Capítulo 7 - Esperança de um reencontro

217 22 9
                                    


Sarah estava um pouco trêmula. Mais uma vez estava ali, esperando pelo trem azul, mas desta vez retornaria para casa. Não via a hora de chegar na Fazenda Mackerson. Tinha tanta saudade de Lia. Queria abraçá-la forte e enchê-la de beijos. Era tanto tempo longe que ela quase nem conseguia lembrar do rosto da amada babá. E queria que um dia pudesse perdoar seus pais por terem tirado ela de casa e a mandado para o internato, vivendo completamente sozinha por 4 anos.

O internato não era de um todo um lugar ruim. Mas se tivesse escolha, jamais voltaria para lá. Além da solidão, era um lugar imenso, úmido, frio e escuro. Um internato para mulheres feito em um antigo castelo medieval. Aprendera a ler e escrever perfeitamente, inclusive em francês. Tinha aulas frequentes de piano. Poderia ter escolhido outro instrumento, mas piano lhe agradava mais. Corte e costura também faziam parte das aprendizagens diárias. Além do estudo da bíblia e a obrigação da missa nas quartas à noite e domingos pela manhã. As garotas saíam de lá aprendendo tudo que precisavam para voltarem para casa instruídas e aptas para o casamento e a vida do lar.

Quando o trem apitou ao longe, Sarah não conseguia vê-lo, mas sentiu um forte arrepio na espinha. No internato não houve um dia em que não lembrou do rapaz que conhecera no trem quando ouvia aquele som. E agora o trem azul estava ali, na sua frente... Igual da primeira vez, só que exatamente 4 anos depois.

Sarah embarcou um pouco receosa. Algumas pessoas apressadas quase a derrubavam. Pensou em quando arrumou-se e olhou-se no espelho naquela manhã. Colocara um vestido de seda pura, amarelo claro, com alguns detalhes em rendas brancas. O vestido era longo, mas deixava o sapato dourado à mostra. Prendera os cabelos num coque muito bem amarrado, sem deixar nenhum fio à solta. E para finalizar um lindo chapéu que ficava só no alto da cabeça, em tons beges e dourados. Era uma garota magra, nem muito alta nem baixa, tinha dentes perfeitos e longos cabelos loiros levemente encaracolados. Olhos azuis emolduravam a pele clara e macia. Se considerava uma garota, mas aquela roupa havia sido escolhida para aquele momento. Não... Não iria a uma festa, nem a uma reunião com mulheres da alta sociedade. Se vestira na espera de encontrar um certo rapaz... Que talvez nunca mais visse em sua vida.

Ela embarcou e foi diretamente à sua cabine de primeira classe. Mas ficar ali, sozinha, certamente não era sua opção. Largou sua bagagem e dirigiu-se à um dos restaurantes. Sim... agora sabia que havia dois restaurantes no trem, na primeira classe. Na sua primeira viagem nem conhecera sua cabine. As mesas deste restaurante eram maiores. Ela sentou-se juntamente com uma família de mãe, pai e dois filhos pequenos. As crianças choravam e pediam tudo ao mesmo tempo, deixando o garçom confuso. E ela zonza de tanta algazarra. Pediu somente um chá, que demorou a chegar. Soube pela família que dividia a mesa que o trem agora fazia uma parada entre Deolinda e Tulipa, numa nova estação, e também carregava cargas, tendo assim mais vagões.

Sarah olhou a paisagem urbana dando lugar às montanhas geladas. Sabia que não via mais tudo com o olhar inocente de uma criança. Havia amadurecido muito nestes 4 anos. E muito aprendera com o rapaz que conheceu na primeira viagem do trem. Tristan já devia estar com 19 anos. Provavelmente já estava casado. Poderia morar em qualquer cidade, estado ou país. Poderia até estar morto. Ela sentiu um aperto no coração. Isso ainda não havia passado por sua cabeça. Não... Não estaria morto. Era um rapaz que amava a liberdade e certamente hoje era um homem que não abria mão disso. Liberdade... Ela sabia onde encontrar essa sensação no imenso trem. Pediu licença, levantou-se foi andando devagar, de vagão em vagão, até chegar ao último, onde havia conhecido Tristan.

Além das inúmeras malas, havia um cavalo num espaço reservado, preso numa espécie de caixa de onde só se podia ver sua cabeça. Mas ela entendia um pouco sobre cavalos e dava para perceber que era de raça e caro. Ela passou a mão nele sem medo. Era manso e tinha pêlos macios. Tristan não estava ali e ela precisava aceitar que nunca mais o veria. Tantos dias pensando nele, tantas noites que o tocou em seus sonhos... Um sonho impossível.

SEGUINDO NO TREM AZUL  (DEGUSTAÇÃO)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora