03| Invasão de privacidade e outras drogas

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― Você é cínico ou o que? Não se vire!! ― exclamei no instante em que o rapaz fez menção de se virar, outra vez. ― O nome não é "as merdas que aprontava", mas Bullying. Era isso o que você fazia, Stone! ― Um silêncio se instaurou pelo quarto assim que as palavras deixaram meus lábios.

Ao sentir as lágrimas a caminho, peguei um par de roupa qualquer e me tranquei no banheiro batendo a porta com força.

O que ele quer vindo até aqui e fazendo essas perguntas idiotas?

Passei a camiseta pela cabeça rapidamente, enquanto meus pensamentos pairavam sobre o cara do outro lado da porta.

Babaca!

Terminei de me trocar e passei a pentear o cabelo. Eu ia esganar a Mariana, essa merda estava acontecendo por culpa dela. O que a garota tinha na cabeça para dizer a um "desconhecido" que guardamos nossa chave dentro do jarro de planta ao pé da porta?! Isso era o tipo de coisa que ela dizia a todo mundo, ou só a idiotas para encherem o meu saco?

Soltei uma lufada de ar completamente frustrada com toda a situação.

Cinco minutos depois, voltei a abrir a porta do banheiro e para a minha infelicidade, Dean permanecia lá, bisbilhotando minhas coisas como um perfeito stalker. Seus olhos percorriam a minha estante de livros, lendo alguns dos títulos e fazendo uma careta para todos os clichês clássicos.

― Por que ainda não foi embora? ― meu tom de voz era um pouco mais calmo dessa vez, contudo, ainda estava incomodada com a sua presença.

― Nós precisamos conversar, e não vou sair daqui antes disso. ― disse dando de ombros enquanto ainda tinha os olhos curiosos sobre meu gosto literário. ― Aconselho que pare de fugir de mim, Lis. Não costumo desistir fácil do que eu quero. Não mais... ― disse por fim, me fazendo perder a voz por alguns instantes.

― Tem cinco minutos antes que eu comece a gritar dizendo que tem um assediador no meu quarto. ― Finalmente consegui abrir a boca, tomando o máximo de cuidado para não transparecer o nervosismo.

Dean sempre foi o tipo de cara que conseguia te desestabilizar em poucos segundos. Seu olhar era terrivelmente intimidador quando assim o queria, e sua postura sempre dava um ar de superioridade.

― Então você é mesmo a Anna Lis de São Paulo, certo? ― me lançou um olhar de soslaio.

― Não... a de Londres! ― Murmurei impaciente e o garoto me olhou com uma das sobrancelhas arqueada. Ele estava me advertindo sobre o negócio de "fugir".

― Você vem aqui, mexe nas minhas coisas, fala sobre o passado e ainda me vem com uma pergunta idiota dessas? ― cuspi as palavras com um misto de irritação e ironia.

― A culpa não é minha se você está completamente diferente. ― rebateu no mesmo tom.

Dean, enfim, se virou em minha direção deixando seus olhos castanhos se encontrarem com os meus por longos segundos, causando uma sensação estranha em meu peito.

― Diferente pra cacete... ― Ele deu um passo em minha direção e recuei outro.

― As pessoas tendem a mudar com o tempo. Algumas para melhor, outras pra pior...

Um meio sorriso arqueou seus lábios por alguns milésimos de segundos, até desaparecer rapidamente e seu olhar tomar um tom mais escuro.

― Eu também não sou mais o mesmo, Scott. E se não tivesse passado as últimas duas semanas fugindo de mim igual o diabo foge da cruz, você já teria percebido isso.

― Não estava fugindo... ― tentei soar convincente, mas falhei miseravelmente. Passar muito tempo perto dele ainda mexia seriamente com o meu sistema nervoso.

― Não? ― Dean ergueu uma das sobrancelhas a me desafiar, e isso me deixou muito irritada.

― Seu tempo expirou junto com a minha paciência, agora vaza!! ― Caminhei até a porta e escancarei a mesma, esperando que ele fosse embora de uma vez por todas.

Dean se aproximou me fazendo acreditar que estava a poucos segundos de me livrar dele. No entanto, quando sua mão impulsionou a madeira branca para frente voltando a fecha-la, um perfeito "o" de indignação enfeitou meus lábios.

― Ainda não terminamos, e eu disse que não sairia daqui antes de resolver tudo. ― falou com os olhos preso aos meus, causando aquela sensação estranha em meu peito outra vez.

Me afastei incomodada com a forma que meu corpo reagia a ele. Isso era ruim, muito ruim! Parei no meio do quarto, onde achei que estava a salva e voltei a fita-lo.

― Estou ouvindo...

Antes dele dizer algo, seu olhar divagou pelo cômodo por alguns instantes e percebi suas mãos inquietas; Dean estava nervoso?

― Queria me desculpar pelo... bullying! Às vezes eu passava dos limites e nem notava.

― Isso é sério? Soltei sem acreditar no que ouvia.

― Talvez pudéssemos ser amigos... ― Continuou.

― Está brincando, né? ― ri nervosa. ― Você me odiava no fundamental!

― Eu não te odiava! ― O rapaz afirmou como se aquilo fosse um absurdo.

― Era amor reprimido, então? ― cuspi as palavras com sarcasmo. E um silêncio ensurdecedor foi tudo o que recebi como respostas.

― Sabe o quão ridículo soa a palavra "amizade" vindo de você? Nem mesmo sabe o que isso significa, então, é óbvio que não podemos ser amigos! ― disse sentindo a raiva tomar espaço em meu íntimo. ― Você nem faz ideia do que passei durante os cinco miseráveis anos que esteve na minha vida. Então não me venha com esse falso arrependimento e olhar penoso, isso não funciona mais comigo.

Dean levou uma das mãos a cabeça deixando transparecer sua frustação, enquanto bagunçava os fios negros. Em seguida, ela desceu até seu rosto e um suspiro longo deixou seus lábios.

― Droga! Isso não devia estar sendo tão difícil... ― O escutei resmungar baixo.

― É você quem está dificultando as coisas, Stone. Vamos apenas continuar como antes, cada um fingindo que não se conhece e vivendo nossas vidas normalmente. É a opção mais viável. ― Argumentei sem mais forças para brigar ou discutir. Eu só queria que ele fosse embora de uma vez e me deixasse em paz.

― É isso o que quer?

― Ainda tem alguma dúvida?

― Tudo bem...

Não durou mais de três segundos para que Dean passasse pela porta e eu me encontrasse sozinha, outra vez.

Sempre | Melhores momentosWhere stories live. Discover now