— A senhora não saberia o que é melhor pra mim nem se essa coisa estivesse bem debaixo do seu nariz — retruco. — Será que não consegue enxergar o mal que está me causando, mamãe? — Faço uma pausa e olho dentro dos olhos dela. — Ryan me contou tudo. 

A sala de estar é mergulhada em um silêncio arrebatador. Juro que consigo escutar a torneira da pia da cozinha pingando. Mamãe parece ter sido pega totalmente desprevenida, o que anula qualquer chance de arquitetar um plano b. Chegou a hora de colocar as cartas na mesa com bastante transparência. 

— Tudo o que eu fiz foi tentar te proteger — ela não se cansa desse discurso? 

— O que a senhora fez foi desumano — retruco, amargurada. — Você não brincou apenas com os meus sentimentos, mas de outra pessoa também. Acha que foi certo colocar o dedo nas feridas do Ryan só para beneficiar a si mesma? 

— Eu fiz o que tinha de fazer! 

— Não, mamãe — grito, irritada. — Sempre temos outra escolha! 

— E o que você vai fazer? Vai voltar para San Diego com aquele rapaz? 

— É exatamente isso que eu vou fazer — eu a desafio. 

Sua expressão se desarma por completo. 

— Você não pode… 

— A decisão já foi tomada. Estou aqui para me despedir — tento manter a calma. — Estou deixando essa vida para trás, e consequentemente, a senhora também. 

Ela fica boquiaberta. Me dói estar dizendo isso, mas preciso ser forte. 

— Eu amo a senhora — declaro. — Mesmo que não tenha sido a melhor mãe, eu continuo te amando incondicionalmente. E nada me deixa mais triste do que vê-la desse jeito, tentando sabotar a vida de outras pessoas, da sua própria filha, para tentar se satisfazer. Isso é digno de pena, mamãe. 

— Você está cometendo um erro — avisa ela, mas na sua voz não existe mais aquela confiança que eu conheço. 

— Você está enganada — abro um sorriso triste. — Pela primeira vez em muito tempo, sinto que finalmente estou acertando em alguma coisa. Que estou fazendo as minhas próprias escolhas, sem interferência da senhora. 

Ela se faz de forte, mas consigo ver o quanto está abalada. 

— Então é isso? — sua voz vacila. — Vai escolher um rapaz que pode virar as costas pra você a qualquer momento ao invés da sua mãe? 

Ando até ela, balançando a cabeça, e seguro os seus ombros. 

— Não, mamãe. Não estou escolhendo você ou Ryan; estou escolhendo a mim. — Olho dentro daqueles olhos familiares. — Por um momento, senti raiva da senhora pelo que você fez, pelas suas mentiras e planos maquiavélicos, mas agora… só me sinto triste. Porque sinto que as coisas poderiam ter sido diferentes entre a gente. Mas eu sei que, no fundo, você sabe que está errada. E eu perdoo você. 

E naquele momento, olhando para o rosto dela, eu vejo a sua dor. Às vezes, as pessoas nos machucam tentando fazer exatamente o contrário, e eu tenho certeza que a minha mãe estava tentando me proteger, mesmo que seus costumes não sejam a maneira mais correta. Um dia existiu uma mulher cheia de luz, doce e serena, mas a vida pode ser amarga a ponto de transformar as mais bonitas flores em um cacto. 

Senti raiva de tudo o que aconteceu, mas não guardo rancor. Não quero algo tão forte e sujo habitando o meu coração. Quero perdoá-la e acreditar na sua mudança, sua melhora, e eu realmente torço por isso, porque apesar de suas imperfeições, essa mulher sempre foi e sempre será a minha mãe. 

— Você precisa ficar um pouco sozinha e pensar nas suas ações — acrescento. — Mas quero que saiba que, quando estiver pronta, eu estarei aqui para que possamos conversar. Acertar as coisas. Mas até lá, eu peço que não interfira mais na minha vida. Não importa o que a senhora faça: eu não vou me afastar de Ryan, eu não vou voltar para a Igreja, não dessa forma que a senhora quer. E eu espero, mamãe, de todo o meu coração, que você encontre motivos reais para voltar a sorrir novamente. Espero que Deus ilumine seu caminho como está iluminando o meu agora. 

Eu me inclino um pouco e beijo sua testa. Afasto-me lentamente, guardando na memória aquele olhar vazio, a expressão melancólica. Mas no fundo eu sei que esse é o primeiro passo. Vamos conseguir superar isso. Não há mais nada que eu deseje nesse mundo do que ficar de bem com a minha mãe. Muitos esperam que eu surte, que eu exploda de raiva, mas eu não sou assim: eu acredito na mudança das pessoas. Se eu pude acreditar na mudança de Ryan, por que não posso fazer o mesmo pela mulher que eu amo? 

Quando chegar a hora de fazer as pazes, Deus vai fazer com que o nosso caminho se cruze novamente. Posso não ser mais freira, mas minha fé continua inabalável. 

Saio de casa sem dizer mais nada. Quando o raio do sol atinge o meu rosto, sinto como se estivesse finalmente me libertando das correntes que me prendiam a esse lugar. Fecho os olhos por um segundo, apenas absorvendo essa energia, e quando volto a abrir os olhos, encontro Ryan me encarando, me esperando do outro lado da rua. Caminho até ele; meu alicerce, meu porto seguro. 

Paro na frente dele e entrelaço nossos dedos. É como se eu estivesse encaixando uma parte de mim na dele. 

— Tudo bem? — Seus olhos me avaliam, preocupados. 

— Vai ficar — abro um sorriso que demonstra todo o meu alívio. — Vamos embora daqui. 

Ele aperta um pouco mais a minha mão e me puxa para mais perto; assim, caminhamos lado a lado, sem olhar para trás. A partir de agora, tudo o que eu quero é pensar no meu futuro ao lado desse homem. 

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