Capítulo 29: Xavier

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Após rispidamente expulsar Luca de sua casa, Xavier jurara a si mesmo que não choraria por ele. Esforçou-se, portanto, para não encontrar seus olhos sôfregos quando o garoto impulsionou-se adiante e para não fitar sua silhueta afastando-se pelo corredor antes de fechar a porta com um estrondo um pouco alto demais.

Xavier sentia-se grato por não ter presenciado o pranto de Luca, que estivera visivelmente à beira das lágrimas durante toda a conversa, pois não sabia o quão firme sua tão adamantina decisão ainda se manteria perante o som de seus soluços. Vê-lo tão horrivelmente vulnerável diante de si, seus olhinhos tão esperançosos fitando os seus, seus lábios tão macios ainda queimando-lhe os dedos, o toque tão cálido de sua mão ainda acariciando-lhe o rosto, já fora-lhe quase fatal, sua determinação tão sólida, por pouquíssimo, quase transformando-se em neve sob o sol primaveril.

No silêncio de seu próprio quarto, Xavier concluíra que, se tivesse presenciado o pranto de Luca, ele não teria conseguido expulsá-lo daquela tão insensível e fria maneira. Sabia que aquele seria um artifício barato, o mais baixo dos golpes, que Luca poderia utilizar e não o fizera, por mais sincero que fosse seu abatimento. Por aquilo, Xavier sentia-se realmente grato.

Era tão simples enganar-se quando Luca não estava por perto, tão fácil fingir para si mesmo que tudo o que sentia por ele era apenas raiva, ressentimento, repulsa, tão fácil fingir que poderia, quem sabe, namorar Joaquim um dia e ser feliz ao seu lado. Porém, naquele momento, após ser tocado com tanta candura e mirado com tanta paixão, Xavier não conseguia mais esconder-se da verdade que tão insistentemente o perseguia: ele também amava Luca mais do que tudo. Era por este motivo que aquele término definitivo era-lhe tão insuportavelmente doloroso.

Mas ele não choraria. Recusava-se àquilo. Ele seria forte e não choraria. Resolveu, portanto, distrair-se. Ouvindo apenas suas canções mais alegres no modo aleatório, Xavier tomou banho, jantou, checou suas redes sociais. Quando retornou ao seu quarto, no entanto, uma música em específico iniciou-se em seus fones de ouvido.

E aquilo fora fatal.

"Passei a noite toda aqui, passei o dia todo aqui e, garoto, você me deixou andando desequilibrada". Na opinião de Xavier, aquela era uma das piores músicas já lançadas pela artista favorita de Luca e, por aquele motivo, ele nem remotamente orgulhou-se do pranto desenfreado e violento que suas meras notas iniciais trouxeram-lhe ao cerne.

Não bastava contrariar a mais intensa resolução que Xavier construíra para aquela noite. Não bastava somente chorar por Luca. Ele precisava também chorar por Luca ouvindo a música mais horrível da carreira daquela cantora, cuja discografia inteira acabou sendo ouvida por Xavier, cada canção de cada álbum trazendo-lhe memórias diferentes, dores diferentes, prantos diferentes.

O garoto, durante toda aquela noite, chorara. Chorara até que as músicas já lançadas por aquela artista se findassem, chorara até que a madrugada já quase alumiava-se em matina, chorara até que estivesse exausto demais para manter os olhos abertos.

Quando despertou, Xavier repreendera-se severamente pela noite anterior. Sentia-se dolorido pelo pranto, envergonhado pelos olhinhos inchados, amargurado pela culpa que ele agora reconhecia que carregava, pela injustiça que ele agora sabia que havia cometido.

Após tantas horas contemplativas, tantas horas nas quais ele não pensara em qualquer outro assunto senão seu próprio término e o moço que tanto fora humilhado, Xavier compreendera que ele era o grande e verdadeiro algoz naquela situação. Compreendera que Luca, apesar de suas ideias imbecis, não mentira, não traíra, não enganara, mas exatamente o contrário: fora sincero com seus sentimentos, rompera o relacionamento antes que qualquer erro pudesse ser cometido, confessara seu arrependimento na primeira oportunidade...

Porque eu amo vocêOnde as histórias ganham vida. Descobre agora