Silêncio

544 61 4
                                    

            Os dias foram passando lentamente, um após o outro. A verdadeira sensação que eu tinha lá dentro era que eu estava preso em ciclo sem fim, tendo que viver o mesmo dia para a eternidade. Por um tempo cheguei a suspeitar que aquele era o próprio inferno, vivendo um dia inteiro para no outro dia acordar e comer exatamente a mesma quantidade do dia anterior – somente o suficiente para não morrer de fome. – encarar a sala vazia, às vezes ir para a sala de socialização, voltar para a cela e dormir. Não havia nada interessante lá dentro, não havia jogos ou qualquer maneira de se passar o tempo. Mas de qualquer modo o tempo sempre passava, uma hora ou outra o tempo sempre acabava passando e um novo dia nascia. Quando finalmente pude sair para a área externa – que era, para resumir, uma enorme sala com paredes de quatro metros, sem teto e com chão de cimento. — Pelo menos pude respirar o ar puro, olhar diretamente para o sol, mesmo que eu não pudesse manter meus olhos abertos. Aquilo era maravilhoso, abri os braços e senti a brisa leve em meu rosto, eu não sabia como eu nunca havia dado valor ao vento antes.

Conforme os dias foram passando e as idas ao pátio se tornaram recorrentes, meu mundo voltou a monotonia de antes. Um dia no pátio bati a cabeça forte na parede só para eles me levarem para a enfermaria, queria estar em um lugar diferente, ver pessoas diferentes, a verdade é que eu já estava agindo feito louco. Cortei minha testa porém ninguém me levou para lugar novo nenhum, me levaram novamente a minha cela e me deixaram lá jogado as traças, a verdade era que eles não se importavam se você viveria ou morreria naquele lugar.

— O único jeito de sairmos daqui é morrendo – disse o homem que não gostava de nomes na sala de socialização. Apelidei-o de George, embora esse provavelmente não fosse seu nome real.

— Isso é de muita ajuda – Ironizei.

— Tenho fontes quentes que vão nos ajudar a sair daqui – disse George – Agora você faz parte do plano, eu vou começar essa noite, espere mais alguns dias para começar, assim ninguém suspeitará, certo?

— Certo – falei – Mas me conte logo.

— O cara chata me disse que quando ele desmaiou o levaram para a parte subterrânea do prédio – Cara chata era como George se referia a um paciente chamado Larry. – O que vamos fazer é fingir que estamos muito doentes, não vamos comer, se possível, nem nos mexer, eles vão nos levar lá para baixo, então o que vamos fazer é fingir que morremos – ele fala baixinho para que ninguém ouvisse. – Eu sei que eles não queimam os corpos aqui, existe uma linha de trem que passa bem atrás do prédio, o que vamos fazer é nos misturar com os mortos para sermos levados, não sei onde vamos parar, mas na primeira oportunidade saímos do trem e fugimos.

— Até parece simples – disse eu. – Tomara que dê certo.

— Essa é a ultima vez que nos falamos – ele estendeu a mão. – Foi bom tem alguém para conversar.

— Nos vemos do outro lado – Apertei a mão dele. – Não vai me dizer seu nome?

— Se nos vermos mais uma vez, e se Deus permitir nós vamos, ai então você saberá meu nome – disse ele.

Não executei o plano logo de cara, esperei quatro dias, primeiro deixei o prato de comida cheio, não comi uma colherada daquela gororoba – e Deus sabe como isso foi difícil — depois me deitei de bruços da cama e não me mexi por mais três dias, na verdade isso foi mais fácil do que pensei que seria. Eu já estava acostumado com a monotonia, é claro que primeiro ninguém se importou. Eu sentia a metamorfose dos meus músculos virando pedra, tinha vontade de me levantar para relaxar um pouco porém não o fiz. Não queria estragar todo o plano por causa de alguns segundos de alivio.

Quando vieram me buscar para o dia de ir a socialização eu não me mexi. O homem do qual não eu não vi o rosto me deu um tapa nas costas, porém continuei imóvel.

As Pontes InvisíveisOnde as histórias ganham vida. Descobre agora