𝘾𝙖𝙥í𝙩𝙪𝙡𝙤 1

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Eu nunca fui boa em história. Nunca entendi por que as guerras existiam, muito menos por que países inteiros se envolviam em conflitos que nem ao menos os pertenciam.

Desde o início na escola, sempre soube que o Brasil começou a enfrentar uma crise energética sem precedentes. Aprendemos que nossas reservas de petróleo estavam em declínio e que a produção de biocombustíveis não era suficiente para atender à demanda crescente de nossa indústria e população.

Então foram descobertas as vastas reservas de petróleo na região do Golfo Pérsico. Para garantir seu acesso ao petróleo do Oriente Médio, o Brasil formou uma aliança econômica com a Arábia Saudita, que prometeu fornecer petróleo em troca de apoio militar contra seus inimigos regionais, especialmente o Irã. Essa aliança foi vista como crucial para a sobrevivência econômica e energética do Brasil. A Argentina, enfrentando uma situação energética semelhante, decidiu nos apoiar, formando a aliança sul-americana.

Lembro-me de como essa decisão foi recebida com mista indignação e resignação. Alguns argumentavam estarmos nos metendo em uma guerra que não era nossa, enquanto outros acreditavam que não tínhamos escolha se quiséssemos garantir a estabilidade e o crescimento econômico do país. Eu estava no último ano do ensino médio quando essa aliança foi oficializada, e as consequências começaram a afetar nossas vidas cotidianas.

Mas, só um ano depois de eu me formar, que o Brasil e a Argentina realmente começaram a enviar tropas para o Oriente Médio.

Foi um processo lento.

Todo esse conflito trouxe consigo uma série de desafios e dificuldades, desde o aumento dos preços dos combustíveis até a instabilidade política que afetou a todos. Mas o que mais me marcou foram as histórias dos soldados brasileiros enviados para o Oriente Médio, muitos dos quais nunca voltariam para casa. Era difícil conciliar a necessidade de sobrevivência energética com o custo humano e moral de uma guerra tão distante de nossas fronteiras.

— Como está se sentindo, doutora Helena? — A voz do otorrinolaringologista soou abafada, ao menos foi assim que imaginei. Me esforcei para ler seus lábios, ainda era muito estranho para mim, faz menos de uma semana que perdi minha audição.

— É muito estranho estar deitada em uma cama tão macia e limpa, comer comida quente e não ouvir gritos. Estou me sentindo um pouco diferente, mas bem. — Tentei sorrir, ainda processando a nova realidade.

Era um pouco agoniante estar em um ambiente tão calmo e pacifico, mas tentei me animar com isso. Fazia quase um ano que eu não dormia profundamente e que estava verdadeiramente limpa, sem aquela crosta de poeira em minha pele.

Entretanto, eu não ouvia mais.

Eu estava acabando a amputação das duas pernas de um soldado gravemente ferido quando meu corpo voou contra o outro lado da tenda, batendo em um armário de suprimentos. Tudo aconteceu em um piscar de olhos, o som da explosão ainda ressoando nos meus ouvidos. Senti uma dor excruciante na cabeça ao colidir com o chão. Tudo se reduziu a um zumbido agudo, ensurdecedor, que preenchia meus ouvidos. Tentei me mexer, mas havia restos mortais de pessoas sobre mim, o peso esmagador me mantendo presa ao chão.

Tentei gritar, chamar por ajuda, mas nenhum som saiu da minha boca. Era como se o ar tivesse sido arrancado dos meus pulmões. A visão começou a se turvar, o ambiente ao meu redor se dissolvendo em sombras e borrões. Minha consciência foi se apagando lentamente, me levando para um lugar de escuridão e silêncio.

Acordei alguns dias mais tarde, já em um hospital brasileiro. A claridade me atingiu como um golpe, meus olhos piscando contra a luz branca e estéril da sala. Eu estava deitada em uma cama de hospital, cercada por máquinas que monitoravam os sinais vitais. A sensação de confusão e desorientação era esmagadora. Não sabia ao certo onde estava ou o que aconteceu.

Enquanto Te ProcuroWhere stories live. Discover now