🎀 capítulo 02 🎀

160 36 29
                                    

Os lábios de Nando ainda estão colados aos meus. Nosso beijo é doce e gentil, e a sensação é tão boa — tão diferente dos outros que já experimentei. Quando minha ficha cai e percebo que o que estamos fazendo é errado, me afasto rapidamente e tento voltar a respirar.
— Meu Deus. Isso é loucura! — Me levanto da cama nervosa.
— Desculpa, foi culpa minha. — Ele abaixa a cabeça, as bochechas corando com a vergonha.
E estou ainda mais envergonhada que ele, por ter sentido o que senti. Acabei de cometer um enorme pecado. Eu beijei meu irmão.
— Só esquece, Nando. Isso nunca aconteceu. Está me ouvindo? Nunca.
Sem ter coragem de olhar em seu rosto novamente, saio do quarto em disparada. Nando me chama, mas o ignoro. Entro no meu e tranco a porta, querendo me esconder do mundo.
— Que droga! — Me jogo na cama e afundo o rosto no travesseiro, soltando um grito.
Deixo as lágrimas caírem. Estou confusa e com o coração em pedaços. Henry me enganou durante todo esse tempo, jogou nossos dois anos no lixo! Ele foi o meu primeiro namorado, o homem a quem me entreguei por amor. Tenho consciência de que as coisas não estavam tão boas, mas nunca imaginei que ele chegaria a esse ponto. Seria tão mais fácil se tivesse terminado antes. Ele sabe o quanto abomino a palavra "traição". Tudo o que sempre pedi a ele foi sinceridade.
Toco meus lábios e a lembrança do beijo vem a minha cabeça. Eu não posso deixar que isso aconteça novamente. Nando é meu irmão. Mesmo não tendo o mesmo sangue que ele, é isso o que nós somos. Fecho meus olhos e sinto as lágrimas rolarem por minha face. Como minha vida pode ter mudado tanto de uma hora pra outra?

