Capítulo 4: o bom amigo a casa torna

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De volta à República Nerd.

Monstro hibernou por quase todo o dia, acordando já perto das 9 da noite para comer uma latinha de Kitut. Voltou para a cama logo após sua refeição. Tardou a pegar no sono, mas preferiu ficar deitado a fazer qualquer coisa que tivesse como pré-requisito a movimentação de seus músculos. Queria permanecer na inércia por todo o tempo que pudesse.

Charles assistiu quatro episódios atrasados de Fringe antes de também pegar no sono profundo durante a tarde. Quando acordou para forrar o estômago, Monstro já tinha passado pela cozinha. A latinha de Kitut recém-aberta e o cheiro insuportável não deixavam dúvidas. Charles preferiu pegar seu pacote de bolachas de sal e levar para comer no quarto, de onde só saiu na manhã seguinte.

Mais uma noite tranquila na República Nerd.

Como de costume, Charles foi o primeiro a sair do quarto ao amanhecer. Cumprindo suas tarefas rotineiras, ligou o notebook e preparou sanduíches bem recheados para tomar café.

Comida pronta, notebook ligado. Só faltava um detalhe. O som ambiente da TV. Providenciou a última cereja de sua manhã de imediato.

Para seu espanto, não ouviu a Ana Maria Braga conversando com o Louro José. Também não ouviu as receitas fantásticas que fazia seus olhos brilharem todas as vezes. Naquela manhã, a programação foi dominada pelas transmissões da TV Teletins.

"...voltamos neste momento com informações ao vivo sobre o caos que está acontecendo próximo ao Hospital Geral de Palmas, no Tocantins. Há rumores de que uma pessoa carregando um vírus perigoso conseguiu sair do hospital e está atacando moradores da região."

— Monstro, Monstro! Ô, Monstro, acorda, moço — gritou Charles.

Charles foi até a TV e aumentou o volume. O aparelho era bem antigo, não tinha controle remoto. E os botões de volume e mudança de canal presentes na carcaça da televisão funcionavam conforme a boa vontade divina.

— Que foi, Charles? — retrucou Monstro, que ainda nem tinha aberto os olhos na cama.

Antes de responder, Charles parou para escutar o resto do noticiário.

"A polícia informou por contato telefônico que todas as casas presentes em um perímetro de duas quadras em volta do hospital foram desocupadas e que as pessoas foram encaminhadas para escolas municipais, onde aguardam a doação de colchões e alimentos."

— Você não pode ir pros teus rolos do Centro hoje, viu?

O noticiário continuou:

"Não há motivo para pânico. O Centro de Controle de Zoonoses também está envolvido no caso e temos esperança de que até o fim da tarde de hoje tudo estará resolvido."

O conselho de Charles foi ignorado com sucesso. Monstro sequer respondeu, e voltou a dormir como se nada tivesse acontecido. Capaz de nem se lembrar do seu comportamento ao acordar de verdade.

Charles teve sua atenção capturada por barulhos no portão.

— Gente, cheguei — gritou Emu ao entrar. — Ria, ria, ria, ria, ria.

Emu. Mais um personagem de nome caricato para uma república cheia de personalidade. Emu carregava consigo seu apelido desde os primórdios de sua vida escolar. Era o típico nerd gênio e lerdo que entrou na faculdade com quinze anos de idade. Ele tinha acabado de terminar o seu trabalho de conclusão de curso. Agora, era só esperar o início do outro semestre para a grande festa de formatura. Ainda não tinha decidido se ficaria mesmo na cidade de Palmas ou se tentaria a vida em Floripa assim que colocasse as mãos em seu diploma. Mas até lá, iria encher o saco de todos os seus amigos com jargões como "Ria, ria, ria, ria, ria", que ele pronunciava em uma cadência similar a uma risada maligna nada assustadora.

LIVRO I - O Início do Fim (Degustação + Livro Físico)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora