vīgintī duo

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Imagine contar a ele. Imagine suas reações, seu pronunciamento. Imagine ele tomando algum partido.

Apenas pensar nas possibilidades já consegue partir o coração de Harry.

Todas as hipóteses são terríveis. No melhor dos casos, Louis irá achar que é uma mentira grave e se afastará dele por isso. 

Harry não nega, ficaria até meio aliviado se isso acontecesse. Ante a sua descrença, o fardo de lançar Louis a uma situação complicada seria inexistente. 

Que difícil seria lidar com as outras possibilidades. Como o consolar, caso fique decepcionado ou enfurecido ou enojado ou confuso? Nem a mais vaga ideia aparece para acalentar Harry.

Ele não pode fazer isso com o amigo. Louis é a última pessoa a quem essa sujeira desse ser exposta. 

Imagine, Louis com a confiança despedaçada, receoso em relação ao Diretor Espiritual, enojado pelo que aconteceu. Isso já seria bem ruim. Mas agora abalar sua virtuosidade, corromper sua candura dessa maneira é demais. Seria cruel. Imperdoável até. 

Harry se recusa. 

Sua garganta se fecha só em cogitar isso.

Por isso, outra vez, ele foge da questão agindo como se ela fosse tola e infundada, esforçando-se para se mostrar ofendido pelo tom intransigente do seminarista.

– Gosto de estar com você mas, juro por Deus, essa sua insistência é ridícula e irritante. Por que raios eu mentiria?

– É exatamente isso que eu quero saber!

– Sinto muito, mas esse é um problema pra você responder consigo mesmo - Harry dá um suspiro exagerado e afetado – Preciso ir. 

Mas o assunto não é encerrado ali. Na terça-feira seguinte Louis repete a mesma pergunta, teimoso. Ecce iterum Crispinus, como diria uma sátira latina, está sempre a repisar a mesma cantilena, idem per idem. 

Harry não aguenta e inicia uma discussão áspera, pontuada por reviradas de olhos, grunhidos e desdém de sua parte: 

– Sabe, você deveria ler uns livros mais interessantes, quem sabe assim você não ocuparia melhor a mente. Um romance policial, talvez, já que você adora bancar uma de detetive tentando desvendar mistérios que nem existem… Ou melhor, o que acha de viver um drama de verdade? Já que continua indo à casa dos Fournier, poderia corresponder aos flertes da mãe da Emily, só por diversão.

Com isso, um mal-estar vergonhoso, insuportável é instalado entre eles, desencadeando um riso fraco e um silêncio que se prolonga por um bom tempo. Pertubado e inquieto, Harry vai embora usando a desculpa de precisar ver Niall.

Para ser franco, com o ânimo negativo do jeito que está, Harry hesita em ir ao flat do amigo. Mas qualquer lugar em que o amigo habitasse tornava-se um oásis para si. Desse modo, na esperança de que se sinta melhor na companhia dele, Harry vai.

Niall, no momento, estudava numa mesinha de dois lugares próximo a janela em arco na área de estar, atulhada de papel, para onde retorna após abrir a porta. Harry encaminha-se para o sofá.

 – O que você está fazendo aqui agora? - quer saber Niall, levantando um papel com imagens que, da distância onde Harry está, impossível se identificar o que é – Não deveria estar com seu amigo?

– Não é exatamente o que estou fazendo aqui, agora?!

Niall lhe lança um olhar enfadado.

– Tô falando do outro.

– Eu estava, mas fiquei com vontade de vir pra cá.

Dessa vez, Niall o encara de cenho franzido.

– De repente?

immaculate sin of the lovers • L.S.Where stories live. Discover now