Capítulo 1 - San Yoo

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Qualquer jovem com doze anos de idade, na primeira oportunidade de se ver livre dos pais, ficaria radiante em ter um pouco de liberdade para fazer o que quisesse. Contudo, não queria ser a estraga prazeres nesse momento, então apenas admirei toda a empolgação saltitante da Chae Young enquanto agarrava meu braço e se despedia dos pais.

Para ela, íamos fazer uma longa noite do pijama, mas ela estava esquecendo qual era o meu verdadeiro objetivo ali: tínhamos que estudar. Eu não era avessa a me divertir, mas o plano original não mudaria.

Talvez a viagem dos pais e meu papel duplo de tutora e babá tenha transmitido um falso senso de liberdade. O que me dá vontade de rir, pois há poucos minutos precisei esconder os controles remotos na minha mochila como a bruxa má, fazendo-a recordar que o combinado foi: duas horas de estudo intercalada com cinco minutos de descanso. O cronograma da escola da Chae Young era super apertado, cheio de datas e atividades extras, fazendo com que eu precisasse incluir práticas de conversação em inglês mais de uma vez no nosso horário e nunca esquecendo a fraqueza dela: matemática. Então, era razoável seu desespero em fugir.

─ Falta muito? ─ pergunta com uma carinha triste, bem difícil de ver nela.

Nos dois anos em que a tutelo, exatas é sua reclamação principal, e também o motivo que fizeram seus pais me contatarem. Apesar do meu esforço em arrumar diferentes formas de fazer funções numéricas entrar na cabeça dela, às vezes também me sinto esgotada quando vejo a impaciência transparecer em seu rosto, mais do que qualquer outro dia, pois Chae Young não é assim. A animação junto com um sorrisão no rosto são sua marca registrada.

─ Se você conseguir acertar a questão número três nós podemos parar por hoje. ─ coloco o sorriso mais esperançoso no meu rosto, soltando a barganha mais ridícula dos últimos tempos, visto que faltam apenas dez minutos para finalizarmos. Mas ela não sabe disso, já que o nosso combinado é que o telefone não fique ao alcance das mãos.

No fundo eu também queria ter deixado o som rolando, cedido aos caprichos dela e aos meus, mas o esforço de agora será bem recompensado no futuro. Ela não via isso agora, ainda.

─ Tá bom. ─ um suspiro inconformado faz com que se debruce novamente nos livros.

Ela é perspicaz, tem sempre uma resposta divertida na ponta da língua e um jeito amável bem parecido com o de seus pais. Todas as quartas e sextas-feiras é um imenso prazer vir até a casa dos Choi e desempenho esse papel ─ que gosto muito, por sinal.

Chae Young é a minha terceira aluna, estamos juntas há dois anos, mas esse ano sou toda dela. Escolhi não pegar nenhum aluno novo, apesar das várias propostas tentadoras e bem remuneradas. Eu preciso focar na entrada da faculdade e me sair bem no último ano.

Só de pensar na faculdade sinto um medo percorrer meu corpo, fazendo minha cabeça doer ao pensar estar cometendo algum erro já que os formulários foram devidamente preenchidos e encaminhados.

Magistério. Pedagogia.

Aprendi a arte de lecionar brincando. É assim que defino. Naquela época eu nem tinha idade para saber o que estava fazendo, só vi uma colega de classe que não sabia falar coreano e achei que poderia ajudá-la. Os pais brasileiros a matricularam na nossa escola e nem era um colégio para estrangeiros, uma vez que em Cheongdo ─ um município pequeno ─ não há tantas pessoas de fora.

Então, com o pouco que sabíamos de inglês no ensino fundamental demos o nosso jeito, ela com a paciência de aprender e eu de ensinar, além de termos construído uma boa amizade que perdura até hoje. E aqueles primeiros passos me trouxeram para o que talvez seja a minha profissão no futuro.

Nossa Primeira ChanceWhere stories live. Discover now