CAPITULO ÚNICO

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          Era o primeiro dia das comemorações juninas na fazenda. Cândida despertara cedo, pouco depois do sol. Pendeu na cama por longos minutos até Almira e Sebastiana invadirem o quarto em grande euforia. As irmãs mais novas da moça riam, cochichando, enquanto dividiam o espelho acima da cômoda de madeira, ao lado da cama, e penteavam os cachos castanhos que herdaram da mãe, dona Camélia – que Deus a tivesse.

            — Que diabé isso vocês duas? – Cândida sentara na cama, os olhos insistindo em fecharem – Óia a hora, vão arrumar o que fazer.

            — Vixe que hoje acordasse cá daquele jeito, Candinha – dizia Almira ainda admirando seu próprio reflexo – Apoi fique sabendo que eu e Sebastiana já arrumou o que fazê, se eu fosse tu levantava os quarto desse colchão de paia e ia pra cozinha ajudá tia Maria.

            — Tô veno é as duas se esperiquitando aí, ajuda num vejo nenhuma – Cândida levantou – Bora, desaparece daqui que iss’ né hora não – empurrou as irmãs, em protesto, para o lado de fora.

            — Tá assim porque num visse Benício ainda – brincou Sebastiana.

          As mais novas caíram em gargalhada e correram pelo corredor em direção a sala da casa. Cândida não riu, era séria demais sempre, mas se pegou em surpresa por alguns segundos. Benício! O rapaz chegaria da cidade naquele dia, tinha esquecido completamente. Como poderia esquecer a chegada do próprio noivo? Tratou-se de se trocar rapidamente, o cabelo antes desgrenhado fora bem penteado e preso em um coque atrás da cabeça. O vestido era o mais bonito que tinha – azul, mangas longas e rendadas e uma saia rodada até o joelho. Os pés descalços foram adornados por sapatilhas pretas e meias brancas.

          Pronta, deixou o quarto, estava nervosa. Queria encontrar Benício, mas ao mesmo tempo preferia não vê-lo ou gaguejaria mais do que falaria. Por sorte ele fora mostrar a fazenda a alguém que o acompanhava, um tal de Camilo, amigo que fez na cidade. Era ele o motivo do barulho entre as irmãs, foi isso que disse tia Maria quando Cândida decidiu ajudar na cozinha.

          Passaram a manhã terminando o banquete da noite, teriam mesas fartas como seu pai, Damião, gostava. Os homens cuidaram da organização do lado de fora, carregando cadeiras, pendurando as bandeirolas, montando a fogueira e espalhando as lamparinas. O São João na fazenda era sinônimo de cinco noites de festa, do dia 20 à 25 de junho. Tinha forró, brincadeiras, o cheiro do milho tomava conta do ar e eram os únicos dias em que os trabalhadores da fazenda se viam livres do cultivo, dos animais ou de qualquer outro problema que aparecesse.

          Cândida admirava o São João porque era o feriado favorito da sua finada mãe, a mulher era religiosa e muito devota do santo, não havia um ano sequer que não fizessem a festa. Depois que ela morreu, quando as meninas mal começavam a chegar a adolescência, Cândida insistiu para que o pai continuasse a festejar em nome da mãe e foi o que ele fez. O feriado virou uma tradição e até mesmo pessoas das fazendas vizinhas e parentes da cidade vinham para prestigiar.

          Com tudo pronto e sem sinal de Benício, Cândida pensou em ir até o rio que banhava as terras da fazenda. Era um pouco longe da casa, mas ela não se importava pelo caminho por dentro do mato e nem em ir sozinha, fazia isso constantemente desde que era menina, conhecia cada pedra que encontrava. Deu um beijo na tia, tirou o avental sujo de trigo e a entregou, endireitando o vestido e limpando qualquer sujeira em sua roupa – não queria correr o risco de encontrar o noivo tão bagunçada.

          As irmãs estavam no lado de fora quando saiu, decoravam a varanda da casa com chita enquanto alguns rapazes amarravam as palhas de coqueiro nas colunas do corrimão. Não pôde deixar de perceber como olhavam para os dois garotos com a palha, balançou a cabeça negativamente e ergueu a mão ameaçando bater nelas pelo comportamento. Com toda certeza dona Camélia jamais se orgulharia da maneira como Sebastiana e Almira se portavam, teriam sido moças melhores se fossem para o convento de Santa Rita junto com a irmã mais velha. Ah, como conseguiam ser decepcionantes!

Amor Sob a Luz da Fogueira [CONTO]Where stories live. Discover now