A felicidade exige pouco

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Meu despertador me acorda em sobressalto. Assim que o desligo, ainda sem acordar totalmente, verifico a hora mesmo sabendo que são seis da manhã.  Me estico, bocejo e olho para o lado. Miguel ainda está em sono profundo, o que realmente me choca pois o despertador sempre toca no volume máximo. Passo a mão por seus cachos e beijo sua testa.

– acorda, dorminhoco.

Ele resmunga, suspira e abre um dos olhos. Sorrio para ele e ele afunda a cara no travesseiro, resmungando em alguma língua alienígena que eu absolutamente nunca compreendo.

– eu também odeio acordar cedo, mas a floricultura me espera e você tem que cuidar da casa, nego.

Ele bufou, se virou e se sentou, bocejando. Enquanto ele terminava de acordar, eu peguei minha toalha e fui em direção ao banheiro.

– se você deixar essa toalha molhada em cima da cama de novo, considere-se um homem morto.

Eu ri e concordei, fechando a porta. Pendurei a toalha e entrei no chuveiro, já que sempre durmo sem roupas. No início, quando começamos a morar juntos, eu tinha vergonha de dormir nu, visto que não éramos casados, o que significava que não tínhamos tido nenhuma relação íntima. Ambos nossos pais eram da igreja, tanto que nos conhecemos desde bebês, nos cultos e missas. Éramos melhores amigos e dificilmente nos separávamos. Em nenhum momento de nossas vidas nós nos afastamos. E quando entramos para a fase dos namoros, nenhum dos dois conseguia se atrair por garotas. Até o dia em que fomos ao cinema e vimos dois homens se beijando no fundo em um filme, o que despertou nossa curiosidade, resultando no primeiro beijo para ambos. Passamos muito tempo debatendo sobre isso na velha casa da árvore na casa dele, nos perguntando porque nunca tínhamos visto isso e porque era estranhamente bom trocar um beijo na boca. Passamos a nos beijar às escondidas e pesquisar sobre na Internet, mesmo que na época não houvesse grande coisa a respeito disso. Quando estourou a "lacração", tivemos muito mais acesso às informações sobre o que era ser LGBT. Tanto que entendemos o possível preconceito dos nossos pais e tivemos medo. Já éramos universitários quando definimos que éramos namorados e prometemos nunca contar às nossas famílias. Eles nunca reagiam ao conteúdo LGBT que passava na tevê, então não tínhamos ideia de sua opinião sobre. Apesar disso, quando pensamos em comprar uma casa, demos a desculpa de que seríamos colegas de apartamento e que dividir o gasto na casa seria mais cômodo, e eles aceitaram. Foi nessa época que eu comecei a ter vergonha de dormir pelado, pois dividíamos o quarto, e o mais próximo do nu que já tínhamos visto um do outro era usando regatas e bermudas. E também foi nessa época que começamos a ser cobrados para termos esposas. Conseguimos desviar o assunto por tempo o suficiente para sermos totalmente independentes financeiramente, eu tendo conseguido administrar minha floricultura e Miguel sendo secretário via home work. Discutimos por várias e várias vezes se devíamos contar, eu defendendo que devíamos e ele defendendo que não. Tivemos nossa primeira briga por causa desse assunto, e quando ele finalmente gritou me perguntando o porquê de eu querer contar, eu deixei escapar que queria me casar com ele na igreja, como era tradicional. Miguel ficou emotivo demais para dizer qualquer coisa e se trancou no quarto, me obrigado a ficar no de hóspedes. Ele se fez de desentendido sobre essa briga e eu temi que ele não me amasse tanto quanto eu o amava. Com medo de perdê-lo, eu me calei e não toquei mais no assunto. Com isso, eu acabei disparando os alertas de Miguel e ele entrou em pânico. No desespero de tentar remediar a situação, ele fez uma investida sexual. Ele acabou me assustando e eu decidi pôr as cartas na mesa de uma vez. Expliquei, a duras penas, o meu lado para ele em uma conversa séria. Ele admitiu seu lado também, um pouco relutante. Nos entendemos e decidimos por ficarmos noivos e casar em outra igreja. Só que, de alguma forma, nossos pais descobriram sobre nós. Eles nos chamaram para uma conversa séria e nós internamente surtamos muito. Eles disseram que não entendiam bem, que não esperavam por isso, mas que estavam bem pois sabiam que ambos éramos bons moços e que se pretendíamos nos casar, tínhamos suas bênçãos. O alívio em ouvir isso foi tão grande que eu até chorei. Conseguimos nos casar no ano seguinte, com direito até a jogada do buquê. E desde então, estivemos na nossa melhor vida.

Contos GaysWhere stories live. Discover now