-"Isso não é problema meu, nem deveria ser teu."- O tom do Shelby saiu frio e cruel e acabou por arrepia-la.
-"Estás a falar de uma pessoa, Thomas!"
-"O Alfie tem mais de animal do que eu de humano, love. Somos feitos do mesmo."- Baixou a cabeça lidando brevemente com os seus demónios.
-"Ninguém é um monstro por opção e tu melhor que ninguém deverias saber isso. Vou para o hospital." Helena virou costas a Thomas e preparou-se para sair da fábrica.
-"Certo, procura o teu porto de abrigo como sempre fazes."-Thomas acendeu um novo cigarro.
Helena parou repentinamente e voltou a encarar Thomas, as suas palavras magoavam-na a um nível profundo.
-"Eu estou a teu lado mas nunca serei uma propriedade tua. Tens de meter isso na tua cabeça de uma vez por todas."- Helena foi-se deixando-o com as suas palavras presas na mente. Cerrou os olhos com força e tentou organizar as ideias.
Helena entrou no edifício e percorreu os longos corredores dirigindo-se à recepção. Como odiava entrar ali. Era um lugar pesado, emocionalmente arrasador. A enfermeira mal notou a sua chegada correndo de um lado para o outro tentando fazer o melhor que podia para não falhar em nada.
-"Boa tarde, qual é o quarto de Alfie Solomons?"- Perguntou limpando a garganta esperando pelo que lhe pareceu horas pela resposta.
-"Boa tarde, lamento mas o Sr. Solomons não recebe visitas."- Disse a enfermeira sem olhar para si procurando na pilha de papéis alguma ficha de doente.
-"O meu nome é Helena Marques enfermeira, por isso a mim vai receber-me."- Disse Helena endireitando a postura. A mulher à sua frente parou repentinamente e olhou na sua direcção engolindo a seco. Não gostava de o fazer mas às vezes era necessário usar o seu nome para chegar onde queria.
-"Desculpe menina Marques, não a reconheci. O Sr. Solomons alugou o piso 3 para estar mais à vontade."
-"Claro que alugou."- Helena baixou a cabeça e sorriu levemente.- "Obrigada."- Dirigiu-se para as escadas e parou repentinamente num lanço. Tinha medo do que ia encontrar, do estado em que ia ver Alfie, era um lutador por natureza e saber que estava atirado à sua sorte numa cama deixava o seu coração do tamanho de uma noz. Na porta do andar estavam os homens do judeu que depressa a reconheceram e deixaram passar. Helena apenas seguiu a fila interminável da segurança de Alfie até ao quarto, que acabaram por se afastar um pouco para lhe darem privacidade. Rodou a maçaneta e o cenário que encontrou foi desolador para si.
Alfie encontrava-se deitado com um lençól que lhe cobria apenas metade do tronco. Helena pode ver as feridas abertas, tapadas por compressas embebidas em cremes para aliviarem a dor. Respirava com dificuldade e a máscara de oxigénio na sua cara revelava isso mesmo. Tinha o olhar preso na janela que revelava uma leve linha de sol. Helena levou a mão à boca tentando abafar o choro e o choque que se apoderava dela. Directamente ao lado da cama estava uma bacia cheia de compressas ensanguentadas que pingavam e pintavam o chão de vermelho. Era pior do que tinha pensado. Reuniu todas as suas forças e fechou a porta.
-"Alfie."- Disse num tom suave para não o assustar.
A cabeça do judeu rodou na sua direcção e baixou a máscara de oxigénio lentamente, a sua expressão revelava uma dor constante.
-"Helena? Fuck! Eu morri? Ou isto é apenas uma miragem?"- A sua voz saia embargada e fraca. Helena sorriu e dirigiu-se para a cadeira ao lado da cama, levando a sua mão à cara de Alfie marcada pelas chagas, tentou não passar directamente por cima de nenhuma pois saberia que lhe traria desconforto. Alfie fechou os olhos e suspirou.
-"Merda não quero que me vejas assim querida, este não é o Alfie que mereces. Recuso-me a aceitar a tua pena por mim."- Alfie abriu os olhos e encarou-a, podia ver o quanto sofria por o ver naquele estado.
-"Não te vou deixar sozinho."- Ao seu lado encontrava-se uma outro bacia com água limpa e uma toalha. Alfie ardia em febre e todo o seu corpo tremia. Helena pegou na toalha molhando-a bem e colocou-a na testa do judeu sentido o alívio instantâneo que aquele gesto lhe trazia. -"Deixa-me chamar a enfermeira, precisas de algo para as dores."
-"Não. Analgésicos fazem-me parecer um vegetal, já que não posso ter o meu corpo preciso da minha mente lúcida. Não me tires isso."- A pele de Alfie tinha um tom amarelado e a sua barba grossa apresentava algumas falhas.
-"É bom saber que não perdeste essa teimosia."- Helena sorriu-lhe.
-"Preciso que te vás embora, love."- Alfie agarrou a mão de Helena levando-a ao único sitio do peito onde na sua pela estava cicatrizada.-"Não quero que te recordes de mim assim, yeah?"
Helena despedaçou-se em mil pedaços com aquelas palavras, nenhum dos dois era bom em despedidas e aquela parecia cada vez mais uma despedida definitiva.
-"Vais superar isto, não é a porra de um cancro que vai acabar contigo."- Tentou parecer esperançosa, agarrando com força a mão de Alfie.
-"Fodasse mulher, não me faças rir."- Alfie fez uma careta pois qualquer movimento lhe causava uma dor indescritível.- "Não tenho nada a que me agarrar sabes?"
-"Fizeste-me uma promessa Alfie e tu não és homem de quebrar promessas."
-"Parece que desta vez vou ter de quebrar, sweetheart."- Alfie dava-lhe um sorriso abatido, ainda agarrando a sua mão como se a sua vida dependesse disso.
-"Precisa da tua ajuda para acabar com o Mosley, sem ti não consigo."- Helena aproximou-se um pouco mais dele.
-"Não precisas de nada, tens o mundo a teus pés. És a porra de um anjo."
-"Luta por mim."- Helena pediu-lhe, o judeu suspirou preso nos seus olhos.
-"Tu vais ser a minha morte ou a minha cura, yeah?"- Alfie mordeu os lábios esquecendo-se por breves instantes da dor que sentia.
YOU ARE READING
My Golden Gangster.
FanfictionThomas é forçado a viajar para Portugal numa tentativa derradeira de parar Oswald Mosley, que continua os seus avanços imparáveis no mundo fascista. Lá encontra a ajuda improvável de Helena, uma mulher de origem cigana e com o coração tão despedaçad...
Cura.
Start from the beginning