Pode deixar.

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O vento frio me fez encolher um pouco, passar as mãos por meus braços e colocar alguns fios de cabelo atrás da orelha. Eu costumava amar dias frios quando era mais nova, minha mãe me acordava com chocolate quente, assistíamos filmes, ficávamos o dia todo com um cobertor, era divertido, mas conforme fui crescendo, as coisas foram mudando. Eu fui mudando. Não me dei conta das coisas que estava perdendo, só me toquei quando já era tarde demais.

— Temos que ir, querida. - Senti a mão do tio John em meu ombro e respirei fundo antes de levantar.

— Minha mãe nunca me colocaria em um internato. - Falei com as mãos no bolso no meu moletom.

— Sei que não. - Parou ao meu lado.

— O que aconteceu com o cara que se dizia meu pai? - Encarei o mais velho que fitava o chão.

— Também não sei, querida. - Passou a mão por meu cabelo. - Tenho certeza que ele irá reconsiderar isto, mas agora precisamos ir.

— Só vou me despedir. - O mais velho não disse nada, só se retirou do local.

Me ajoelhei novamente diante do túmulo de minha mãe, ela morreu quando eu fiz 16 anos e acho que eu me sinto culpada por estar ausente quando ela mais precisou de mim, eu faria tudo para poder ter uma última conversa com ela, me despedir da forma correta e não do jeito que aconteceu.

Coloquei um lírio em cima de seu túmulo e fui para o estacionamento, meu tio estava em frente ao carro conversando no telefone com alguém, ele sorriu quando me viu e desligou o telefone.

— Preparada? - Perguntou com um sorriso quase que contagiante no rosto.

— Nem um pouco.

Acredito que passamos umas quatro horas dentro do carro, meu tio tentava me animar, mas em um momento assim, isso não é tão fácil.

Quando meu pai pesquisou por internatos, ele fez questão de escolher um bem longe de casa, para eu não chegar perto da casa dele tão cedo.

— Você promete que vai se comportar, Moe? - Só notei que já havíamos chegado quando meu tio começou a falar.

— Não prometo nada. - Saí do carro e olhei ao redor.

— Cuidado, aqui parece ser um canto meio serio...e cheio de santos, do jeito que sei pai gosta. -Gargalhou.

— Eu me viro.

— Boa sorte, menina.

Meu tio me ajudou a tirar as malas do
carro e uma senhora usando terno rosa, um salto tão fino que nem imagino como ela estava conseguindo ficar em pé naquilo veio em direção.

— Olá, dama . - Sorriu e desviou o olhar para meu tio.

— Cavalheiro. - Sorriu ainda mais, meu tio sorriu de volta. — Você teve sorte de trazer a senhorita Shalifoe a tempo, ela vai sair outra pessoa daqui, livre de qualquer pecado.

— Ah - John colocou as mãos no bolso, forçou um riso e olhou em minha direção, eu revirei os olhos. —  Tenbo certeza que farão um ótimo trabalho.

— Moe, querida, de tchau para seu tio, pois ainda temos coisas a fazer.

— Valeu. - Eu e ele nos abraçamos. — Isso é uma palhaçada. - Cocochei um seu ouvido.

— Concordo. - Falou baixinho. - Não deixe nenhum deles te mudarem, viu, garota?

— Pode deixar.

A parte de fora do colégio é enorme, tem um jardim bem verde e as paredes da frente são azuis, é bem bonito.

Passamos por algumas pessoas que olhavam, davam risadinhas ou cochicham com as que estavam ao seu lado.

A mulher loira me explicou mais ou menos como as coisas funcionam por aqui, as aulas, os fins de semanas, os passeios em campo e essas coisas. Ela me avisou que não poderia mostrar o colégio por conta de sua agenda lotada então chamou uma garota (que não demorou nem 20 segundos pra chegar) ela não é muito alta e deve ter por volta de uns 16 anos no máximo, sei cabelo é curtinho com um franja muito lisa.

