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Acordo num ambiente desconhecido. Olho minhas mãos, meus braços, onde estão os implantes? Cada vez menos percebo a diferença do mundo tangível e das ilusões oníricas. Onde está a janela? Onde está a paisagem que costumo ver no despertar? Não há sons. A cidade morreu ou é isso um sonho pós-descarte?


Mas acho que reconheço esses objetos, essa mobília, esse cheiro úmido, essas paredes desgastadas e ásperas e rústicas. Estou no ambiente que Céu me trouxe. Não se trata de uma ala residencial, não faz sentido nenhum ser um ambiente particular. Não há também sinal dos artrópodes que passei a ver após a quebra do meu display. Meu display! Toco no meu braço novamente e não há nada que demonstre que havia alguma coisa aqui, é como se esse corpo nunca tivesse tido implantes. Isso significa estar sem meu registro de tarefas, meus registros de funcionamento corporal, meus registros das condições da Cúpula... Sobre meu corpo há uma vestimenta feita de material extremamente maleável e possivelmente pouco resistente, semelhante a micro entrelaçamento de fios e que não parece possuir nenhuma tecnologia térmica porque está umedecida pelos líquidos do meu próprio corpo.


Levanto e vasculho o lugar em busca de uma vestimenta mais apropriada, ou de uma câmara de higienização para manutenção básica, mas minhas digitais não são reconhecidas em nenhum dos equipamentos.


Saio então pela saída de emergência - ao menos isso não precisa dos meus dados - e tento reconhecer em que lugar estou. Devido à inclinação da Cúpula e organização/estrutura dos prédios, estou na periferia, muito próxima aos limites. As vias sob o céu estão desertas. As luzes externas da superfície estão muito claras, mas não há luzes da cidade. Não há sinais de pedestres, sequer os autômatos de manutenção estão à vista. Caminho em direção aos sons externos, às gotas que agora ouço com maior nitidez, que eram apenas ruídos brancos por trás dos sons dos transeuntes cotidianos.


Recordo minhas caminhadas até essas zonas, minhas tentativas de fuga. Existiram? É como se eu estivesse presa em um sonho muito antigo.


Caminhada solitária. Eu poderia simplesmente ir até a garagem comum, procurar algum veículo que reconheça minha íris, mas provavelmente não há. E como estou sem meus implantes e nenhum equipamento me reconhece, em nenhum lugar algo vai dizer a alguém onde estou. Eu vi a Névoa? O corredor em que vim parar se estreita em um pequeno portão. A névoa que cobria o chão, antes espessa, agora parece se dissipar. Ouço um som forte de água do outro lado. Terei acesso ao mundo exterior?

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⏰ Last updated: Jun 09, 2021 ⏰

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Depois do CéuWhere stories live. Discover now