capítulo 1 🌓

39 7 0
                                    

As ruas estavam estranhamente vazias e silenciosas nessa manhã, trazendo melancolia aos solitários e suspense aos amantes de mistérios.

Xiao Zhan não se importava com isso, para ele, era extremamente reconfortante a sensação de uma cidade vazia, mas naquele dia, talvez fosse um pouco demais.

Em sua caminhada matinal, ele parou para descansar e beber um gole de água em frente a uma loja abandonada. Era possível observar seu reflexo no vidro empoeirado, e vislumbrar o lixão que havia se tornado o interior do prédio.

Não ficou ali por muito tempo, logo voltando a passos calmos para casa, apreciando a sensação de ter a cidade apenas para si, mesmo que por um instante.

Assim que pôs os pés no assoalho de seu apartamento, sentiu a cabeça pesar com o turbilhão de pensamentos invadindo sua mente novamente.

Enquanto caminhava, havia esquecido brevemente tudo que acontecera na noite passada. Mas agora, a lembrança estava extremamente vívida, gritando em sua mente; É sua culpa.

Naquela noite, Wang Yibo esteve em seu apartamento. Ele o recebeu con o mesmo carinho de sempre, mas o olhar do mais novo estava diferente, parecia cansado, e não físicamente, porém mentalmente.

— Oi... — Xiao Zhan estava sem graça diante dele. Sua relação não estava mais a mesma havia algum tempo, mas nenhum dos dois ousou dizer nada até agora. — Entra...

— Se não vão nos ver? — Yibo dizia como se fosse algo que já estava acostumado a ouvir, e talvez fosse verdade.

Ele entrou com passos arrastados e deixou seu casaco no cabideiro ao lado da porta. Depois de trancar a porta, Xiao Zhan se virou novamente para ele. — Você não me parece muito bem... — Sua sentença fora interrompida, quando Wang pendeu a cabeça sobre seu ombro, fazendo com que os fios castanhos encostassem levemente em seus lábios.

Sem reação, o moreno fez um carinho suave em suas costas geladas por baixo da camisa branca. Yibo fungou uma vez e o abraçou fortemente, passando os braços por sua cintura em um aperto quase desesperado.

Nesse momento, Xiao Zhan sentiu uma dor que nunca havia sentido antes. Ele sabia de onde vinha, vinha de seu peito, de seu coração. Arrepios gelados percorriam seu corpo, e seus olhos ardiam com a súbita vontade de desmoronar.

— Eu sinto muito. — Pediu o Wang com a voz embargada.
— Por favor, não sinta... — Soou como um apelo urgente. — você não pode sentir.

— Sei que me pediu para não voltar ao assunto, mas não dá...

— Yibo, você não entende...

— Eu entendo tudo, Zhan-ge. — Se afastou apenas o suficiente para encarar-lo. — Eu não posso mudar o que você pensa, e eu nem quero fazer isso.

— Yibo, você é jovem, você não tem nada a perder...

— Não tenho. Por que tudo que eu queria ter é você, mas não se você não permitir. Se não se permitir. O resto, eu não me importaria de abrir mão.

— Você diz isso sem pensar.

— Não digo. Acredite em mim ao menos uma vez.

— Yibo, eu preciso de tempo... — Xiao Zhan sentiu outro arrepio, mas esse era bom. Bom como quando eles estavam juntos, como quando suas bocas se tornavam apenas uma. O arrepio se deu ao toque suave da mão do mais novo indo de encontro a sua bochecha rosada, contendo a vontade de chorar.

— Eu sei. E eu respeito isso, Zhan-ge. — Sua voz diminuiu um tom. — Eu também preciso. — Suas testas se uniram em um toque de afeto por um instante.

Porém não durou muito, até que o Wang se separasse completamente do laço. Ele esfregou os olhos algumas vezes para afastar as próprias lágrimas, e sorriu. Um sorriso que estava claro que não queria dar, mas que fez como tentativa falha de consolo ao mais velho.

Vestiu o casaco novamente, e se despediu da felina que se espreguiçava perto da porta. Travou a mão na maçaneta por meio segundo, antes de rubor forças que não tinha e passar pela porta sem olhar para trás.

Assim que ouviu o estalo da porta voltando a se fechar, Xiao Zhan não se conteve por nem mais um segundo, se entregando ao chão gelado devido ao aquecedor quebrado.

Encolheu as pernas junto ao próprio corpo, desabando de um penhasco de soluços imparáveis e se afogando em rios salgados.
Recusando o carinho de sua amada gata, sua mente se remoía em culpa.

Se torturando, gritando para si mesmo que deveria ter feito mais, falado menos, apoiado mais, não recuado. Seus pais sempre lhe ensinaram a não temer a felicidade, e ele não só fez isso, como privou a si mesmo e a Yibo de algo que ambos queriam. 

Construíram palácios em uma terra de areia movediça, e ele próprio destruiu-os com uma mangueira gigante de covardia.

Desejava que tudo isso fosse um sonho, um pesadelo, e que na manhã seguinte acordaria com o perfume de sândalo e manteiga derretida  invadindo suas narinas, e Yibo estaria ali, de pé atrás do balcão da cozinha, comendo as torradas que são a única coisa que ele faz bem em uma cozinha.

Ele não acordou com o cheiro das torradas, e não havia mais ninguém no apartamento além dele e da felina. Mas mesmo assim, algo dentro de si insistía e criava a ilusão de que tudo aquilo não passava de uma noite mal-dormida e um pesadelo ruim.

Tanto seu corpo como seu cérebro já haviam se acostumado a presença do mais novo no apartamento. Com Yibo, aquele lugar não parecia tão vazio como realmente era. Parecia tão surreal a ideia de não vê-lo mais todos os dias, que sua mente criou a ilusão de que não era real.

Mas agora, olhando para cada canto, e sentindo o peso daquilo que não está vendo, sua ficha caiu por completo. Ele desperdiçou tudo de mais precioso que havia conquistado. E ele não teria de volta.

Doncel, a gatinha, se esfregou em suas pernas ronronando baixinho, como se o quisesse consolar. Ele a pegou no colo e susurros;

— a culpa é minha, não é?

E não se importou em voltar a chorar um pouco mais.

Eu Lua, Tu sol, nós constelação - YizhanWhere stories live. Discover now