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Logo Liam tornou a procurá-lo.

– Professor, eu não sei o que está havendo. Devo estar enlouquecendo, mas venho aqui para pedir-lhe que alivie meu sofrimento. Poderia me explicar o que quis dizer ontem? Aquelas palavras ficaram martelando em minha mente e quanto mais eu reflito, mais elas parecem fazer sentido, de uma forma que não sei explicar... Eu não faço ideia... Devo ir a um sanatório?

– Você quer mesmo que eu conte?

– Por favor... Qualquer coisa para aliviar minha confusão. Eu nem me reconheço mais...

Compadecido, o mestre fitou as olheiras de seu pupilo.

– Sente-se, meu caro. Aceita um copo d'água?

– Eu não desejo nada, exceto uma explicação... Por favor!

– Acalme-se. – Ele tocou seu ombro – Preciso que se esforce para não surtar, ou podemos ir parar os dois no manicômio. – O idoso suspirou, cansado – Tudo pelo que está passando, você já sofreu antes, Liam... Em vidas passadas!

Liam não tirou os olhos dele, tentando processar.

– Você manteve aquele diário em algum momento da Era Renascentista. Não sou capaz de precisar as datas corretamente e peço que releve.

– Eu fui conterrâneo de Shakespeare? – Sorriu admirado.

– Sim. – Ele retribuiu o sorriso – Anne era grande admiradora de suas obras. Sabe se ela ainda gosta?

– O senhor quer dizer que Amy... Era Anne?

– Ela te acompanhou através das vidas. E sempre por um motivo ou outro, vocês foram impedidos de ficar juntos.

Portanto Liam compreendeu que não apenas os sentimentos lhe angustiavam. As descrições feitas de Anne batiam com algumas das características que mais amava em Amy.

– Tudo começou em Esparta, na Antiguidade. Havia um jovem esparciata cujo nome era Gregórios. Quando ele completou a idade de trinta anos, deveria se casar e escolheu para si a jovem Aikaterhíne. Gregórios acreditava que poderia comprar tudo. Não poderia, entretanto, negociar a lealdade de um servo; não poderia conseguir da mesma forma, o afeto de uma pessoa. – Jacob escorou-se na mesa – Gregórios não imaginava que sua escolhida poderia amar outro. Aikaterhíne estava disposta a se casar com um hilota, mesmo sabendo que isso a tornaria uma serva para sempre. Caso a união fosse aceita, é claro. Você era um jovem messênio chamado Laértes, e mostrou-se disposto a fugir, o que Aikaterhíne aceitou de bom grado. Cego de ódio, Gregórios mal pensou: ao receber a notícia, pegou logo seu cavalo e seguiu o rastro dos dois, assassinando-os a sangue frio.

Impactado, Liam levou a mão à boca. O professor ficou em silêncio para que ele pudesse digerir as informações.

– Ela escolheu a mim... – Balbuciou emocionado.

O professor anuiu, colocando seus óculos.

– E depois? Houve mais vidas?

– Sim. E algumas terminaram de forma parecida. Creio que a vida que mais se difere seja a que teve na Inglaterra. Eu não sei o que lhe ocorreu; talvez estivesse tão cansado das intromissões de Gregórios, que decidiu agir de forma diferente.

– Conte-me, por favor! Não me faça voltar a ler aquilo!

– Tem certeza? – Ao que o rapaz anuiu, ele continuou: – Bem... Você, ou Laurence, como se chamava então, encantou-se por Anne quando a viu pela primeira vez. Mas como era um simples órfão tentando ganhar a vida, nunca teve coragem de se aproximar da filha de um lorde. Não espere que eu vá me recordar dos nomes de todos. – Ele bebeu um copo d'água.

VicissitudeWhere stories live. Discover now