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Chovia torrencialmente.

Os faróis que inundavam o trânsito de Douglas naquela noite eram como olhos de animal selvagem. Eles passavam velozmente pelas janelas do Chevy, assustadiços, pálidos como faces em um pesadelo. Mas Lia Bodansky não desacelerou quando entrou na Avenida Principal. Estava correndo.
Quando estacionou em frente à casa onde a irmã vivia com o marido e o filho, não desceu imediatamente do carro. Não seria bem-vinda. Ficou sentada, imóvel, segurando o volante com as duas mãos. Tentava controlar a respiração enquanto pingos de chuva explodiam contra o para-brisa. O motor estalava — tic-tic-tic —, esfriando, e os itens metálicos do painel reproduziam o brilho fosco da luz da rua.
Havia claridade por trás das cortinas de algumas das casas do bairro e Lia imaginou que horas seriam. Tarde, provavelmente duas ou três horas após a hora do jantar. Bastaria ficar ali por algum tempo, perto de sua única família. Alguns minutos de ar puro. Liberdade.
Arqueando-se sobre o volante, deixou que a testa descansasse entre as mãos. Estava transpirando, os cabelos louros grudavam em sua nuca e na lateral de seu rosto, que queimava, ardendo pelo estresse.
Esperou, respirando fundo, tentando imaginar as feições da irmã e do sobrinho. Rostos familiares, que amava, apesar de tudo.
Quando se sentiu pronta, recostou-se no banco de couro e soltou o volante do Chevy. Suas mãos estavam úmidas de suor. O coração pulsava na lateral do pescoço.
O celular que estava dentro do console, perdido em meio aos panfletos da última conferência Forense, começou a vibrar. Na tela, o nome de Yuri Perelman. Ele estava chamando, muito provavelmente apavorado, às margens de uma crise de nervos.

— Não precisa nem dizer. — Lia atendeu, vencida pela necessidade de ouvir uma voz amiga. — Eu já estou voltando.

Estática. Nenhuma resposta.

— Yuri, está aí? A ligação está péssima.

Uma pausa. O barulho se prolongou como o som de batatas fritando em óleo fervente.

— Boo... — Ela pôde distinguir o som do próprio nome, apenas um gemido choroso contra a estática. — Boo... Eu estava lá...Sozinho...Um barulho estranho...

Lia Bodansky retesou no banco do Chevy, apertando o celular contra a orelha.

— O que? Do que está falando?

— Tive que abrir...Conferir...Droga...

— Olhe, deixe de brincadeiras. — Lia calou. — Yuri?

Bodansky & A Mulher ColmeiaWhere stories live. Discover now