01

1.1K 62 258
                                    

Liam chegou cedo. Estava cansado, mal dormira. Fez grande esforço para se concentrar nas aulas, porém não lhe foi possível. Ao final do dia, sentia que não absorvera o conteúdo. Sua mente sempre vagava de volta à raiz de sua aflição.

Liam procurou pretextos para permanecer na Universidade; não queria voltar para casa. Sentia faltarem-lhe forças para enfrentar o que estava por vir. Entrando na biblioteca, separou alguns livros, dos quais pretendia extrair as informações que julgava ter perdido em sala. Um velho professor entrou, carregando com dificuldade seus pertences. Prestativo, Liam foi ao seu encontro, ajudando-o a chegar a uma mesa. Assim que se sentou, o professor Jacob pôs-se a datilografar. O ruído trouxe uma distração a mais para Liam, que não tirava os olhos do grande relógio da sala, enquanto mordia seu lápis. Tal agitação não passou despercebida pelo mestre.

– Há algo errado? – Indagou.

– Não, senhor. – Retorquiu depressa.

– Por que não vai embora?

– Preferi ficar para resolver matérias acumuladas.

– Entendo...

Jacob levantou-se. Liam presumiu que ele houvesse partido, entretanto voltou mais tarde.

– Ora, onde deixei... – E aproximando-se, quis saber: – Ainda está aqui?

– Tenho muito a elucidar.

Observando a inquietação que persistia no jovem, o idoso insistiu:

– Por que não para de encarar o relógio?

– Eu não sei... Estou me esforçando tanto, mas...

– Há algum problema de família?

– Minha família passa bem, obrigado.

O professor puxou uma cadeira diante dele e o encarou.

– Então estou correto em supor que se trata de um assunto do coração?

Liam fitou-o emudecido.

– Ora, vamos... – Jacob riu suavemente – Você me lembra de quando fui pedir a mão de minha esposa. Estava tão nervoso... Devia ter a sua idade. Passaram-se quarenta anos desde então... – Ele fitou uma parede, com ar nostálgico.

– Quarenta anos... – Ecoou Liam, admirado.

– Então? Como ela se chama?

– É... Complicado. – Ele suspirou, passando a mão pelo rosto. Fitando o mestre por fim, quis saber: – Posso ajudá-lo?

– Hein?

– O senhor havia mencionado que se esquecera de algo...

– Oh, é verdade! – Ele sorriu – Que cabeça a minha!

Levantando-se, o idoso caminhou até a mesa onde se encontrava a máquina de escrever. Ao lado dela, além de pilhas de papéis, havia um embrulho mal feito, atado por um barbante.

– Isto chegou para você. – Ele se arrastou de volta, apoiando-se e entregou-lhe em mãos.

Liam franziu o cenho diante do pacote.

– Eu não costumo receber nada aqui.

– Sim, eu achei muito estranho. Contudo, não havia a quem perguntar; encontrei isso em minha mesa.

– De fato, muito estranho. – Liam se animou a pegar seu paletó e se retirar, detendo-se na porta. – De todo modo, obrigado, professor. – Ele abriu um sorriso que não lhe chegou aos olhos.

VicissitudeDonde viven las historias. Descúbrelo ahora