O outro pedido: uma propriedade ao norte que fosse sua e somente sua, para ter paz. 

  - Obrigado. - Ele disse, antes que Beron tivesse tempo de mudar de ideia. - Farei isso.

  O pai o dispensou com outro gesto de mão. Lá fora, Denn e Jace esperavam recostados na parede.

  Jace mostrou os dentes.

  - Então quer dizer que vai nos deixar, irmãozinho?

  Lucien devolveu o sorriso felino antes de ir embora.

  - Não podia suportar mais olhar para as caras de vocês. E podem ficar com as minhas coisas, se quiserem. Não planejo voltar tão cedo. 

  🍁

  Ele não voltou por vinte e sete anos, na verdade. Ao menos não por mais de alguns meses, de vez em quando.

  Passou um bom tempo na Invernal. Toda primavera, ficava alguns meses na Diurna, na casa de um antigo conhecido com acesso às bibliotecas reais. Na Crepuscular, aprendeu a arte da cura com uma amiga por quatro anos. Na Estival, serviu no exército por quase uma década, quando começou a ficar entediado. E, no resto do tempo, ele ficava da Primaveril ajudando Tamlin. O novo Grão-Senhor era péssimo com politicagem, área em que Lucien era realmente bom. Durante tudo isso, ele fez o que o pai pedira: negociações, sorrisos, flertes, tudo para conseguir aliados. 

  Quando, enfim, sua mãe lhe enviou uma carta pedindo para que ele voltasse intemporariamente, Lucien deu por si aceitando. Verdade seja dita, ele sentia saudade de viver mais tranquilamente, por mais festeiro que tivesse descoberto ser. E tinha saudade de casa. O tempo esvanecera um pouco sua raiva.

  Enquanto caminhava pelo mercado perto da Casa da Floresta, pessoas vinham cumprimenta-lo e fazer reverências. Clay foi encontra-lo. Lucien ficou feliz por não ter sido Tohnr ou Areas, porque não suportava falar com eles desde que os pegara tentando se aproveitar de uma garota no Equinócio. A prima de... Ele enrijeceu. Jesminda. Uma fêmea por quem um dia talvez tivesse uma paixão de infância. Se perguntou como ela estaria hoje. 

  - Quer dizer que voltou de verdade? - perguntou seu irmão, curioso.

  Lucien deu de ombros.

  - Por um tempo.

  Eles não conversaram muito no caminho até a casa da família, nem quando seus outros irmãos o cumprimentaram, meio desgostosos. Ele abraçou sua mãe e acenou para o pai. Se sentia um estranho no meio deles, mais do que antes. 

  Antes, ele era um garoto tentando se enturmar com os irmãos mais velhos. Agora, era um macho adulto tão vivido quanto eles, até mais. Ele tinha visto demais, aprendido demais. Não havia porque tentar uma aproximação. Ele não se rebaixaria tanto. 

  Eris se sentou ao seu lado no banquete em comemoração à sua volta. Enquanto os nobres da corte gargalhavam e se esfregavam uns nos outros, ele comentou:

  - Está diferente, irmãozinho.

  Lucien tomou um longo gole de vinho.

  - Estou?

  Eris girou uma faca na mão antes de usá-la para cortar o faisão em seu prato.

  - Muito calmo. Muito quieto. Nada como o garotinho que sentava nos meus joelhos às vezes, sempre tão ansioso para agradar.

  Lucien lançou um olhar inexpressivo ao mais velho de seus irmãos. Não seria mais humilhado, correndo de um lado para o outro tentando ganhar o apreço de todos. Não fora para isso que viera.

O Conto de Lucien e JesmindaWhere stories live. Discover now