Episódio 14 - Liera: Traição

Start from the beginning
                                    

- Eu agradeço, Kassandra! Em especial pelas tuas sábias palavras que me aconselharam a prosseguir desta forma! - Respondi à minha conselheira enquanto entreguei à Cassius um sorriso sarcástico.

- O garoto sobrevivente do ataque à Astandor também está aqui. Se estiver bem para isso, ele deseja vê-la! Posso levá-la até ele imediatamente.

Sem hesitar, eu estendi as mãos e Kassandra me levou ao garoto com uma performance mágica. Ao entrar nos aposentos vi que ele tremia como se falhasse em conter as próprias emoções. Havia ainda algo mais, uma energia nova emanava do jovem Dranô, a energia dos Filhos da Guerra.

- Eu não vou mais me desculpar pelas coisas que você tem passado. Penso que palavras não serão capazes de trazer conforto...

Nossos olhares se cruzaram, eu vi um brilho diferente no fundo dos seus olhos que refletiam a minha imagem levemente distorcida. Com as mãos trêmulas ele segurou as minhas e as posicionou em sua cabeça.

- Isso é uma permissão? - Ele assentiu. Eu não queria que restassem dúvidas sobre sua intenção. - Kassandra, cuide dos nossos corpos.

Performar a leitura mental para adentrar a mente de alguém era algo simples, manter-se ali era a parte complexa daquela magia. Todo mentalista sabia que, sendo a mente o cerne da intimidade dos seres, ela é também o lugar onde temos mais força mesmo que não tenhamos consciência do nosso potencial. Mentalistas experientes travaram batalhas dentro da mente de outros seres e morreram no processo, geralmente acontecia em mentes perturbadas, onde o alvo não controlava a própria força ou a de suas aberrações internas que nada mais são do que versões catastróficas de nós mesmos.

A mente de Dranô foi uma das mais críticas que eu entrei. A perturbação por todas as violências às quais ele ficou exposto o tornaram uma pessoa instável, em completo descontrole emocional e com um ressentimento que tinha forma própria, tinha vida própria. Ele estava preso no momento em que abandonou a irmã, quando ele a entregou para a morte pelos exilados naquele ataque. Não, aquela não era a forma como tudo havia acontecido, eu conseguia ver o véu da realidade que separava a fantasia do concreto. Eu vi que a ele não foi concedida a chance de fazer diferente.

Eu vi seu desejo pela despedida apropriada, o anseio pelos ritos justos que o ajudariam a superar a perda da família. Eu senti a culpa atribuída à Tagi e o desejo de vingança, desejo de morte que se associava também ao Executor e... a Leona? Aquele sentimento me causou estranhamento. Eu não consegui encontrar por meios próprios a lembrança que me explicasse aquele desejo, eu precisava que ele a trouxesse a mim e expressar aquilo exigiria extremo cuidado.

- Dranô, eu posso entender sua relação com a regente da Nação Exilada?

O caos de sua mente perturbada tomou a forma de uma densa tempestade. Eu tentei entender se ele estava respondendo com violência ou me expulsando por ter recusado o meu pedido, não havia espaço para interpretações equivocadas ali, era certo que um de nós sofreria uma morte fulminante caso eu precisasse me defender. Mas ele não me atacou, tampouco me expulsou. A tempestade foi causada pela dor que ele sentiu ao acessar aquela lembrança.

"Existem lembranças que não te causem dor, Dranô?" Pensei ressentida.

Nós voltamos ao momento do ataque ao Vilarejo da Fronteira. Eu senti a energia dos Executores, em particular a assinatura daquele que já era conhecido por ele. O garoto queria vingança à sua forma, morrer em seus próprios termos. A performance da levitação se fez presente... era ali que ela entraria? Sim, ela o salvou da execução. Ela lhe deu a palavra de ordem e... atuou em auxílio ao Executor? Eu precisava de mais detalhes.

- Eu preciso que se esforce para me mostrar mais. Tudo o que você tiver, tudo o que se lembrar!

Ele me trouxe a lembrança das palavras da regente.

AcallaWhere stories live. Discover now