Capítulo 2

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- Bom dia Evinha como está o Adão?
Todos os dias eu escuto a mesma piada, e todos os dias eu faço a mesma coisa, reviro os olhos em sinal de reprovação, mas não adianta, as vezes prefiro me aparentar pelo meu segundo nome Maria, embora eu goste muito do nome de Eva, as vezes pra evitar chatiação, eu falo Maria e tá tudo certo.
- Mais um lote de cartinhas de amor pra você ler - o chefe dos agentes me entregou um pacote com dezenas de cartas
- De novo? Não tô dando conta de ver isso tudo não Ricardo tem que pôr alguém pra me ajudar
- Quem? Você não quer que eu tire um dos caras lá de baixo pra por aqui né?
- Tô falando que Jajá chega os jumbos e eu vou ter que parar de ver as cartas pra ir lá conferir
- quando o Jumbo chegar eu mando o Léo vir aqui te ajudar
- O Leo?
- Sim o Léo? Qual o problema?
- Nenhum..
- Ah Eva, não reclama não, pra você é"mó mamão" ficar aqui só vendo carta, quero ver se você tivesse que descer pro pátio, apartar briga de faca de ladrão, separar motim de facção.
- As vezes eu até preferia
- Mas você sabe que não pode, te colocar lá embaixo no meio de um monte de ladrão doido por mulher é suicídio, não sobra nada de você e nem da gente
- Eu sei
- Bom tô descendo qualquer coisa me chama no rádio, Jajá eu mando o Léo subir
Pior do que ler aquelas cartas era aturar o mala sem alça do Léo. Toda a vez que eu tenho que ter algum tipo de contato com ele eu me arrependo das noites que passei em claro estudando pra passar nesse concurso. Puta cara chato, desses que se gabam em tudo. Ele é do tipo que você fala a sua idade e ele diz nossa 24 ? Na sua idade eu já tinha 30". Casado, pai de dois filhos e mesmo assim não perde a oportunidade de dar em cima de todas as mulheres que ele vê pela frente, desde a faxineira até às que ficam lá embaixo na revista.
- E aí Evinha preparada pra mais um dia de cartas de amor?
- Hum..
- Que foi? Tá brava?
- Não, só tô cansada
- Ah pelo amor de Deus, cansada de que? Sua vida é um mamão, não tem filho, não tem responsabilidade de nada, fica aqui em cima só olhando carta e abrindo caixa. Se você fosse da revista eu poderia até me compadecer do seu cansaço, se bem que a revista já foi mais pesada, hoje com esse sistema de raio x tá tranquilo, você precisa de ver como era antes quando a mulherada tinha que se abaixar no espelho pra ver se não tinha droga enfiada na..
- Okay Leo, já entendi, meu cansaço até passou, vou pegar um café e já volto
- trás um pra mim
Fingi que não ouvi
O que o ele tinha acabado de falar não deixava de ser mentira, mesmo achando um porre ter que conferir o Jumbo e as cartas eu agradeço muito de não ter que ficar na parte da revista. Quando entrei fiz treinamento lá, fiquei uma semana acomodando o trabalho das meninas. Dia de visita o presídio é um inferno, uma fila que dobra o quarteirão, 95% são mulheres com crianças no colo, faça chuva, sol, algumas acampam na porta do presídio, quando entram passam por um sistema de raio x, não só elas como as comidas que elas levam. Tudo lá embaixo é horrível. Aquele cheiro de marmita azeda as 7 da manhã embrulha o estômago de qualquer pessoa. Ainda bem que o direitor quando me viu disse que eu não servia pra revista, segundo ele, pra esse tipo de serviço precisa ter pulso firme, passar firmeza e segurança e muitas vezes até intimidar, porque mulher de bandido e tão folgada quanto o próprio, as vezes até mais. E segundo ele eu não aguentaria a pressão.
Peguei o café, tomei devagar, olhei no relógio, ainda faltava muito tempo pra eu ir embora, essa semana foi puxada, o povo recebeu o salário e caprichou no Jumbo. Eu tava exausta, graças a Deus no dia seguinte era a minha folga.

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