˚ ༘✶ 𝗣rólogo

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— Aquilo foi ridículo

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— Aquilo foi ridículo.

  Olho para o homem em minha frente, com os cabelos completamente fora do lugar, a respiração ainda descompassada. Nós estávamos na cozinha comendo alguma torta de maçã de origem suspeita. É um dos momentos em que você não sabe se ri ou desmaia de cansaço.

— É sério — Ele para de comer por um instante — Ficamos lá, no mínimo, um terço a mais do que realmente precisaríamos se estivéssemos focados.

  Minha mente não me dava muito espaço para raciocinar.

— Por que não fica feliz pelo fato de estarmos vivos para passar mais alguns dias fazendo a mesma coisa que fazemos há 5 anos? — Respondo, em um tom debochado, tentando sentir algum gosto prazeroso naquela torta, mas em vão — Pare de ser tão sistemático. Ganhamos dinheiro e é isso que importa.

  Bang Chan apenas desiste em responder. Ele sabe que não funciono quando estou cansado, principalmente depois de lutar contra três fantasmas de classe 2 em uma casa abandonada. Massageio minhas têmporas, tentando evitar sentir a ânsia que começava a subir pelo meu esôfago, a qual eu sabia muito bem que não derivava da terrível torta de maçã.

  Eram oito horas da manhã quando recebemos um telefonema. O parlamento solicitava nossos serviços em uma antiga mansão fora da cidade. Relatos de gritos eram muito frequentes, e mesmo que nenhuma morte havia sido comunicada, nos dias de hoje é importante aniquilar qualquer vestígio sobrenatural de um lugar antes de vendê-lo, principalmente quando se tratava de uma venda advinda do próprio governo. Pode parecer ridículo, mas esses casos me animavam. Quanto mais poderoso era o cliente, mais mídia caía sobre nós e mais clientes atraíamos. 

  Tanto eu quanto Bang estávamos de excelente humor e fomos para a localização por volta das sete horas, levando o necessário e mais um pouco: Correntes de aço, sal grosso e espadas finas como agulhas. Aproveitamos para pegar uma redoma de vidro caso conseguíssemos amostras de qualquer coisa minimamente sobrenatural.

  E juro que se eu pudesse, levaria aquela mansão inteira. Um lugar que daria calafrios inteiros nos mais frágeis e atrairia os mais fortes. Enquanto a mim, eu só fazia o meu trabalho como um cientista preternatural¹

  Em um dia comum, digo com facilidade que demoraríamos em torno de duas horas para finalizar o trabalho — Extinguir três fantasmas classe 2. Londres é e sempre será muito úmida.  Mas, talvez o clima chuvoso tenha nos causado sono, e demoramos uma hora e meia a mais. Eu não me importo. Ganhei dinheiro. Não consigo explicar com palavras como o acréscimo de horas não planejada em uma tarefa bagunça a cabeça do meu colega — É particularmente preocupante. 

  Após alguns minutos, a adrenalina havia baixado e as tortas acabaram, com muito esforço. Nenhum de nós dizia uma palavra — Algumas coisas que vemos são bem traumatizantes. Demora para conseguirmos dissertar sem comentar algo que não seja entre psicopatia e manicômios. 

  Agora eram dez e meia da noite e a chuva ficava mais forte a cada minuto. Londres é e sempre será muito úmida. Mesmo com o barulho alto, eu conseguia escutar minha amostra coletada fazendo sons incompreensíveis. A fumaça esbranquiçada com tons de vermelho hora gritava, hora chorava, hora xingava em uma língua estranha.

  Mesmo que eu quisesse entender, tinha outras coisas para pensar.

— Temos algo para essa semana? — Questiono. Ele fica em silêncio por alguns segundos, para pensar em uma boa resposta.

— Senhor Goldman, no sábado — Respirou isso — Com aquele caso da sala de cinema.

— Ugh — Resmungo — Ele não era judeu? 

— É provável que envie um representante, sabe que ele tem dinheiro.

— Dinheiro da pobre da mulher dele — Levanto a sobrancelha direita. 

— Dinheiro legítimo. 

  Sorrio ladino.

— Eu sei.

  Era bom poder conviver com outra pessoa sem um silêncio constrangedor contaminando a sala. Ele respira fundo mais uma vez, segurando o crucifixo em seu pescoço e fechando os olhos. Sei que estava fazendo sua pré-oração. Mesmo lidando com fantasmas comuns e fracos, era bom estar vivo.

  E é bom ser grato. 

  Antes que ele pudesse falar algo, escutamos uma batida alta e rápida na porta. Mesmo com a água caindo e abafando o som, era possível escutar em claro e bom som. Chan era o porteiro oficial e mesmo receoso pelo horário, foi abrir a porta.

— Minho, corre aqui! — Gritou, claramente um sinal de algo errado.

  Ele abriu a porta quando cheguei e nos deparamos com um homem de estatura fraca, aparentando ser um pouco mais novo que nós. Ele chorava e tremia a mandíbula — Não soube diferenciar se era pelo frio pouco protegido por sua falta de roupas ou pelo desespero de estar sem um teto em um momento de tamanha escuridão.

— Por favor — Ele disse, fraco e baixo, soluçando pelo choro guardado no fundo da garganta — Vocês teriam abrigo pra essa noite? 

  Sabia que Bang era um homem muito bom e que eu não precisava nem me preocupar em responder a pergunta do pobre rapaz.

— Mas é óbvio, por favor, entre. Minho, pegue uma toalha e roupas quentes.

  Meu colega o ajudou a entrar, mas não precisou de muito para que eu ouvisse o estrondo no chão do seu corpo mole caindo, desmaiado e sem forças no nosso chão de madeira. Seria uma longa madrugada.





Glossário

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Glossário

1. Preternatural - Sinônimo de sobrenatural, aquilo fora do entendimento humano e do plano material.

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⏰ Last updated: Mar 29 ⏰

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ESPECTROFOBIA ; minsungWhere stories live. Discover now