olhar que queima

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Depois de dias, quando Mu Qing começou a dar indícios de que finalmente iria acordar, Feng Xin sentiu seu coração acelerar em nervosismo.

Em uma calamidade, o cérebro de um deus precisava estar tranquilo e concentrado para enfrentar o que precisasse, mas quando Feng Xin avistou Mu Qing ali, era como se todas aquelas semanas de meditação e cultivação tivessem sido em vão, pois seus pensamentos se tornaram um caos torrencial.

Nem mesmo a quase uma semana que o outro passou desmaiado, acordando algumas vezes apenas por meros segundos e sendo diariamente cuidado pelos médicos do exército, foi tempo suficiente para Feng Xin colocar sua mente em ordem.

Ele não queria pensar sobre nada e apenas o indício de um raciocínio já o dava dores de cabeça. Queria só mandar Mu Qing de volta para o céu, seguro e sem efeitos colaterais no relacionamento habitual deles. Esse era o lugar do outro, afinal. No céu, com seus subordinados e seus poderem em plenas capacidades, brigando com Feng Xin de longe. 

Porém, era senso comum que, por estar na calamidade de Feng Xin, Mu Qing tinha sido mandado ali para cumprir um papel e, só seria liberado pelos deuses, quando a tarefa estivesse cem por cento concluída.

Feng Xin suspeitava sobre o conteúdo da "missão", mas novamente, não queria ter que pensar, queria adiar o "pensar" tanto quanto pudesse, pois pensar implicaria em ter que encarar seus próprios sentimentos e depois descobrir o que fazer com eles. Por mais que, provavelmente, acabasse tendo que fazer isso ali com Mu Qing, uma hora ou outra.

— Quem é você? — O dono dos pensamentos de Feng Xin disse de repente. A voz era suave e parecia sair dos lábios pálidos com dificuldade. Ele já havia levantado seu corpo e estava sentado na cama, enquanto encarava Feng Xin sentado em uma cadeira no canto da tenda.

— Eu quem deveria te perguntar isso... Te salvei. — A frieza era sempre uma máscara bem vinda, então Feng Xin decidiu se manter frio e distante. Não poderia demonstrar a fraqueza que Mu Qing o causava, muito menos que o conhecia.

A resposta de Mu Qing foi um bico adorável nos lábios, que fez Feng Xin apertar os olhos por alguns segundos antes de abri-los novamente. 

O Mu Qing verdadeiro nunca faria um bico fofo assim, muito menos dirigido a ele. O impasse que Feng Xin se encontrava entre aproveitar as novas expressões na face que, normalmente, era apática e se lembrar a todo momento que o Mu Qing a sua frente estava frágil e sem memórias, o deixava fadigado.

— Por que eu não começo, então? — Feng Xin disse com dificuldade em se manter indiferente. — Sou Feng Xin, General Nan Yang. Sou o general do exército que te resgatou. — Continuou, mas mesmo assim, nenhuma resposta veio da parte de Mu Qing. — Você pode falar pelo menos por que foi preso?

— Meu nome é Mu Qing e... — Ele murmurou, desviando o olhar para suas mãos, pousadas em seu colo, e mexendo os dedos. — Eu tenho a escolha de não falar sobre isso? — Mu Qing respondeu com uma pergunta. Mesmo que os ferimentos visíveis tivessem sido curados e sobrassem apenas hematomas, ele parecia estar em uma dor interna. 

Feng Xin imaginava a resposta da própria pergunta. Os hematomas evidentes espalhados pelo corpo de Mu Qing davam uma ideia do que ele sofria nas mãos inimigas e, só de pensar nisso, um bolo de formava na garganta de Feng Xin, que tinha vontade de estraçalhar completamente qualquer membro restante do outro exército. 

Seus pensamentos foram interrompidos quando percebeu algumas lágrimas translúcidas caindo sobre o edredom fino que cobria Mu Qing. O aperto no peito de Feng Xin se intensificou e ele sentiu o ímpeto de se aproximar.

Minha Calamidade | FengqingWhere stories live. Discover now