Isso era treino. Mas pra mim? Era sobrevivência. Era quem eu sou.
Eu nunca sou a que cede.
Nunca.
Então, o desafio terminou não porque eu queria, mas porque, se eu continuasse, eu acabava mordendo ele.
E não no sentido romântico, definitivamente.
Troquei a lança de mão, respirando fundo, as pernas ardendo de cansaço. Neteyam girou a dele com aquele maldito ar tranquilo de "sou perfeito, olha como sou perfeito, ninguém me supera".
Eu já estava irritada só de ver a postura dele. Reta, confiança transbordando.
Eu odiava gente confiante demais. Me lembrava do Valentim nos piores dias.
— Você tá começando a cansar, — ele disse, limpando o suor da testa. — Seus movimentos estão ficando previsíveis.
Revirei os olhos.
— Ou talvez você esteja começando a ter ilusões de grandeza.
Ele ergueu uma sobrancelha, como se achasse graça.
— Eu sou treinado desde que aprendi a andar. Isso não é ilusão, é prática.
— E eu lutei desde que aprendi a respirar — rebati, seca. — Então poupa o discurso de príncipe guerreiro.
O sorriso dele quase desapareceu, quase.
— Você tem talento. Mas arrogância sem controle te mata mais rápido do que qualquer inimigo.
— Eu prefiro morrer arrogante do que viver medíocre.
Ele riu.
— Claro. Porque nada em você pode ser médio, né?
Eu avancei meio passo sem pensar.
Foi automático. Corpo antes da mente.
Ele percebeu. A expressão dele mudou, só um pouco, quando seus olhos bateram nos meus. Uma fagulha de alerta. Eu estava prestes a perder a linha.
Eu não podia.
Não aqui.
Não agora.
Respirei fundo, joguei a lança no chão e cortei o momento antes que eu acabasse realmente atacando ele.
— Treino acabou — soltei, seca.
Ele piscou, surpreso por eu ser a primeira a parar.
— Você tá fugindo? — provocou.
— Tô poupando você de ficar sem os dentes — respondi, pegando minha garrafa de água.
Ele soltou uma risada curta, balançando a cabeça.
— Você é impossível.
— Obrigada, eu me esforço.
Nós começamos a caminhar de volta. Eu mantive um passo firme, postura neutra. Nada podia vazar, nem irritação, nem fadiga, nem... fragilidade.
No caminho, o clã já se movimentava. Crianças correndo, tecelãs conversando, guerreiros voltando de patrulha. Caos natural, vida pulsando.
E ali, no meio da vila...
Kiri.
Ela estava sentada tecendo alguma coisa com umas plantas brilhantes, concentrada, linda de um jeito que doía. O tipo de beleza que não era feita, era nascida. Natural.
Eu senti o estômago torcer. Tive que desviar o olhar, como se o sol tivesse pegado meu rosto de repente.
Neteyam percebeu.
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PUPPET GAME ' NETEYAM SULLY
FanfictionJOGO DE MARIONETES | O egoísmo dos homens revela suas sombras mais obscuras. Valentim nunca enxergou Maeve como uma criança. Desde o momento em que a sequestrou ainda bebê, ela foi apenas um experimento. Uma arma em potencial. Criada entre cientista...
004. BIRTHMARK
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