Capítulo 4

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         Como já tinha falado, não havia separação entre as ruas e calçadas e era assim em todas as partes, independente de ricas ou pobres. O problema disso é que, enquanto caminhávamos para a praça, uma carruagem surgiu às nossas costas e pulei de encontro à Elizabeth e Zach quando ouvi o barulho do cavalo tão próximo.

        Claro que se ele estivesse nos seguindo calmamente por parte do caminho não teria me assustado, mas não foi assim. A carruagem surgiu de uma rua paralela e me pegou de surpresa. A questão é que se eu desse mais uma dessas mancadas as pessoas começariam a suspeitar de mim. Que tipo de morador não conhece os próprios costumes de sua sociedade?!

        A praça, nosso destino, era um círculo formado por grama contrastando com as pedras cinza ao redor. Havia um pequeno palco de madeira em seu centro e muitas pessoas já se aglomeravam para assistir à execução. Como as pessoas podiam gostar de assistir a essas coisas?!

        — Ótimo dia senhoras e senhores! – um homem todo vestido de preto subiu no palanque e começou a discursar. Seus cabelos eram castanhos quase da cor de chocolate e mesmo assim pude notar alguns fios brancos. Usava óculos de lentes redondas. — Há de ser um dia virtuoso para a cidade de Melas. – ele apontou suas longas mãos para uma grande árvore com um grosso tronco projetado sobre o palco.

        Se ele não tivesse apontado acho que não teria percebido porque estava evitando olhar e encontrar alguém morto afinal, não sei quantas pessoas eles executam por dia. Havia mais um homem, menos elegante, amarrando uma corda na árvore.

        — Concedam a mim suas palmas glorificantes por haver aprisionado Maya Gricem. – o apresentador alisou os bigodes parecendo satisfeito.

        O mesmo homem que amarrara a corda subiu empurrando Maya até o palco e percebi que as surpresas não tinham acabado. Sabe quem era a Maya Gricem? Aquela que eu conheço como fantasma da mulher de época com uma pequena diferença: não havia machucados em seu rosto. As manchas roxas, os olhos vermelhos ou o sangue escorrido de sua boca não estavam lá. E deduzi que a motivo era óbvio: os machucados pertenciam ao fantasma e eram a marca de sua morte. Diante de mim, naquele instante, Maya ainda estava viva.

        E com tantos raciocínios deduzi um pouco mais. As manchas permanentes em minha mão, provavelmente, acompanhariam meu espírito aonde quer que ele fosse.

        — Ela é uma bruxa! E muitos de nós, cidadãos honestos, compramos seus produtos na loja de remédios. Havia de querer nos enfeitiçar! As bruxas merecem a morte!

        — As bruxas merecem a morte! – a maioria dos espectadores repetiu o lema.

        Em que época tão antiga estava para que as bruxas ainda fossem assassinadas? Isso tinha sido uma das maiores crueldades da história. E mesmo antes de me descobrir bruxa pensava assim.

        Maya foi obrigada a subir sobre um banco de madeira e sua cabeça foi enfiada no laço de corda amarrado ao galho. Caramba! Eu não queria assistir isso! Abaixei a cabeça e comecei a fitar os pedaços de grama. Sei que seria impossível não sentir aquela cena à minha frente. Todos ali respiravam a mesma tensão. Alguns ansiosos pela morte da cruel bruxa e outros neutros.

        Não acredito que estivessem realmente neutros. Com certeza, tinham medo de ter o mesmo fim que ela.  Tinha dito que éramos farinha do mesmo saco... Bem, não exatamente. Ela tinha matado Sandra e Samantha e isso nos tornava diferentes, mais ainda sim eu estava no grupo de pessoas que não queriam a sua morte. Não sou a favor da pena de morte, ainda mais executada desta maneira.

        E foi enquanto olhava para a grama, perdida em meus dilemas pessoais, que voltei a ouvir as vozes. Maya estava falando para que todos a ouvissem?! Levantei meus olhos discretamente e percebi que sua boca mantinha-se fechada. Então o que eu estava ouvindo só podiam ser seus pensamentos. Decidi me concentrar e escutá-los.

A Maldição Gricem (Livro 2 - Saga A Herdeira)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora