004. BIRTHMARK

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Claro que percebeu

Ele não entende, mas percebeu.

Eu mantenho o rosto neutro. Se alguém pergunta, eu estava olhando pro chão. Pra flecha. Pro vento. Para qualquer coisa que não fosse a verdade.

— Maeve! — uma voz familiar chamou, e eu quase agradeci. Quase.

Spider veio correndo, sujo, sorridente, com aquele jeito humano deslocado mas tão... vivo. Ele me dava vontade de respirar e ao mesmo tempo me lembrava de quem eu era antes de um plano.

— Você correu de novo do treino com o príncipe azul aí? — ele brincou, batendo no meu braço.

— Eu não corro.

— Só quando eu tô indo atrás de você — ele disse rindo.

— Eu não corro de você, Spider.!

Eu não consegui evitar um meio sorriso.

Pequeno. Controlado.

Mas foi um sorriso.

Neteyam cruzou os braços, observando nós dois. Preocupação? Curiosidade? Algo queimava ali.

Spider olhou pra mim e depois pra Kiri.

— Ela tava perguntando se você vai se juntar ao grupo dela amanhã. Sabe como ela é, quer incluir todo mundo.

Meu estômago vira.

Eu mantenho meu rosto neutro. Treinamento perfeito.
Papai estaria orgulhoso.

— Vou ver — respondo com total controle. — Depende da minha programação de treino.

Neteyam cruza os braços. Spider franze a testa, inocente.

— Você sempre tá ocupada quando é com ela.

Eu quase endureço demais, preciso mascarar isso rápido.

— Eu tenho prioridades, Spider — falo com uma leve sobrancelha levantada. — Não dá pra ser sociável o tempo todo como você.

Ele ri, despreocupado, achando que é uma piada.
Bendita ingenuidade.

— Certo, soldada durona — ele diz, levantando as mãos. — Só não vira uma pedra, ok?

Eu empurro levemente o ombro dele, como se estivesse brincando. Eu consigo brincar. Eu aprendi.
Eu fui treinada para parecer Na'vi antes de ser humana.

Mas por dentro...

Kiri levantou o rosto por um segundo, e nossos olhos quase se encontram.

Eu viro antes que aconteça. Eu não posso quebrar aqui.

Não agora.

Não na frente deles.

Respira.

Firme.

Eu sorrio pequeno e digo, como se nada no mundo estivesse errado:

— Vamos treinar arco depois do almoço. Quem chegar por último carrega munição.

Neteyam resmunga.

Spider ri.

E eu continuo andando, porque parado é quando dói. Eu sobrevivo. Um olhar desviado de cada vez. Um segredo empurrado garganta abaixo de cada vez.

E ninguém nunca pode saber.

Nem sobre ela.

Nem sobre mim.

Nem sobre mim

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PUPPET GAME ' NETEYAM SULLYOnde histórias criam vida. Descubra agora