EXORCISMO

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1:40pm. Cidade do Vaticano.

O som que os saltos dos sapatos do Padre Alfredo faziam enquanto ele caminhava apressado podiam ser ouvidos do outro lado do extenso corredor no Pré-Seminário São Pio X. O Bispo o aguardava sentado em um rebuscado banco de madeira, do lado de fora do que parecia ser uma sala de aula.

— Vossa Excelência! – proferiu o padre ao curvar-se para beijar-lhe o anel.

O bispo apenas esticou a mão e continuou com a atenção voltada ao Diário de Roma que folheava despretensiosamente.

— O que seria tão urgente, filho? – disse o bispo, sem disfarçar o desinteresse em sua voz.

— Trago notícias da ... situação... na América do Sul.

As palavras do padre soaram como uma senha aos ouvidos do bispo, que fechou imediatamente o jornal e o depositou no banco, ao seu lado, para voltar a atenção ao homem que lhe falava.

— Acabo de receber as notícias dos nossos emissários. Parece que... a situação está pior do que imaginávamos no início.

— Conte—me mais, meu filho.

— O Padre Sérgio, que é o nosso representante direto na região, é quem está monitorando a situação de perto. Ele me disse que os... estágios... foram claramente identificados.

A expressão de preocupação que forçava ainda mais as marcas da idade no rosto do bispo só suavizou quando ele respirou fundo e interrompeu o padre.

— Me diga uma coisa, filho: eu estou aqui há muitos anos, mas confesso que nunca presenciei... nem mesmo ouvi relatos de uma... manifestação nessa escala. Você e esse tal... Padre Sérgio... sabem bem do que estão falando?

O jovem padre não disfarçou o incômodo pelo questionamento do superior, mas prosseguiu com a sua explicação.

— Sim, senhor! Tanto eu quanto o Padre Sérgio fomos graduados em todos os treinamentos do Pontifício Ateneu Regina Apostolorum, em Roma. Estamos falando mesmo dos estágios da possessão!

Após uma breve pausa, o bispo, como um professor testando os conhecimentos de seu aluno, questionou:

— Então me faça recordar, filho. Me explique os estágios da possessão, e como eles foram verificados neste caso em específico.

Padre Alfredo engoliu em seco, sem se preocupar em disfarçar o desconforto pela desconfiança do bispo, mas respondeu:

— O primeiro estágio, Vossa Excelência, a infestação, é o estágio no qual as entidades buscam provocar o medo, assim fragilizando a vontade humana. Ele foi percebido desde o início, quando ... ele... se instalou no local. Para os que testemunharam desde o princípio, os sinais eram muito claros. Mas a cegueira de alguns o deixou se empoderar.

O bispo não demonstrou espanto com o que ouvia, e sinalizou para que o Padre Alfredo prosseguisse.

— Já o segundo estágio, a opressão, momento no qual a entidade intensifica suas atividades para que as vítimas sejam fortemente oprimidas física e psicologicamente, foi percebido durante a... crise.

O padre parecia hesitar em mencionar a atual situação que a comunidade à qual se referia estava passando. Talvez fosse um misto de vergonha e pena.

— Naquele momento, segundo o relato do Padre Sérgio, o que se via eram pessoas fragilizadas, buscando um alento em qualquer promessa oferecida. O desespero era sentido quase que fisicamente pelas ruas do lugar. Era um cheiro, um gosto, algo que se podia sentir no ar.

O relato que saía carregado de emoção dos lábios do Padre Alfredo, não parecia tocar com muita profundidade o seu ouvinte que permanecia sentado no seu banco de madeira, à espera da sequência da história trazida pelo mais jovem. A fleuma do bispo só ameaçava se dissipar nos momentos em que ele interrompia o padre para questioná-lo.

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