01 - Por que o céu é azul?

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Foi apenas assim que decidiu começar a gritar. Não queria morrer, mas acima de tudo não queria morrer e deixar o filho livre para que Paulo o agredisse. Tentou lutar contra o homem, o manchando com o próprio sangue, empurrando-o, batendo, arranhando, mas ele parecia dez vezes maior e mais forte do que se lembrava, apesar de ser bastante magro.

Seus olhos azuis estavam injetados e vermelhos de fúria e Lauren se sentiu em frente ao demônio enquanto seus cabelos loiros encaracolados sacudiam a cada facada que ele desferia. Ela não tinha noção de quanto já tinha sido ferida, mas sentia-se dormente e fraca, tentou com toda força que possuía empurrá-lo para longe do filho que tanto chorava, ouvindo a movimentação dos vizinhos gritando e sabendo que o fim de alguma forma estava próximo, um último golpe que ela não teve tempo de compreender a acertando e fazendo com que perdesse a consciência.

Lauren abriu os olhos, dessa vez de verdade, o coração acelerado e o olhar correndo a volta identificando que não estava na quitinete onde morava com o marido violento e o filho, mas na casa de sua melhor amiga, que a olhava com seus doces castanhos, sentada ao seu lado.

A sensação foi a mesma de cada despertar. O enorme vazio a preenchendo e toda a dor.

Camila abriu os braços assim que reconheceu seu olhar cheio de dor. Sabia que tinha visitado o passado mais uma vez, e embora já tivesse passado seis meses, sabia que aquele dia em especial era o mais difícil de todos, pois era quatorze de julho, dia em que seu pequeno Cadu completaria três anos.

Lauren não negou que queria colo, simplesmente se jogou nos braços da amiga e chorou ruidosamente sem se importar em estar horrível em seu pranto porque aquela mulher ali conhecia cada um de seus lados e estava sendo a maior força que poderia encontrar.

— Chora... Pode chorar que eu estou aqui para você — Camila sussurrava.

Lauren sentia uma dor mais cortante do que todas as trinta e sete facadas que recebeu. Ela não queria dizer, mas ao mesmo tempo em que sentia uma paz ao olhar Camila, sentia também uma enorme dor, porque seu filho tinha os mesmos olhos castanhos calorosos e olhar para ela era como lembrar de seu pedacinho do céu, que havia sido morto pelo homem que o gerou.

Lauren sabia que Paulo tinha raiva de Camila e toda a proximidade que tinham. A mulher era sua maior fonte de incentivo. Foi com o apoio de Camila que Lauren concluiu a faculdade de arte, já que ele dizia que tudo aquilo era uma grande bobagem, e a mulher que tinha os mesmos olhos de seu filho também tinha sido a única pessoa que ele não conseguiu afastar.

Ninguém tinha ideia de como uma mulher com energia tão boa havia ido parar nas garras de Paulo, mas Camila sempre teve medo dele, afinal, não era nada normal que um homem de quase vinte anos se interessasse por uma de doze, e acabasse por conquistá-la com suas artimanhas nojentas e iniciando um namoro aos seus treze, não importa o quanto ele parecia apenas um adolescente bonzinho com os cabelos e olhos de anjo, não importa o quanto os pais de Lauren o aprovassem.

Ele não era um adolescente. Era um homem sujo que tentou tirar tudo o que a juventude poderia levar a sua amiga e teria levado se Lauren não fosse uma pessoa tão viva e independente.

Ao menos era.

A mulher estava aos pedaços desde que acordou no hospital após semanas apagada e algumas cirurgias delicadas para mantê-la viva apenas para descobrir que seu filho estava morto e enterrado e o desgraçado do marido tinha se matado para escapar de prisão.

Ela não entendia e se culpava por ter sobrevivido a trinta e sete facadas e uma batida forte na cabeça, mas Cadu e Paulo não terem sobrevivido a uma facada certeira.

Não se conformava.

Talvez não houvesse como se conformar a isso.

— Vamos... — Camila balbuciou a ela — Vamos levantar, nos arrumar e levar flores a Cadu.

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