immaculate sin of the lovers • L.S.

ūnus

Seu corpo é um templo. E agora que Harry entende isso muito bem, mantê-lo límpido, livre de impurezas mundanas e espirituais, é seu objetivo principal.

Uma chuva outonal despenca do lado de fora e refrigera a atmosfera da sala de reunião. Mas, aparentemente, não está frio o bastante para ligarem o aquecedor. No entanto, a pele tensa de Harry protesta. Os dedos gélidos enfiam-se para dentro das mangas do hábito em busca de proteção.

Hoje o diálogo se centra na vocação monástica. O grupo de propedeutas é composto, ao todo, por treze garotos vindos de distintas regiões da Inglaterra. Harry é o que veio de mais perto. Holmes Chapel está a oitenta quilômetros ao norte.

Já na primeira semana ele soube que todos compartilham de infâncias parecidas; batizado em idade tenra, cargo de coroinha na primeira infância, Catequese e o reencontro com Cristo através da hóstia da Primeira Eucaristia antes da puberdade eclodir, Crisma logo em seguida, rotinas no coral e no teatro da igreja... Enfim, juventudes regadas pelo catolicismo.

Harry percebeu que, até aquele momento, nunca tinha se encaixado tão perfeitamente a um grupo de garotos de sua idade. Era muito reconfortante.

Ali eles estão sob a orientação de dois reverendos - o mais velho tem a pele escura como ébano e o mais novo tem um rosto que não revela idade, sem o viço corado da juventude mas sem o mínimo vestígio de rugas -, do Frade e do Diretor Espiritual. Além deles, o Arcebispo Lawrence faz visitas esporádicas. Há também uma dupla de freiras e uma fiel de meia idade que desempenham as funções de limpeza da Congregação e cuidam da alimentação deles.

Naquele momento, a disposição das cadeiras formam um círculo quase perfeito. Enquanto os seminaristas e o frade - de sobrancelhas chamativas, grossas e cheias, que por um triz não são coladas uma na outra - vestem seus respectivos hábitos, o posicionamento religioso dos outros orientadores notícia-se pelo uso do colarinho branco junto com roupas formais negras.

A maioria dos rapazes demora-se em discursos encharcados de devoção. Aos que atêm-se à brevidade, os orientadores os olham com expectativa, estimulando-os a aprofundarem-se um pouco mais na nascente de palavras. Só não o fazem quando Mitch, à esquerda de Harry, afirma que só está ali porque a mãe o obrigou.

A declaração audaciosa desconcerta a todos os seminaristas e, até mesmo, o Padre mais novo é pego desprevenido. Porém, o Diretor, demonstrando indiferença, desvia os olhos para Harry, cuja circulação sanguínea pulsa intensamente nas bochechas. O homem de cabelo grisalho fino e pele pontilhada de sardas, em silêncio, passa a palavra para si.

- Ahn... eu...

Ele não deveria se sentir nervoso, mas depois do que aconteceu, foi irremediável. Harry sente-se envergonhado, constrangido, como se tivesse sido ele próprio quem confessou estar ali contra a sua vontade.

- Bem, o Reverendo da paróquia que minha família frequenta foi quem me ajudou a ouvir o chamado. Agradeço muito por isso. Sem ele, não sei se teria sabedoria para aceitar minha vocação.

Mesmo tendo falado pouco, Harry fita os orientadores, esperando que se voltem à Louis. No entanto, eles continuam olhando para si, querendo que prossiga. Mas ele não sabe mais o que dizer.

- Sabe, às vezes algo está diante dos olhos, tão perto o tempo todo, que sequer notamos... como o nariz - Harry não acredita que comparou a vocação com um nariz. Ele precisa melhorar suas analogias - Quero dizer, eu não me conectava com muitas coisas da vida lá fora. A agitação, a perdição, a perversidade: preferia manter distância de tudo isso. O Padre foi um grande amigo meu, e eu admirava as virtudes do coração, da alma dele. Admiro a prontidão que ele tem em ajudar qualquer um que peça; sem julgamentos, sem qualquer distinção. Por um bom tempo, me limitei a apenas adorar de longe a vida que ele levava. Não imaginei que, um dia, eu poderia mergulhar nela do jeito que tô fazendo agora, nem que um dia eu possa me tornar alguém como ele. Estou feliz que a verdade me alcançou no tempo certo.