Capítulo 10 - Nadar ou se afogar?

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A influência de James Carter na vida de alguém era algo esmagador. Ele estava impresso em cada fio de pensamento, em cada tom malicioso e em cada gesto irreverente que eu era capaz de testemunhar ou elaborar. Era como se ele tivesse pressionado minha mente com ferro quente: ele estava sempre lá, oculto das banalidades mundanas, marcando seu contorno nas minhas pálpebras desleixadas. Eu tentava cegamente me desviar da sua imagem ilustrativa, que atacava minha mente fraca com flashes sucessivos, mas, todas as vezes que estava remotamente desconectada do meu corpo e das minhas divagações, sua promessa velada teimava em ecoar pelos meus ouvidos, cheia de malícia e luxúria. Seu tom lascivo ricocheteava pelo meu ouvido como uma carícia proibida pelo resto das manhãs, deixando-me totalmente alheia às aulas, ao clima, às pessoas, à relevância de qualquer coisa. Sua onisciência nos meus dias era quase irritante.

Pelo histórico debilitado da minha pacata vida amorosa, eu deveria conhecer os sintomas. O nervosismo agudo, o orgulho brilhando sem conformação, a reação ácida à sua presença, as respostas mordazes acumuladas na ponta da língua, os sentimentos presos na garganta. Eram todas etapas práticas para o aterro ambulante que precedia meu emocional instável. Eu sabia a história de cor e salteado. Os sintomas copiosos, o comportamento repetitivo... Eu não precisava de uma realização cósmica para saber que estava numa zona perigosa, cheia de turbulências e correntezas emotivas. Não adiantava evitar, já havia provado os dissabores da sua personalidade intrínseca. Já vi o bom, já provei o mau, já testemunhei cada relance possível das suas reações. Mas nada do meu alerta natural de anti-desilusão conseguia dissociar minha teimosia em me aventurar nas águas incertas da sua imponente influência. James Carter era como um dia de maré alta, cheio de ondas imperiosas e correntezas traidoras, enquanto eu estava acostumada à constância das ondas baixas. Mas, como qualquer coisa ilícita e cheia de persuasão, eu era naturalmente atraída pela forma selvagem que ele se agitava. Dividida entre o querer e poder, quase me afogava no mar da sua presença. Eu atingia o fundo, tomava um pouco de impulso, engolia muita água, batia os braços desesperadamente, sentia uma caimbra nos membros, cedia um pouco à correnteza, afrouxava meus movimentos e pensava, determinadamente: ou eu nadava ou me afogava.

Estar perto dele era como se afogar.

Mas meus membros eram muito resolutos ao insistirem em manter o nado firme e a independência intacta.

Marien, por outro lado, parecia estar presa na sua própria encruzilhada sentimental. Desde que anunciou sua participação na piada de prêmio que ganhei (definitivamente não atribuirei nome à coisa, apenas para evitar o surto psicótico ao dar uma nomenclatura à situação. Afinal, sair com o assunto favorito da massa feminina, com duas babás com um péssimo histórico consensual, sem mencionar um garoto estrangeiro, fã de palavras exclamativas, que tem o péssimo hábito de soltar provérbios espanhóis como passatempo, protagonizando a cereja do bolo, não se encaixa no conceito de encontro promissor socialmente aceito), anda pela casa lamuriada, resmungando pelos cantos e batendo todas as panelas apenas pelo prazer de perturbar a serenidade da noite. Como se ela quisesse fazer questão de que, se ela não estivesse em paz com a própria mente, assumiria a missão de provocar o inferno na vida dos demais seres humanos isentos de preocupações. Muito altruísta da parte dela, se me perguntam. Esse aspecto miserável e irritadiço não se assentava com sua loucura característica. Ela já não possuía o sorriso flexível e a aura contagiante. Alguma coisa, não importa o que fosse, conseguiu penetrar bem fundo nos seus nervos. Tudo o que ela fazia, desde a noite do bingo, era xingar audivelmente, reorganizar suas coleções de sapatos, como uma terapia mental fraca, e repetir, como um mantra pessoal, sobre como o sobrenome Carter era amaldiçoado pelas entidades supremas. De certo modo, quando ela tentava manter as estribeiras do seu autocontrole, depreciar o nome do causador da sua irritação conseguia abrandar seu temperamento.

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