Terra Proibida - Essência

[45 anos atrás] A proposta

— Diego! — pulou o velho ao reconhecer a voz de quem se tratava, ficando com a face lívida. Fazia um mês que não se aventurava a sair de casa temendo ser pego de surpresa. Desconsertado prosseguiu. — não podia esperar meu... meu convite?

— Não quando a propriedade é minha, meu caro e ilustre Coronel Moraes. — respondeu apreciando o charuto. — as coisas não progrediram como o tratado, não é mesmo?

O homem voltou-se para a porta e a fechou com exagerada cautela, acendendo às luzes do escritório, iluminando de vez seu visitante. Sabia que Diego era um vampiro, mas mesmo assim espantou-se ao notar que ele não envelheceu um dia sequer. Imponente, sensual e assustador, exatamente igual há 22 anos.

— Então? — disse Diego retomando o assunto ao perceber a perplexidade do Coronel. — chegou o grande dia. — fitou o coronel no fundo dos olhos. — Está preparado?

— Por favor... — murmurou o velho atônito.

Com os olhos colados aos de Diego, dominado pelo pavor e estremecido ante aquele olhar fulminante buscava na memória qualquer desculpa que pudesse o levar a saída.

— Antes de tudo, peço que... que... que considere meus esforços — implorou o coronel, correndo até uma estante repleta de livros e puxando um deles — aqui! Analise com atenção!

— Hum... e o que o nosso pacto tem a ver com seu livro de contabilidade? — Diego estava começando a ficar irritado além de entediado.

— Estão aqui todas as dívidas que fiz com que Eduardo Detzel acumulasse nas últimas décadas — disse eufórico — assim que a velha Aimeé morrer e ele herdar a Fazenda das Almas, tomarei as terras e elas logo serão suas!

O coronel entregou a Diego o livro e se assentou à mesa de frente a ele o olhando atentamente, tentando captar qualquer mínima expressão na face do outro, sem sucesso algum.

— E aí? — interrompeu impaciente após longos 5 minutos. — o que acha?

— Simplesmente uma pena. — seu olhar era sombrio. — embora as dívidas sejam comprometedoras, nada garante que ele seja o herdeiro das terras em questão.

— Mas, é natural que ele seja... a velha está quase morta e...

— Quase morta não é morta. Acabou, coronel. — levantou-se e caminhou tranquilamente até a janela que se abria enquanto ele se aproximava. Seus olhos estavam fixos na lua. — já extrapolei o meu limite de caridade da década concedendo a você um mês a mais do que o combinado.

— Não! Eu imploro! Eu não quero...

Uma ventania invadiu o lugar, revirando todo o cômodo, bagunçando tudo, enquanto Diego permanecia inabalável, tragando pacientemente o charuto apreciando a beleza do satélite.

— Eu não quero... morrer hoje...

— É o fim. Simples.

O vento arremessava os livros das estantes ao chão, as luzes piscavam, um aroma doce e suave pairava no ar. O coronel se agachava aterrorizado em um canto do cômodo tentando se proteger com as mãos sobre a cabeça. Como um vulto, Diego estava a sua frente, Moraes não controlava mais os próprios movimentos, seu corpo erguia-se, terminando por ficar frente a frente à razão de seus temores. Tudo o que via era um monstro talhado em mármore com um olhar dourado felino e os lábios escurecidos em um sorriso perverso que contrastava perfeitamente com o branco de suas presas mortais soltando as palavras em um rugido.

— Hora do espetáculo!

O desespero manifestado em suor escorria sobre a face do velho. Há 22 anos ele nunca teria acreditado que esse dia chegaria de tanta convicção que tinha em si para comprar as terras dos Detzel. Acreditou que seria como tirar o doce de uma criança, já que dispunha de todo o dinheiro e influências necessárias proporcionados pelo pacto, e tão logo as entregasse a Diego, seria rico e poderoso enquanto vivesse. Nem se quer levou com a seriedade necessária a cláusula que implicava a perca de sua alma caso não cumprisse o tratado. Na ocasião Diego disse "nada vem de graça, meu caro! Tudo o que terás acesso é perigoso e extremamente importante... custa uma alma.". Em um esforço sobre-humano balbuciou, enquanto sentia seus ossos sendo esmagados e sua pele queimando.