
— Acho que chega por hoje, vamos entrar. Amanhã é domingo, você tem que voltar pra sua casa, continuamos outro dia.
Durante o tempo em que eu ficava na floresta as horas voavam. Eu já havia esquecido de que teria de voltar para casa no outro dia, havia esquecido que tinha de ir pro colégio segunda e que precisava pensar em uma desculpa para chegar tarde em casa na segunda. De repente eu estava tão empenhado naquilo, que minha vida antiga é que parecia surreal.
Para minha mãe e minha irmã eu estava fazendo parte de um acampamento de escoteiros, eu não podia contar pra eles a verdade, eles não entenderiam. Me chamariam de louco.
Amnon insistiu que eu largasse o colégio e minha vida antiga, mas os outros sabiam como era difícil, e logo Rebeca e Maria chegaram à conclusão de que seria melhor se eu continuasse com minha vida antiga o quanto conseguisse. Não poderia apenas largar tudo pro ar e ir morar na cabana, era uma ideia louca. Então estava decidido, eu iria para lá depois do colégio, aprenderia, caçaria com amnon nos finais de semana e esconderia da minha família que... Bom, esconderia tudo da minha família.
Fácil não é? Não. Tudo começou a dar errado na segunda semana, quando Rebeca e amnon me chamaram para conversar. Rebeca tinha tido uma visão, ela previu a inquisição fazendo uma espécie de investigação, eles iriam a um colégio próximo.
— ... Nós precisamos da sua ajuda, Cameron, você já aprendeu o suficiente pra ir pro campo de batalha. A inquisição vai fazer um exame de rotina, eles vão visitar o seu colégio e testar todos os garotos de algumas salas.
— O que eles procuram? Achei que eles estivessem acabado com todas as criaturas da ilha.
— Quase todas. Eles acabaram com os Monstros, mas o que eles procuram não se transmite pelo sangue, é impossível de se exterminar. Eles estão a procura de pessoas especiais, médiuns, pessoas com potenciais mágicos, igual ao caio, Skyler, e outras pessoas com dons.
— Eles estão procurando por adolescentes? Eles não pretendem exterminar eles também, não é?
Eles se calaram, deixando a resposta para minha pergunta subentendida.
— Eu to dentro. Qual o plano?
— Ótimo, vamos precisar de toda a ajuda possível. Na verdade é bem simples. Eles vão passar o teste como um outro qualquer, eles sempre são discretos quanto a isso. Mas depois de examinar cada aluno, eles vão marcar uma reunião com todos aqueles que tiverem passado no teste, e então eles simplesmente somem. Nos não sabemos para onde são levados ou o que fazem com eles exatamente, mas no momento da reunião é a nossa melhor chance. Nós vamos entrar lá, apagar o F.D.C.P e tirar os garotos de lá. Isso tudo o mais rápido o possível.
— E depois disso? O que acontece com eles? O governo nunca vai deixar eles em paz, vão ser perseguidos pelo resto da vida.
— Nos não temos o material para testa-los e trazê-los para cá antes dos policiais chegarem, se é isso que você está propondo. Mas nós garantimos a proteção deles. Isso não é só uma missão de resgate, nós também precisamos de mais recrutas. Nós iremos treiná-los, criar uma nova geração de médiuns. Nós vamos ressuscitar os antigos costumes, trazer a magia de volta à vida. Este é o plano, trazê-los para casa, protege-los e treiná-los, igual fazemos com você.
— Você tem certeza? Vocês vão conseguir cuidar deles aqui?
— Não se preocupe, esse lugar tem estrutura pra suportar mais de quarenta pessoas. Os quatro quartos são bem grandes, e não existe lugar mais seguro na ilha. Eles vão ficar bem aqui. Com você do nosso lado o jogo vai virar — Diferente de mim, Rebeca parecia bem confiante do plano.

O último vampiro progenitor - pausadaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora