PRELUDIO

41 2 0
                                    

Estou com o celular em uma mão e uma corda na outra observando Havannah dormir calmamente sobre a minha cama. Estirada sobre os lençóis com os feixes das luzes atravessando a janela de vidro, ela parece ainda mais graciosa, intocável.

Ela usa apenas uma camisa azul marinho e uma calcinha de renda preta que a pouco tive o prazer de tirá-la e saborear sua pele pálida e perfumada. Essa noite eu a despi pela última vez e despi parte da minha alma para ela, foi subliminar, mas sinto que irei sufocar em meu próprio sangue desgraçado a qualquer segundo.

Pela primeira vez em toda a minha vida, sinto oque é bondade genuína, o futuro dissolvido numa sopa como sal num caldo enfraquecido fazendo minha mente febril arder ansiosa e nervosa.

Meu lado covarde quer possuir Havannah perfurando-lhe a carne para não correr o risco de que ninguém mais a tenha ou a tire de mim, e outro lado patético e oprimido quer que eu me distância, que corra a milhas e milhas de quilômetros para longe dela, para que fique a salvo das minhas garras predatórias e para que tenha uma vida plena e maravilhosa como a tem vivido.

Gente como ela é verdade. Não é apenas uma mente inteligente ou uma rosto com belos traços,  ela é tudo. 

Calmaria e furacão.

Aproximo meu rosto de seu pescoço mais uma vez para grudar seu aroma na minha mente e me afasto com lágrimas ardilosas nos olhos, com uma sede sanguinária de rasgar sua carne com os dentes.

Mas de repente ela se move buscando meu corpo ao seu lado e  então meu tempo acaba. Ela vira-se em minha direção e com seus grandes olhos e cabelos negros encara-me perturbada e sonolenta.

- Grego? – ela tenta manter os olhos abertos esticando a mão para acender o abajur sobre o criado mudo.

Aterrorizada com meu estado de soluços, ela senta-se na beira da cama sem entender o propósito da corda em minha mão, e essa simples ação quebra minha postura demoníaca.

Atiro o objeto maldito que escolhi para tirar-lhe a vida e disco o número da policia no celular pendurado em minha mão esquerda.

- Grego fale comigo – ela se coloca de pé e faz menção de caminhar em minha direção.

Faço em gesto bruto para que ela se mantenha afastada e em prantos começo a falar com a atendente do outro lado da linha.

- Sou eu – grito – Sou eu a porra do assassino das garotas da Flórida.

Havannah permanece estática como se eu estivesse louco, mas seus olhos não se desviam dos meus. A atendente confusa, ameaça desligar ao achar que é uma pegadinha, o que me causa pânico:

-Anya, Tessa e Dália – grito em pânico – Todas elas!

E esse é o exato momento em que os olhos de Havannah começam a se encher de lágrimas e ela avança sobre mim tentando arrancar o celular da minha mão.

- Pare! Pare! – grita furiosa – Não tem graça Grego! O que deu em você?

A empurro para trás fazendo-a destontar no chão, e me encolho sobre a porta do banheiro tremendo da cabeça aos pés:

- Estou no Paloma Dan, prédio Verde, terceiro andar, quarto número onze – continuo berrando para a policia enquanto ouço o som de teclados do outro lado da linha – Venham depressa desgraçados!

Então atiro o celular para longe e encaro de canto de olho a decepção nos olhos a jovem mulher a minha frente.

Ela ainda está sentada no chão com as pernas estiradas, e as costas recostadas na cama como se esperasse despertar de um pesadelo, mas diferente de todas as outras ela não expressa inércia patética no rosto ou medo escandaloso.

- Diga que não Grego – ela fala pausadamente – Diga que isso não é verdade.

- Eu queria tanto matar você Annah – lhe conto francamente, arrancando a mascara que escondi por tantos meses – Queria dilacerar você os dentes, tê-la tanto que passei dias e noites sem pregar os olhos.

Esse exato, é o exato momento em que ela percebe o meu tom de voz, meu olhar monstruoso que custeou a ver desde o princípio, o momento exato em que a presa percebe que está sendo espreitada por um predador.

- Eu pensei que havia me enfeitiçado, que fosse algo imortal ou divido, ou apenas mais uma como as outras, mas você mudou tudo – continuo falando e falando enquanto ela empalidece.

- Por que eu mudei tudo? – sua voz frágil e audaciosa sai quase inaudível em meio as lágrimas esquálidas que escorrem por suas bochechas.

- Por que eu aprendi a amá-la – respondo.

E então, como uma deixa, a porta é arrombada e me atiram de peito no chão.

Vejo o rosto decepcionado e desprezível de Havannah enquanto me algemam e a tiram dali, e deixo-me ser levado sem protestar.  

PREDADOROnde histórias criam vida. Descubra agora