Capítulo 3

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O despertador soou alto e insuportavelmente perto de seus ouvidos. Rosamaria tapou a cabeça com o travesseiro enquanto tateava a cama desesperada para cessar o barulho atordoante. Quando o fez, jogou o celular longe e resmungou claramente irritada.


Enrolou o suficiente na cama para que seu corpo e sua mente despertassem um pouquinho e então olhou a tela do celular. Sete da manhã da segunda-feira. Resmungou outra vez e se levantou lentamente enquanto tentava absorver os primeiros minutos do seu dia.

Ótimo, começamos bem.

Foi arrastando os pés até a cozinha e preparou algo rápido para comer, não se demorando muito ali. Se aprontou para o seu primeiro dia de treino e antes de sair pela porta fechou os olhos e pediu para todas as entidades que conhecia para que o dia não fosse tão ruim e para que o universo não fosse tão cruel com ela.

No Uber a caminho do clube se ocupou em olhar as ruas e não pensar muito nos momentos que estavam por acontecer. Ela havia conversado com Gabi e Roberta na noite anterior e elas reforçaram para a amiga não ficar sofrendo por antecipação e que as coisas seriam como tinham que ser. Não é como se Gattaz fosse pegá-la pela gola da camiseta e expulsá-la do ginásio a força.

No fundo ela sabia que a mais velha não a destrataria, o que a fazia sentir ainda pior pois só confirmava o quão boa pessoa Carol era e o quão injusta ela havia sido com a mulher. Mas ainda assim era difícil não criar dezenas de cenários com o reencontro.

Nem percebeu quando o motorista estacionou e ficou esperando alguma reação dela.

- Moça? Então... Chegamos – a voz do rapaz a tirou de seus pensamentos e ela limpou a garganta tentando disfarçar seu estado enquanto abria a porta desajeitada – Ei, você ainda não pagou!

- Desculpa, foi mal! Aqui – ela corou vergonhosamente com a situação, e em seguida fez o pagamento aproximando o celular da máquina e desaparecendo dali o mais rápido que podia.

"Pelo amor de deus, Rosamaria. Acorda pra vida, tá pior que adolescente", pensou ao parar e encostar em uma parede do clube para respirar. Ficou ali por alguns minutos até se sentir preparada o suficiente e se encaminhou para o ginásio.

O que aconteceu a seguir foi meio caótico. Todo mundo indo até ela e lhe abraçando, várias vozes falando ao seu redor ao mesmo tempo e ela tentando processar a informação. Foi quando ela viu a mulher alta e loira se aproximar lentamente. Por um momento ela deixou de escutar tudo em sua volta e se ocupou em observar a mais velha.

A interação foi rápida e Rosamaria não podia negar o beliscão que sentiu em seu coração ao perceber a distância da outra com ela. "Bom, pelo menos ela me deu as boas-vindas, isso já é algo né... Né?", suspirou. Ela não queria pensar demais, não naquele momento.

O treino correu bem, ao final do dia ela estava exausta. Se sentia feliz por reencontrar quase todas as suas antigas amigas no Clube que há tanto tempo já havia sido sua casa. Se sentia bem ali, e por mais que a situação que a preocupava não era das melhores, mesmo assim ela conseguiu sentir o alívio de estar de volta.

Rosamaria mal pisou dentro de sua casa pela noite, e seu celular já estava vibrando loucamente. Ela sabia muito bem quem era.

- Meu deus, não me dão nem um segundo de paz – atendeu a chamada de vídeo fingindo uma cara feia para as amigas e só recebeu risadas de volta.

- Até parece que você não ia ligar para gente em alguns minutos e tirar a nossa paz, né Rosamaria, dá licença – Gabi riu enquanto respondeu a alfinetada da amiga.

