CAPÍTULO 07

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     Durante o resto do dia e o seguinte, os dois me bombardearam com mensagem a cada cinco minutos, sobre as coisas mais aleatórias e variadas possíveis. Os dois manés pareciam não ter mais nada para fazer do que ficar me fazendo perguntas, que eu precisava responder duas vezes, já que eles faziam as mesmas perguntas, só que em momentos diferentes. Eu quase sugeri que criassem um grupo, mas resolvi ficar calado e respondi tudo o que queriam fazer, já que era até um passatempo divertido para não me fazer ficar apenas dormindo todo o tempo livre.

    Não pude voltar para a escola porque a diretora provavelmente já deveria ter passado a informação de que eu não iria para os professores, então caso fosse, poderia ser pego na mentira.

    Depois daquele dia na praça, realmente fiquei melhor e sequer precisei dos remédios, mas algumas horas atrás já comecei a sentir náuseas de novo, além de um pequeno latejar constante no fundo da minha cabeça, como se o elo fosse um elástico esticado ao máximo que estivesse protestando, implorando para voltar ao normal e que os dois rapazes voltassem a se aproximar de mim.

    Como nos outros dias, passo boa parte do tempo jogado no sofá até a hora de ir me jogar na cama. Já deve passar das 10:00 da noite, então desligo a TV e apago a luz da cozinha, antes de caminhar até o meu quarto — Deixando a lâmpada da sala acesa, pois sou um pouco medroso —. Pela janela, consigo ver que uma garoa fina está caindo, deixando o clima mais gostosinho ainda para dormir.

   O meu quarto é pequeno e organizado. As paredes são pintadas de um tom amarelado parecido com a de páginas de livros. Em um dos cantos do cômodo há um guarda-roupas antigo e bem grande — que já estava aqui quando me mudei —. Há um carpete felpudo cobrindo boa parte do chão, ele é azul turquesa, o que faz um contraste com todo o resto do quarto, que tem cores claras. A minha cama fica no canto do quarto, do lado oposto à porta do banheiro, ela é bastante grande e está coberta com um edredom cinza claro. Também há algumas prateleiras na parede ao lado da cama, que estão repletas de livros e porta-retratos.

     Me livro do pijama que estou vestindo e fico apenas numa Boxer branca. Meu olhar encontra diretamente o meu reflexo no espelho da parede, o que me faz engolir em seco. Eu não sou feio, mas também não sou bonito de morrer. Meu cabelo claro é uma confusão emaranhada, como se nem ele soubesse se é cacheado ou ondulado; minha pele tem tantas pintas que me deixa um pouco envergonhado, elas se concentram principalmente nos meus ombros, peito e costas; Eu tenho uma estatura pequena e meio franzina como a maioria dos ômegas, mas não tenho curvas sexys ou uma bunda grandona — Não que isso me incomode.
     
     Paro de olhar o reflexo e balanço levemente a cabeça para os lados ao perceber que minha aparência definitivamente não importa tanto assim. Eu sou feliz como sou, e ficar me preocupando com isso não adianta de nada.

     Apago a lâmpada do quarto e acendo o abajur que há em cima da minha cômoda, deixando o lugar com uma luz amarelada fraquinha e aconchegante, então caminho até a minha cama, pulando em cima dela e me enfiando debaixo do cobertor instantaneamente, enrolando-me nele e soltando um suspiro, pois ele é quentinho pra caramba, o que somado ao frio do lado de fora e o barulho da chuva, quase me faz ronronar como um gato manhoso.

     Nessas condições eu não precisaria de mais do que uns cinco minutos para cair no sono, mas um baque surdo contra a janela faz eu sentar na cama instantaneamente, meio sobressaltado. Olho para a janela do quarto, mas então percebo que não foi dali que veio o barulho, pois o som parecia vir de mais longe. Eu conheço muito bem o som que as janelas de vidro fazem porque as vezes colocava alpiste no batente para uns passarinhos do lado de fora, o que fazia uns pombos intrometidos aparecerem e ficarem bicando a janela.

    Levanto da cama em passos silenciosos, sentindo um arrepio de medo cruzar o meu corpo. Eu enrolo o cobertor no meu corpo como se fosse uma túnica — pois não quero sair no frio só de cueca —, então caminho até a porta do quarto, chegando na sala em poucos segundos. Meu olhar recai sobre a grande janela de vidro da esquerda, embora não consiga ver nada da varanda do outro lado, pois a noite está bastante escura e os pingos de chuva dificultam um pouco a minha visão.

     Em passos meio incertos, caminho até lá e aperto no interruptor da parede que liga a lâmpada da varanda, iluminando-a no mesmo instante.

     — A-AAAH!! — Solto um grito esquisito e solto um pulo para trás assim que meus olhos encontram diretamente aqueles dois caras enormes que estão do outro lado da janela, em pé lado a lado no topo da escada de incêndio, completamente ensopados. Tyler está com um buquê de tulipas encharcadas, enquanto Kai está segurando uma caixinha pequena de uns trinta centímetros, mais ou menos. As suas roupas estão completamente grudadas nos seus corpos, e mesmo que a varanda tenha uma pequena cobertura, o vento faz os dois continuarem sendo atingidos pelos pingos d'água.

     — O-o que vocês estão fazendo aqui?! Na chuva!! — Exclamo, apertando o cobertor ao redor do meu corpo com mais força ainda, como se conseguisse sentir o frio que eles estão sentindo através do laço.

    — Não estava chovendo quando saímos de casa, Baby. — Kaic diz, me fazendo soltar um rosnado furioso e dar um passo para a frente, abrindo a tranca da janela e puxando-a para cima até o limite máximo que ela permite antes de travar. Os dois se aproximam imediatamente e tiram os sapatos e os casacos, deixando-os jogados no chão da varanda, antes de passarem de maneira bem apertada pela janela. Ver os dois alfas enormes entrando no meu apartamento essa hora da noite me faz engolir em seco, principalmente porque agora estão sem camisa e com as calças completamente grudadas nos seus corpos.

    — Como souberam onde eu moro?

    — A gente meio que seguiu você no outro dia. — Tyler disse, dando de ombros e abrindo um sorriso angelical.

    — S-seus... Loucos! — Exclamo, vendo-o rir um pouquinho e piscar inocentemente, tirando algumas mechas do cabelo preto e ensopado do rosto.

    — Desculpa Baby. A gente trouxe isso que pra você. — Ele estendeu as flores para mim, e mesmo que ainda esteja um pouco zangado com esses manés, meu coração dá um salto ao encarar as flores lindas e delicadas. Eu enfio as pontas do cobertor quentinho debaixo das axilas para deixar as mãos livres, então pego o buquê.

     — O-obrigado. — Gaguejo, sentindo um sentimento de felicidade misturado com timidez tomar conta de mim. Tyler abre um pequeno sorriso, provavelmente sabendo o que estou sentindo através da ligação.

    — trouxe isso aqui pra você, Otto. Acho que a caixa molhou um pouco, mas a parte de dentro dela é plastificada. — Kai estende para mim a caixa de bombons, que é amarrada com um lacinho rosa e a parte de cima da tampa é feita de acrílico, deixando completamente à mostra os doces enormes e bonitos de dentro.

     — Obrigado. — Repito, corando um pouquinho ao sentir os olhos dos dois em mim. Kai abre a boca para dizer alguma coisa, mas então uma trovoada forte e absurdamente alta corta sua voz, ao mesmo tempo que a garoa fina que está caindo do lado de fora se intensifica mais ainda.



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DOIS ALFAS E EU (COMPLETO)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora