Surto de Amor

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VALENTINA

Mil e um pensamentos me atingem no instante em que encaro a garota dos fios claros pelo espelho, em seu tão sonhado vestido de noiva.

Não foi assim que imaginei que me casaria.

Não foi com Daniel Pereira que queria trocar votos.

A vida, no entanto, nem sempre nos direciona para o caminho que desejamos. Conheci Daniel quando meu coração foi partido. No momento em que precisei deixar meu ex pra trás e seguir um caminho totalmente contrário ao dele.

Aquela Valentina era covarde demais pra assumir aquele amor ao lado daquele homem incrível e sabia que ele não terminaria com ela. Então ela partiu seu coração.

E depois de meses usando Daniel, o pedido veio e eu aceitei.

Estava sob pressão. A família de nós dois queria muito que isso acontecesse. Nossos pais eram amigos de longa data.

Entretanto, eu sabia que estava prestes a me entregar para sempre a um homem que não amava.

Por esse motivo enviei um convite para ele.

- Querida, está pronta? - Roberta, minha sogra pergunta ao enfiar a cabeça pela fresta da porta - A limousine já está a nossa espera.

Dou uma última olhada em mim, naquele vestido, que prestando bastante atenção agora, não era exatamente o que eu queria.

Roberta e mamãe deram tanto pitaco em tudo, que acabei cedendo apenas pra não ficar ainda mais exausta com os preparativos.

O bolo não é do sabor que eu queria, a banda não é a que achei incrível e as flores não eram as que escolhi.

Tudo estava errado. E eu simplesmente não tinha coragem de sair anunciando que não queria mais.

Apesar de tudo, Daniel era um cara legal.

Respirei fundo e me virei. Minha sogra entrou e me ajudou com a grinalda enquanto eu pegava o buquê e seguimos para a limousine.

[...]

HUGO

- Vai mesmo fazer isso? - Henrique questiona, do banco do carona.

Ele é primo de Daniel e decidiu pegar carona comigo quando lhe contei do convite e de usar minha chance pra tirar Valentina daquele relacionamento.

Sabia que isso era loucura. Mas estava disposto a tentar por que ainda acredito que ela me ame ainda. Tina é do tipo que fica se estiver sendo confortável.

Ela odeia confusão e engole muita merda só pra manter a paz e eu desconfio que esse casamento seja uma dessas coisas, já que ela e Daniel não eram vistos com muita frequência.

E este por sua vez não disfarçava muito que tinha amantes por aí. Um filho da puta que trai uma mulher incrível como Valentina merece tudo, menos se casar com ela.

- Bem, você mesmo disse que eu tinha que tentar, não é? - respondo sua pergunta e o vejo rapidamente coçar a barba enquanto pondera.

- É, tá. Ainda acho que ela ama você, mas não é como se ela deixasse isso claro. Pode ser um engano também. - contrapõe e eu bufo.

- Obrigado pelo otimismo, cara. - resmungo.

Continuamos com nosso debate até chegarmos ao salão onde a cerimônia iria acontecer e eu me perguntei se esperaria aquele momento clássico dos filmes que Tina ama assistir na sessão da tarde para interromper a cerimônia.

Saímos do carro e depois de ter entregue a chave para o manobrista, ajeitei a gravata que me incomoda e segui Henrique para dentro do salão.

Meu amigo cumprimentou metade dos convidados por quem passamos até encontrarmos um lugar.

Minhas mãos estavam suando.

- Hugo, relaxa, porra. Se continuar assim não vai conseguir nem falar um Oi. - meu amigo diz.

Sei que ele está achando graça da cena. Também acharia se estivesse em seu lugar.

Lembrar que já tive Valentina no passado e que deixei ela partir me faz ter ódio do panaca que eu era.

Ainda que eu realmente não pudesse mudar a decisão dela, prefiro acreditar que podia sim e segui com essa auto depreciação pelos anos seguintes e agora estou aqui, prestes a acabar com um casamento.

Depois de aturar Daniel a exibindo como troféu, era minha vez de tentar trazer o amor da minha vida de volta.

[...]

VALENTINA

Roberta abriu a porta pra mim e saímos. Encontramos as damas e os padrinhos começaram a entrar.

Todo aquele processo era lento e não estava me deixando nada emotiva.

Os casamentos dos filmes românticos estão errados. Ou o fato de que estou me casando com um homem e pensando no outro seja a razão para minha falta de sentimentos com essa celebração.

De qualquer forma nada disso importa agora.

Me posiciono na entrada e meu pai me encontra, com um sorriso terno. Ele me abraça e a música começa. Quando as damas começam a andar, respiro fundo e começo a minha trajetória até Daniel, que está lindo em seu terno branco.

Meu coração erra uma batida quando vejo Hugo entre os convidados, ao lado de Henrique e quase tenho um treco. Preciso ser rápida pra voltar a realidade quando o flash da câmera do fotógrafo me pega desprevenida.

Continuo andando, mas sempre dando um jeito de virar a cabeça. E olhar pra ele.

O pastor começa a cerimônia e eu passo todo o tempo sem prestar atenção em nenhuma palavra dita.

A todo tempo, dou um jeito de olhar em direção a Hugo e fazer com que ele entenda minha súplica.

- Se alguém é contra essa união, fale agora ou cala-se para sempre. - o pastor diz.

Um silêncio sepulcral me diz que já era. Ele não veio e eu terei que ficar com Daniel.

- EU PROTESTO! - escuto e me viro, sem pensar duas vezes, encontrando o motivo dos meus pensamentos no tapete vermelho, em seu terno cinza, olhando pra mim.

Sem pensar duas vezes, solto a mão de Daniel e sigo o caminho em direção aos braços de Hugo, que os abre para mim.

Eu o abraço, e me arrependo imediatamente das decisões que tomei. Nunca deveria ter deixado esse homem.

- Eu te amo demais, Tina. Não posso deixar que se case com ele. - declara em meu ouvido enquanto escutamos os murmúrios dos convidados.

Não espero que ninguém diga nada, olho nos olhos de Hugo, com meu melhor sorriso.

- Obrigada por ter vindo me salvar. Eu nunca deveria ter saído de perto de você. - declaro e beijo meu ex namorado, ignorando meu noivo, sua família e as dezenas de pessoas.

Ouvimos as vozes, mas é como se só existisse nós dois.

Parecia que o mundo estava caindo enquanto a gente se beijava. Hugo segurou minha nuca e quando sua língua pediu passagem, eu cedi.

Me entreguei a ele, nesse surto de amor que fez o que deveria ser uma festa de celebração a união de duas pessoas parar.

Hugo me pegou em seus braços quando precisou encerrar o beijo e sorriu.

Roberta e Daniel xingavam, inconformados, mas deixei que Hugo me conduzisse para fora do evento, ignorando todos.

Mesmo com aquele vestido atrapalhando, ele me levou até seu carro, onde nos beijamos de novo, e dessa vez, eu senti.

Aquela emoção que Daniel não despertava em mim.

- Isso foi... - começo.

- Insano. - responde e eu sorrio.

- Maravilhoso. Melhor do que os dos filhos - rimos - Por favor, Sr Vezzani, me leve pra longe dessa festa. - peço, ganhando outro beijo.

- Com prazer, Sr Trajano. Futura Sr Vezzani. - declara com orgulho e eu concordo.

Estando ao lado dele, nada mais importava.


Contos | Hugo VezzaniOnde as histórias ganham vida. Descobre agora