Prólogo.

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O céu de Malibu está alaranjado; o sol se põe no horizonte. No final da linha, as ondas se quebram lentamente; não há surfistas nessa hora, tampouco movimentação. O cheiro da brisa salgada é presente; ele invade as narinas da sul-coreana e enche seus pulmões. A sua garganta fica com um gosto salso; ela pigarreia e entende que sempre esteve presente ali; Malibu é famosa por suas águas salinas e o que habita nelas; o que surfa nelas.

Os fios loiros escorrem pelo ar; o vento é leve, mas às vezes pode ser agressivo quando voa em direção dos olhos com alguns grãos chatos de areia, contudo, ainda assim, apenas sendo o frescor de Malibu. Um frescor que não sentia há anos. Taeyeon acabou de sair de um relacionamento de uma década que era devota fielmente e permanecia trancada dentro de casa quase que o tempo inteiro. Ela não sabia mais o que era o sopro do vento salgado, como seus fios ficavam embaraçados com a água do mar, ou mesmo como a areia da praia fazia cócegas fofas entre seus dedinhos. As sensações que já foram vivenciadas em algum dia, hoje são desconhecidas novamente. Tudo por causa de Evan, o seu ex-marido. É pouco mais do que sete e vinte da noite; os últimos raios solares do dia irradiam ao fundo do cenário. A mulher está pensando no que fazer, se deve continuar ou não na Califórnia. As ondas sussurram segredos em seus ouvidos, murmuram momentos de sua paixão duradoura, mesmo que não recíproca quase que o tempo todo. E ela sente uma vontade absurda de derreter na areia e se tornar um grão, viver ali e ser levada pelo vento para bem longe. Quem sabe sendo uma partícula de pó importunaria menos as pessoas em sua volta? Ou seria aquele grânulo que gruda na perna quando tentam se limpar, ou pior: o grão que cai nos olhos e incomoda por horas? Não queria ser dessa forma, não novamente. Porque sempre se sentiu assim, uma pessoa que incomoda.

O seu relacionamento acabou; era o fim dele, e apesar de ter sido há pouco mais de um mês, a sua ficha só estava caindo agora. Dez anos é muita coisa, não é? E ela queria muitas coisas de volta. Queria seus segredos, seus medos, suas inseguranças. E merda, como Evan conhecia tanto os seus demônios. Ele foi um monstro antes de partir. A coreana ainda consegue escutar no fundo de sua mente a voz lhe dizendo: ''Te darei três meses para você arrumar uma nova casa, caso contrário, a expulsarei daqui'', e ela sempre teve ciência que ali era dele. Evan comprou sozinho; ela não trabalhava e aquilo era culpa dele. Ele roubou até seu sonho de tentar ser uma artista.

Ou, talvez, a culpa toda tenha sido dela que aceitou ficar com ele. Ou a culpa era dela por não ser bonita o suficiente. Ou a culpa era dela por estar com trinta e cinco anos e parecer quarenta. Era sua culpa não ter filhos, sua culpa não ter um trabalho, sua culpa não ser engraçada como Evan e sua culpa não saber surfar. Será que se ela soubesse a fazer essas coisas, se pudesse ter criado uma família, ele teria a amado mais? A sensação só aumenta em seu peito há cada instante que passa. Taeyeon sabe que no final ela sempre foi a culpada de tudo. E sempre será. E talvez aquelas piadas que ouvia quando mais nova de ''sobrar para titia'', no fim, seja verdade. Com a idade que está, não vê mais ninguém se apaixonado por ela. Seus olhos têm algumas marcas de expressão ao lado, as suas sardas não são mais tão marcantes como antes, o seu corpo não é escultural, o seu cabelo agora não é tão hidratado como antes. E Taeyeon sabe que, no fim, a culpa não é de Evan, não é de Malibu. A culpa é dela.

Catarse em Malibu - TaenyWhere stories live. Discover now