Capítulo 06 - Dom, O Barbeiro

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"Estou em um quarto que eu não conheço. Em cima de uma cama que não é a minha. Na minha frente, me encarando, um jacaré enorme, pronto pra me devorar. Ele pula na cama e eu fico alí, parado. Só observando. Ele caminha lentamente em minha direção. Seus braços são tatuados. Um jacaré tatuado pronto pra me devorar. Que porra é essa?!
De repente, ele parte pra cima e eu, no impulso, parto pra cima dele também. Luto bravamente com um jacaré imenso. "

Abro meus olhos e meu sonho se desvanece na luz da escuridão.
- Que diabo foi isso? - questiono-me.
Desde o dia que conheci o tatuado gostoso misterioso, que não paro de pensar ou sonhar com algo que me lembre dele.
Ele tem um físico delineado em traços clássicos: ombros largos e musculosos, quadris estreitos. Óbvio que ele malha. Eu poderia olhar pra ele o dia todo. Meu corpo se acende de desejo só de lembrar. Seu olhar é intenso, ameaçador até, mas sensual pra caralho. Os dois braços totalmente tatuados, marcados de várias maneiras.
Ele é tão frustrante. Tão sensual e tão desejável. Como pode?!
Fecho os olhos, numa tentativa inútil de dormir. Ele está na minha mente: seu corpo, seus braços tatuados, seus olhos por trás das lentes Ray-Ban Round, sua barba, sua boca... aí meu Deus, o que está acontecendo comigo?!
Me levanto da cama, decidido a ir até a cozinha tomar um copo d'água. Já é tarde, o sono me abandonou completamente. Um calor descomunal percorre meu corpo, minha garganta está seca. Estou sedento de tudo. Não apenas de água.
Ando a esmo pelo apartamento, meus passos ecoa na sala de estar. O local está dolorosamente vazio.
"...Talvez eu só esteja projetando no tatuado hétero gostoso aquilo que eu gostaria de viver. A carência faz isso com a gente. Deve ser isso. Ele nunca que vai me notar"
Quase uma hora mais tarde, volto para a cama. Já passa das 2hs da madrugada. Preciso dormir. Amanhã é dia de trabalho, como todos os outros aliás. Pouco tempo depois finalmente adormeço, caindo em um sono profundo e sem sonhos.
O despertador toca às 07hs em ponto. Acordo atordoado. Desligo imediatamente e volto a dormir. Hoje só entro no trabalho às 14hs, preciso descansar um pouco mais. Quando acordo, tento organizar minhas ideias e pensamentos. É isso que preciso fazer. Preciso focar em algo que me faça esquecer o tatuado. Não entendo como um desconhecido pode mexer tanto comigo. Homem nenhum nunca fez isso.

Com Ana Carolina cantando a canção "Ao redor de nós dois" nos meus ouvidos, sigo em direção ao ponto de ônibus, com destino ao shopping onde trabalho. É então que percebo que o tatuado está escondido em todas as músicas da minha playlist. Desde que o conheci, ele vive no meu pensamento. Se alojou de tal forma que não consigo espantar.
Quando chego na livraria onde trabalho, espanto todos os pensamentos. Esse lugar é uma segunda casa pra mim. Ando tão sozinho ultimamente que aqui, me sinto muito bem na companhia dos muitos leitores que nos visitam diariamente.

Ainda bem que posso trabalhar, pois isso me dá algo em que pensar que não seja na minha vida pessoal. Estou conferindo alguns livros novos que acabaram de chegar e preciso organizar todos nas prateleiras. Estou tão envolvido na tarefa, conferindo livro por livro, até que por alguma razão que não sei explicar, ergo os olhos.... E pra minha surpresa, sou capturado imediatamente pelo olhar envolvente do tatuado gostoso que está parado a poucos metros, encarando-me atentamente.
Puta que pariu! Meu coração acelera descompassadamente.
- Olá, poderia me ajudar?! - diz ele.
Seu olhar é firme e intenso. Não consigo resistir e nem desviar deles.
Mais que droga! Que diabos ele está fazendo aqui?! Meu queixo caiu em algum lugar e não consigo encontrar. Meu cérebro e minha voz não respondem. Minhas pernas estão trêmulas feito vara verde.
- Claro. O que deseja?! - balbucio. Isso é tudo o que consigo dizer no momento.
Nos lábios dele um meio sorriso e em seus olhos, uma curiosidade surgia diante de mim.
Balanço rapidamente a cabeça na tentativa de colocar minha mente para funcionar. Meu coração está disparado e, por alguma razão, fico todo desconcertado sob o olhar minucioso dele.
Aquele homem não é apenas bonito. De perto, percebo que ele é simplesmente uma sinopse da beleza masculina. É algo de tirar o fôlego. E ele está aqui, bem na minha frente.
- Estou a procura do livro da atriz Fernanda Montenegro. Já está disponível aqui? - pergunta ele.
- Sim, já temos. - Digo, depois de respirar fundo e assumir minha postura profissional.
- Ótimo. Vou levar. Presente pra minha mãe. - diz ele.
- Excelente escolha. - respondo com a voz trêmula.
Tento paracer indiferente diante dele, mas a verdade é que estou me concentrando para me manter equilibrado e não tropeçar em meus próprios pés, enquanto caminho até a prateleira onde está "Prólogo, ato, epílogo ", o livro de memórias da Fernanda Montenegro.
Ele olha os títulos dos livros daquela seção. Mas o que ele quer aqui afinal?
- Está aqui seu livro. - As palavras saem da minha boca antes que eu possa dete-las.
Nossos dedos se encontram muito brevemente enquanto lhe entrego o livro, e uma corrente se manifesta percorrendo todo o meu corpo, como se eu tivesse encostado em um fio desemcapado. Dentro de mim, bem no meu íntimo, sufoco um gemido. Desesperado, tateio entre os livros a minha volta, procurando algo que me ajude a me equilibrar.
Consciente de que seu olhar quente está sobre mim, me recuso a encara-lo.
"Tente ficar calmo Enzo!"
Implora meu inconsciente bruscamente torturado.
- Precisa de mais alguma coisa? - pergunto, tentando fugir daquela situação.
Ele ignora minha pergunta. Pegando o celular do bolso da calça, ele checa alguma mensagem que acabara de chegar.
- Só isso mesmo meu jovem.
- Meu nome é Enzo.
- Bom te conhecer Enzo e obrigado pelo excelente atendimento. A propósito, me chamo Dom. - diz ele com a voz suave e o olhar cheio de mistério, curioso até.
Encaro, incapaz de me expressar. É como se as placas tectônicas estivessem se movendo naquele exato momento.
Ele segue para o caixa efetuar o pagamento e eu fico alí, parado. Meus olhos o segue. Ele caminha firmemente, transbordando sensualidade.
Instante depois, sou surpreendido novamente por ele.
- Tchau Enzo. E obrigado! - diz ele.
Sua língua parecia acariciar cada letra do meu nome. Meu coração dispara mais uma vez. Mal consigo respirar.
- Tchau. - Isso é tudo que consigo reproduzir.
Ele sorri e vai embora em seguida, deixando-me com um batalhão de hormônios se degladiando dentro de mim.
Depois do meu espírito sair e voltar umas mil vezes, me refaço e chego a uma fatídica conclusão: Eu estou completamente apaixonado por esse homem. Nunca me senti assim antes. Mas isso não tem futuro, eu sei... Tá na cara que ele nunca vai sentir o que estou sentindo. Que loucura é essa!

As Paixões Secretas de EnzoWhere stories live. Discover now