***

Acordo com os olhos ardendo. Me sento na cama, pego meu celular debaixo do travesseiro e vejo que já é quase meia-noite. Há chamadas não atendidas de Henry  e só de olhar seu nome na tela, com vários corações ao lado, dói o meu peito. Bloqueio o celular, me levanto e vou até o guarda-roupa, separo uma camisola e vou direto para o banho. Me forço a não derramar nenhuma lágrima. Henry não merece nenhuma delas. Não vou ficar aqui sofrendo e chorando por um homem que não foi capaz de me proporcionar o mínimo, que é sua lealdade. Se ele me traiu foi por ser um mal caráter. Preciso colocar na cabeça que o problema não estava em mim e sim nele.
Quando finalizo, abro a porta do quarto e vejo que as luzes já estão apagadas. Todos já devem estar dormindo. Decido descer até a cozinha para arrumar algo para comer. Abro a porta da geladeira e vejo um prato com dois pedaços de pizza e um pequeno bilhete ao lado. Pego-o e começo a ler.
“Pequena, guardamos pra você. Espero que esteja melhor. Nando nos contou sobre Henry. Te amamos. Caio”
Não sei se fico feliz por não ter que explicar o que aconteceu ou se fico com raiva por Nando ter contado. Dentro de mim parece que se passou um furacão bagunçando tudo. Sei que vai demorar um pouco pra colocar cada coisa de volta em seu devido lugar. E ter Manu e Caio me apoiando fará toda a diferença.
Dobro o bilhete e o coloco na bancada. Esquento minha pizza no micro-ondas e me sirvo de um copo de Coca. Me sento à mesa e começo a comer. Apesar de estar parada comendo tranquilamente, minha mente está a mil por hora. É como se ainda estivesse processando tudo o que aconteceu nessas últimas horas. Não sei o que mais está me deixando atordoada, a traição ou o beijo.
— Posso me sentar com você? — Levo um susto ao ver Nando em pé ao meu lado. — Desculpa, não queria te assustar. Não consigo dormir.
Por que será que não consegue? Será que aquele beijo também significou algo para ele? Será que as mesmas dúvidas que pairam na minha cabeça também estão na dele? Minha cabeça parece que vai explodir! Queria que tudo isso não tivesse acontecido. Queria minha vida perfeita de volta.
— Pode sentar. Você está na sua casa. — Aponto para a cadeira.
— Estou na nossa casa, Aurora. — Ele se senta e fica me observando.
— Não vou conseguir comer com você me encarando. Quer um pedaço? — Levanto o garfo com o último pedaço de pizza.
— Obrigado, já comi mais cedo. Eu te chamei, mas não respondeu então deduzi que havia dormido. — O jeito que me olha já revela que quer conversar sobre algo. Ou melhor, sobre o que aconteceu mais cedo. Eu o conheço muito bem, mas não sei se estou preparada pra isso. — Aurora... Eu não sei como dizer isso, mas não quero que nada entre nós mude. O que aconteceu mais cedo foi algo de impulso, sei que deixei você ainda mais atordoada, eu não deveria ter feito aquilo.
— Realmente não deveria — digo baixinho, encarando o prato vazio.
— É que te ver chorar daquele jeito mexeu comigo, e ver seus olhos inchados do jeito que estão agora… — Nando segura meu rosto e me faz encará-lo. Por que não consigo mais vê-lo como antes? Isso é errado demais. — Me faz querer ir até onde aquele imbecil está e acabar com ele — diz, cerrando os punhos.
— Já falei pra você que temos que esquecer o que aconteceu. Vamos seguir em frente, Nando. Não precisa se preocupar. — Minha mão já se move para a dele, quase que inconscientemente, mas hesito e, por fim, desisto. E isso não passa despercebido a ele, que observa cada movimento meu.
— Não consegue nem me tocar e fala pra seguimos em frente? — Seu olhar é triste e sua voz, baixa.
Me levanto, fingindo não ouvi-lo, e levo a louça até a pia. Então murmuro um “boa noite, Nando” e parto rapidamente para as escadas.
Minha vontade nesse momento é sumir. Eu sei que, mesmo afirmando o contrário, nosso relacionamento jamais voltará a ser como antes. Cometemos um erro e não tem como voltar no passado. Entro rapidamente no quarto, sigo para o banheiro e escovo os dentes. Em seguida, me olho no espelho e percebo como estou um caco. Em questão de horas, perdi todo o equilíbrio que demorei anos para juntar. Suspiro e me arrasto até a cama, aconchegando-me sob as cobertas, rezando pra que a noite de sono reestabeleça tudo que está confuso aqui dentro.