— E chegamos ao seu quarto. - A guarita falou tanto durante o caminho todo que nem percebi o tanto que já tinha andado.

— Legal. - Disse sem muito interesse e observei a porta em minha frente, tinha uma placa com meu nome e o nome de uma garota chamada Leah.

— Venha. - Ela abriu a porta e eu a segui sem dizer nada. — Aquele é o seu uniforme, não podemos usar moletons aqui só os do colégio, claro.

— Esse colégio é um saco.

— Você vai gostar daqui, as 18 você pode escolher quais atividades vai querer fazer. Já pensou em alguma?

— Talvez música.

— Eu AMO música! Também estou nela, qual você acha que devo tocar para a apresentação de terça, Pink ou Beyonce?

— Acho que você vai ficar bem cantando qualquer uma das duas. - Por favor não fale mais nada e saia, por favor não fale mais nada e saia.

— Você não foi uma ajuda muito útil, mas tudo bem, eu vou decidir até mais tarde. Agora se troque e vá para a cantina.

Ela saiu e fiquei observando o quarto, as paredes eram de madeira clara, não era nada extravagante, tinha duas camas, dois guarda roupas, duas escrivaninhas e duas cômodas. As paredes eram uma mistura de azul e branco igual o uniforme, coloquei uma de minhas mochilas na cama que estava sem colcha, ela provavelmente deve ser a minha, tirei meu moletom e observei o uniforme, a parte de cima não era tão feia, porém a de baixo era horrível, era uma saia, que coisa mais brega. Vesti a camisa branca, depois coloquei a parte azul e comecei a desabotoar a calça, mas um barulho da porta sendo batida me assustou e uma garota de cabelo enorme entrou, engoli em seco, ela era muito bonita, usava uma toca, batom vermelho sangue e tinha um delineado perfeitamente reto.

— Quem é você? - Ela perguntou com um sorriso sacana.

— Ah - Fechei meu zíper novamente. — Toni, sou nova aqui.

— Prazer. - Ela se aproximou e esticou a mão. - Sou a Regan, vim procurar minha amiga, esse é o quarto dela. Você viu ela por aqui?

— Nem vi. - Respondi enquanto negava com a cabeça. — Eu preciso terminar de me trocar. - Com difícil desviei meu olhar daquela garota e escutei a risada dela.

— Relaxa, eu nem tô olhando.

Depois que a garota saiu, finalmente terminei de vestir aquela roupa tosca e peguei uma folha que a garota que me apresentou a escola tinha entregado, era uma espécie de horário de atividades. Agora são por volta das 13:20, então é a hora do almoço, mas não tô com um pingo de fome, nunca costumo almoçar em casa, aqui não vai ser diferente.

Tranquei a porta do quarto e peguei minha mochila, espero que ninguém resolva bater aqui agora.

Tirei o fundo falso que tinha nela e lá estava minha carteira de cigarro, fui até a janela com ela em minhas mãos e fiquei observando os alunos jogando bola, ascendi o cigarro enquanto ficava cutucando a caixa com os dedos, vou precisar economizar, meu pai conseguiu achar tudo que eu tinha escondido,  essa foi a única que sobrou.

Ele insiste em dizer que tenho problemas com isso, mas o fato de eu gostar de fumar, não significa necessariamente um problema, eu só me sinto bem quando fumo ou quando vou em uma festa e fico completamente bebada, são os momentos em que me sinto mais viva.

Antes meu pai não me julgava por isso, ele nunca ligou muito pra mim na verdade, depois que ele conheceu a Susan ,sua nova esposa, ele conseguiu virar um insuportável.

Ela que convenceu ele a me colocar nesse maldito lugar, longe dos meus amigos, longe da minha irmãzinha, longe da minha vida, longe de tudo e de todos...longe da minha mãe...

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⏰ Última atualização: Apr 17, 2022 ⏰

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𝐒𝐖𝐄𝐄𝐓𝐇𝐄𝐀𝐑𝐓Onde histórias criam vida. Descubra agora