II

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Três semanas antes do dia marcado para o casamento, Kassátski encontrou-se com a noiva em sua casa de campo em Tsárskoie Sieló. Era um dia quente de maio. Noivo e noiva caminharam pelo jardim e sentaram-se em um banquinho na sombra da aleia de tílias. Mary estava especialmente bem no seu traje de musselina branca. Parecia a personificação da inocência e do amor. Sentada, ora pendia a cabeça para baixo, ora lançava olhares ao belo gigante que lhe falava com ternura e cuidado, temendo ofender, macular em cada gesto, em cada palavra, a pureza angelical da noiva. Kassátski pertencia àquele gênero de pessoas dos anos 1840 que hoje não se encontram mais; pessoas que, de si para si, não viam imundície na relação sexual, mas que exigiam da mulher uma pureza celestial idealizada e reconheciam essa mesma pureza celestial em todas as moças do círculo com que se relacionavam. Havia muita falsidade nisso e muito perigo naquele modo de agir licencioso que os homens se permitiam, mas, no que diz respeito às mulheres, tal ponto de vista — que se distingue nitidamente da atitude dos jovens de hoje, que veem em cada moça uma fêmea à caça de um macho — era, penso eu, saudável. As moças, endeusadas assim, empenhavam-se — umas mais, outras menos — em se tornar deusas. Também Kassátski sustentava o mesmo ponto de vista a respeito das mulheres e assim figurava sua noiva. Estava particularmente apaixonado nesse dia e não experimentava o menor grau de volúpia; ao contrário, olhava-a comovido, como para algo inacessível.

Ele se levantou em toda sua enorme altura e se colocou diante dela, apoiando ambas as mãos no sabre.

— Somente agora percebi toda a felicidade que pode experimentar um ser humano. E isso foi a senhora, foi você — exclamou, num sorriso tímido — que me ofereceu!

Estava naquele momento em que o uso de "você" ainda não era habitual, e olhando-a de uma posição moralmente inferior, temia dizer "você" àquele anjo.

— Aprendi sobre mim graças a... você; aprendi que sou uma pessoa melhor do que pensava que fosse.

— Sei disso há muito tempo. Por isso, apaixonei-me pelo senhor.

Ali ao lado, um rouxinol pôs-se a cantar, e as folhas tenras estremeceram sob a brisa passageira.

Ele tomou a mão da noiva, beijou-a, e lágrimas brotaram dos olhos dele. Ela entendeu que Kassátski estava agradecido por ter dito que o amava. Ele deu alguns passos, calou-se, depois se aproximou e se sentou.

— A senhora sabe, você sabe, bem, não faz diferença... Eu não me aproximei de você sem interesses, eu queria estabelecer um vínculo com seu meio, mas depois... como isso se tornou insignificante comparado a você, quando a conheci. Você não vai se zangar comigo por isso?

Ela não respondeu, apenas segurou as mãos de Kassátski.

Ele entendeu que tal gesto significava: "Não, não vou me zangar".

— Bem, você disse... — hesitou, temendo ser um tanto impertinente — você disse que começou a me amar, e eu acredito, mas, me desculpe, parece haver algo mais, que lhe aflige e incomoda. O que é?

"É agora ou nunca", pensou ela. "Ele vai descobrir de qualquer maneira. Mas agora não vai me abandonar. Ah, se ele me deixasse... seria terrível!"

E lançou um olhar apaixonado em direção àquela figura alta, nobre, robusta. Agora ela o amava mais que a Nikolai e, não fosse a aura imperial, não trocaria um pelo outro.

— Ouça, não quero faltar à verdade. Devo contar-lhe tudo. O senhor me pergunta o que há? Pois bem, já estive apaixonada antes.

Colocou as mãos sobre as dele em um gesto suplicante.

Ele permanecia calado.

— O senhor quer saber por quem? Ninguém menos que Sua Majestade.

— Todos nós o adoramos, eu imagino, a senhora no Instituto...

— Não, depois. Eu estava entusiasmada, depois passou. Mas eu preciso dizer...

— Mas então o quê?

— Não, não é tão simples.

Ela escondeu o rosto com as mãos.

— O quê? Você se entregou a ele?

Ela permanecia calada.

— Foi sua amante?

Ela seguia calada.

Kassátski levantou-se de um salto e ficou parado diante dela, pálido como a morte, as maçãs do rosto tremendo. Recordava agora o modo afetuoso como Nikolai Pávlovitch felicitara-o na Avenida Niévski.

— Meu Deus, o que foi que eu fiz, Stiva!

— Não, não me toque. Como dói!

Deu meia-volta e dirigiu-se à casa. Lá chegando, encontrou a mãe da condessa.

— O que aconteceu, príncipe? Eu... — ela se calou ao ver seu rosto. O sangue subira-lhe de repente à cabeça.

— A senhora sabia de tudo e me usou para encobri-los. Se não fossem mulheres... — gritou ele, erguendo o punho enorme, depois virando-se e saindo em disparada.

Fosse o amante da noiva um homem qualquer, ele o teria matado, mas era seu amado tsar.

No dia seguinte, Kassátski pediu uma licença e, em seguida, a baixa, dizendo estar doente; a fim de não ver ninguém, rumou para o campo.

Passou o verão em sua propriedade, organizando os negócios. Ao final do verão, em vez de retornar a Petersburgo, dirigiu-se a um monastério e tornou-se monge.

A mãe escreveu-lhe, tentando dissuadi-lo de dar aquele passo. Respondeu que o chamado de Deus era maior que quaisquer outros motivos, e ele o havia sentido. Apenas a irmã, orgulhosa e ambiciosa como o irmão, soube compreender.

Compreendeu que Kassátski havia se tornado monge para se colocar acima dos que lhe queriam mostrar que estavam acima dele. E estava certa. Tornando-se monge, mostrava seu desprezo por tudo aquilo que parecia tão importante aos outros e a si mesmo à época em que estivera em serviço e se colocava em novo patamar, do alto do qual poderia olhar com desdém as pessoas a quem antes invejara. Não foi, porém, apenas esse sentimento que o guiara, como pensava a irmã Várienka. Havia outro, um sentimento verdadeiramente religioso, desconhecido de Várienka, o qual, mesclado ao orgulho e ao desejo de estar em primeiro lugar, igualmente o guiara. A decepção que tivera com Mary, que lhe parecera um anjo, o ultraje sofrido, tudo isso provocou-lhe uma dor tamanha que o conduziu ao desespero, e o desespero conduziu-o para onde? Para Deus, para a fé de sua infância, que nele nunca se rompera.

Padre Sérgio (1898)Where stories live. Discover now