Nando

Não consigo dormir. Me viro de um lado para o outro na cama e aperto a cabeça contra o travesseiro e tento não pensar em nada, mas a lembrança do que aconteceu continua voltando à minha mente, se repetindo sem me dar um único segundo de descanso. Devo estar ficando louco. Como pude beijar minha própria irmã? Aurora e eu sempre fomos muito ligados, companheiros um do outro. E agora vejo que coloquei tudo a perder por causa de um simples beijo. Por um sentimento que só eu devo estar sentindo.
Não consegui me controlar. Quando dei por mim, meus lábios já estavam colados aos dela. E foi tão bom e tão errado ao mesmo tempo.
Cansado de esperar o sono vir, me levanto e vou até a cozinha pegar um copo d'água. Ao abrir a porta do meu quarto, vejo que a do dela também está aberta. Penso em entrar, mas logo desisto. Mas, para a minha surpresa, assim que desço as escadas e noto a luz ligada, vejo Aurora sentada à mesa, comendo, perdida em seus pensamentos. Mesmo não tendo certeza do que dizer, sei que preciso conversar com ela.
Meu olhar passeia pelo seu corpo. Aurora está usando uma camisola de seda rosa e seus cabelos estão presos em um coque; a pele branquinha está muito à mostra. Mas por que estou prestando tanta atenção nisso? Parece que depois daquele beijo algo se desencadeou dentro de mim e me deixou assim. Que droga! O que estou fazendo?
Mas não posso evitar. Enquanto ela come, fico, em silêncio, admirando-a. E vejo que seus olhos estão inchados. Culpa daquele idiota do Henry. Como ele teve coragem de trair uma garota como ela? Aurora é a garota mais incrível que conheço. Tudo o que eu queria era parti-lo ao meio. Como pode ser tão otário?
— Posso me sentar com você? — pergunto e, em pouco tempo, percebo que me reaproximar de Aurora não será tão fácil como esperava.
Quando ela fica com receio de me tocar, sinto meu coração se quebrar no peito. Quero continuar conversando, mas Aurora foge novamente. Uma certeza eu tenho: não vou deixá-la se afastar de mim. Me levanto e vou até o quarto dela, decidido a resolver isso de uma vez por todas. Entro devagar e a vejo encolhida, a luz de sua luminária em formato da Torre Eiffel iluminando o local. Meu coração se aperta ao perceber que está chorando.
— Nando, o que está fazendo aqui? — murmura assim que me vê.
Me sento ao seu lado e acaricio seus cabelos dourados.
— Não quero que se distancie de mim novamente, Aurora. Pare de fugir. Eu quero cuidar de você. Sei que seu coração está despedaçado. Lembra de quando você tinha medo dos trovões e ia correndo pro meu quarto pra dormir comigo? — Ela balança a cabeça, confirmando. — E quando alguém te irritava na escola, quem era que te defendia no mesmo instante?
— Você. — Sua voz sai embargada.
— Eu sempre estive ao seu lado e sempre estarei. Não existe Nando sem Aurora.
Ela abre um pequeno sorriso.
E eu não estou mentindo. Aurora sempre esteve ao meu lado desde quando nasci. Não tenho ideia de como seria a vida sem ela. E me nego a descobrir como é.
— Lembra quando caí da bicicleta na primeira vez que andei sem rodinhas? Manu te deu uma bronca daquelas — Aurora diz, ainda sorrindo, e acabo rindo da lembrança.
— Sim. Mas você a convenceu que fui forçado a te deixar andar na minha bicicleta, mesmo não sendo verdade. Fui eu que te desafiei a andar nela. Sabe por que você fez isso?
— Porque somos parceiros — fala, baixinho.
Eu assinto.
— Um nunca quer ver o outro na pior, mesmo que isso signifique aguentar as consequências de uma coisa que não fez. — Mesmo não sabendo se devo continuar aqui tão próximo a ela, faço a pergunta que está entalada em minha garganta. — Posso me deitar do seu lado, como fazíamos quando éramos pequenos?
Aurora não responde de imediato e isso me deixa apreensivo. Quando vai mais para o lado e levanta o edredom rosa, solto um suspiro aliviado. Tiro meus chinelos e me deito ao seu lado. Ficamos virados um para o outro em silêncio por um tempo.
— Eu queria tirar essa dor do seu peito. Não gosto de te ver assim desanimada. — Acaricio sua bochecha. Sua pele é tão macia e gostosa de tocar. Pare com isso, Fernando! grita meu subconsciente. Então afasto minha mão.
— Preciso confessar que não estou assim apenas por Henry, mas... — Ela não completa a frase, mas já sei o que iria dizer. Aquele beijo também despertou algo dentro dela. Só não sei se para ela é bom ou ruim.
— Posso te perguntar uma coisa?
— Pode.
— Você sentiu alguma coisa quando te beijei? Eu sei que você pediu pra esquecer o que aconteceu, mas quero muito saber. — Olho em seus olhos. — Eu preciso muito saber, Aurora.
— Não sei se é uma boa entrar nesse assunto novamente, Nando.
— Só me responde isso, por favor.
— Estou confusa com o que senti. Nós somos irmãos. Nunca era pra ter acontecido aquilo.
— Mas aconteceu. E pra ser sincero com você, estou com vontade de te beijar novamente. — As palavras saem sem que eu tenha qualquer controle sobre elas e Aurora me olha surpresa. Sem esperar uma resposta e sentindo meu coração pulsar descontroladamente, encosto nossos lábios.

O Pecado De Aurora حيث تعيش القصص. اكتشف الآن