- É Rosinha, pode ir abrindo a boquinha e contando os babados logo. Fiquei ansiosa o dia todo esperando por essa edificação em primeira mão – quem falou foi Roberta se ajeitando do outro lado da tela enquanto tentava não derrubar o balde de pipoca que tinha por perto.

- Eu sou uma piada pra vocês? É isso? – Rosamaria se jogou no seu próprio sofá, chutou os sapatos longe enquanto se acomodava devidamente e suspirou – Foi estranho, ela me deu as boas-vindas... E só. Silêncio sepulcral o resto do dia. Nem parecia que ela estava no treino enquanto eu tava perto.

- Eu tava esperando cem por cento de silêncio, então podemos dizer que isso foi um avanço – Gabi disse despreocupada e dando de ombros – e aí, quando vai dar início aos trabalhos de reconquistar a véia então?

- Gabi, para de ser doida, você não ouviu a menina? – Roberta interveio rapidamente – Deixa ao menos ela falar mais que boas-vindas... Talvez perguntar se tá tudo bem, falar sobre o clima, perguntar se a Rosa come rato, sei lá...

- Viu, eu ainda tô aqui e tô ouvindo esses absurdos, tá? – Rosamaria só teve força para revirar os olhos e fez uma careta – e essa cantada dela foi horrível Roberta, não podia ter lembrado de uma menos pior, não?

As duas riram e tentaram distrair a mulher do caos que ela sentia se formando outra vez em sua cabeça. Elas riram das piadas e comentários sem noção de Gabi, ouviram os desabafos de Roberta que ainda se sentia chateada pelo seu relacionamento fracassado e por fim retornaram para Rosamaria.

- Quem diria que Rosamaria, a rainha do golpe, estaria sofrendo por amor, ein? Achei que essa palavra nem existia no seu vocabulário – Gabi outra vez com seu comentário fez Roberta soltar uma risadinha baixa e Rosamaria revirar os olhos pela trigésima vez só naquela chamada.

- Pra tu ver né... Eu também achei que não existia. Essa véia gosta de causar na minha cabeça.

- Aham, ela que gosta de causar, né? – Roberta rebateu – Ainda há luz no fim do túnel, confia que vai dar certo. Eu sei das coisas.

- Ih, alá, baixou a Lene Sensitiva? – Gabi cutucou a amiga – Diz aí então, quando é que a Sheilla vai abrir os olhos e descobrir que o amor dela sou eu?

As três explodiram em uma risada. Rosamaria amava as amigas e suas aleatoriedades e aquele momento, por mais que cheio de verdades e conversas difíceis, estava sendo de total alívio para ela.

- Tu é demais Gabriela. Vai dormir que teu mal é sono – Rosa ainda tinha resquícios do riso em seu rosto.

Gabi resmungou que falava sério e elas riram mais um pouco. A chamada não se estendeu muito mais e cada uma se despediu prometendo se falar em breve naquela semana.

Rosamaria sentiu o cansaço bater em seu corpo e se levantou para tomar um banho. Enquanto estava debaixo do jato de água quente que saía de sua ducha, a mulher parou para pensar no seu dia e em Carol. Se estapeou mentalmente por ter feito a situação chegar aonde chegou.

Ela estava certa de que se possível queria recuperar pelo menos a amizade que elas tinham e que respeitaria todos os tempos da mulher. Ela faria de tudo para tê-la de volta em sua vida da maneira que a outra estivesse disposta e esperava que não demorasse muito.

No fundo, ela sabia que tinha muito trabalho a ser feito e por mais que demorasse ela sabia que o esforço valeria a pena.


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Mais um capítulo para vocês, os comentários e votos estão me animando e me deixando muito feliz! Que bom que a ideia está agradando.

Obs.: Estou postando um capítulo por dia enquanto a onda de criatividade está batendo, talvez em algum momento demore um pouco mais (até mesmo porque este projeto de autora precisa trabalhar às vezes lol).

É isso.

Aproveitem!

Medo Bobo - RosattazWhere stories live. Discover now